Caso Wanderson

'Fiquei chamando-o de filho', diz mulher que convenceu Wanderson a se entregar

Cinda Mara foi surpreendida pelo criminoso às 6h30 em sua fazenda, no último sábado (4/12). O foragido dormia em uma mata próxima e ameaçou matá-la

“Eu mantive a calma, fui fria. Mas, acima de tudo, foi Deus que estava me protegendo”, relata Cinda Mara de Alves Siqueira, 54 anos, moradora de Mocambinho, distrito de Gameleira, que convenceu Wanderson Mota Protácio, 21, a se entregar à polícia no sábado (4/12). O criminoso estava foragido desde 28 de novembro, quando matou a companheira grávida de quatro meses, a enteada de 2 anos e 9 meses e um vizinho de 73 anos.

Em entrevista ao Correio, a moradora detalha: “era em torno de 6h30 da manhã, meu esposo saiu para buscar leite em outra fazenda, quando ele (Wanderson) bateu na janela com o revólver, apontou a arma para mim e disse que ia me matar”. Apesar do medo, Cinda manteve a calma e respondeu para Wanderson que ele não a mataria. “O tempo todo mantive um diálogo para ele criar confiança em mim”, detalha.

Segundo Cinda, Wanderson estava com muita fome. “Eu estava de pijama quando ele chegou, pedi desculpa e falei que precisava trocar de roupa, isso com a maior tranquilidade do mundo. Depois ele pediu café e eu fui fazer. Tinha um pote de bolachas de nata que entreguei a ele. Estava com muita fome, colocava três a quatro biscoitos na boca. Não fiquei nervosa, meu coração não disparou. Ele (Wanderson) estava com muito medo e frio. Perguntei se queria uma camisa, e com as mãos para cima, fui até o quarto e peguei uma camisa do meu marido para ele”, conta.

Foi Cinda que vestiu a peça de roupa no foragido. “Quando fiz isso, ele olhou para mim e disse: minha mãe me abandonou quando eu tinha 4 anos de idade, nunca tive ninguém para me tratar tão bem. Ele me olhou nos olhos, perguntou se eu tinha filhos e eu disse que não. A partir daí eu disse que o chamaria de filho, e fui trabalhando essa confiança nele”, afirma.

Convencimento

Quando o esposo de Cinda estava retornando para a propriedade, Wanderson tentou fugir. “Nesse momento ele levantou e, na hora da adrenalina, eu segurei o braço dele e falei que ele não ia fugir mais. Falei que se a polícia o pegasse ele poderia ser morto. Wanderson disse que queria ir para Corumbá, mas eu disse que nossa jurisdição era Gameleira”, conta.

Quando chegaram à porta da delegacia, por volta de 7h20, o local ainda estava fechado. “Batemos e ninguém apareceu. Eu fiquei pensando como ia ficar ali, dentro do carro, com um bandido. Foi nesse momento que liguei para o prefeito e avisei que estava com o Wanderson. Ele não acreditou, porque todo mundo sabe que sou brincalhona, por isso fiz a foto com o Wanderson”, detalha.

No primeiro momento, quem apareceu foi um policial à paisana. “Pedi para o policial se identificar. Pensava que a qualquer momento as pessoas poderiam começar a acordar e não sabia o que poderia acontecer. Sem falar que tinha medo dele (Wanderson) mudar de comportamento, porque essas pessoas mudam de comportamento muito rápido. Então entreguei a arma dele (Wanderson) que estava no porta-luvas para o policial, com as munições, e o policial o levou para Anápolis”, recorda.

Agradecimento

A moradora ainda tenta assimilar tudo que aconteceu nas últimas horas com ela e o marido. “Estou sem acreditar”, confessa. Evangélica e há nove anos morando na mesma propriedade, no domingo (5/12), Cinda precisou tirar um tempo para si, e agradecer a Deus. “Entrei no meu quarto e fui orar. Peguei a bíblia e abri no Salmo 91: ‘Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo’”, narra.

“A gente sabia do risco que estava correndo, sair da fazenda com um bandido no banco da frente. Mas graças a Deus não encontramos nenhuma viatura no caminho, porque a polícia podia pensar que ele tinha feito eu e meu marido de refém, e não sei o que poderia ter acontecido”, conta.

Cinda pontua que, durante a conversa com Wanderson, ele chegou a dizer que a fazenda trazia paz. “Ele estava muito cansado”, afirma. Questionada sobre o motivo de ter conseguido lidar com o foragido, ela assegura: “eu olhava o tempo todo no olho dele, para gerar confiança e, quando ele desviava, eu falava para ele olhar nos meus olhos e conversamos”.