Acordei com Brenda perguntando sobre os gritinhos que vinham da cama. Meio sonolento, não entendi muito bem o que estava acontecendo. "Aqui, ó. Chega mais perto, tenta escutar. Te juro, eu não estou louca. Ouve isso. O colchão está falando com a gente", ela insistia.
Eu não dava muita bola, tentava voltar ao sono de um sábado sem trabalho. Porém, comecei a escutar o mesmo barulho, enquanto minha noiva passava a mão na lateral da cama, do lado onde fica a janela, que estava aberta desde a noite anterior. "Que textura diferente, meio peludinha. E esse barulhinho. Meu Deus, estou ficando louca?", repetia Brenda, na tentativa de entender o que acontecia com o colchão.
O sono já havia passado e resolvi levantar para ver o que era. Afastei um pouco a cama da parede, e lá estava o ser humaninho, grudado no colchão, de cabeça para baixo. Logo abaixo dele, no piso do quarto, havia um monte de pontinhos pretos (o cocôzinho dele, pensei. Havia ficado tanto estressado que teve uma diarreia, tentei entender).
Acho que foi amor à primeira vista. Aquele bichinho assustado, tão inseguro, cagando na própria cabeça. Tadim... De pronto, decidi batizá-lo de Ozzy, nome do vocalista da lendária banda de heavy metal Black Sabbath.
Lembrei de uma conversa no grupo de WhatsApp dos moradores do condomínio onde moro. Há alguns meses, eles relataram o surgimento de filhotes de morcego nos apartamentos. Assustados e sem saber o que fazer, alguns vizinhos acabaram matando os bichinhos. Até a aparição de um deles no meu quarto, eu também não sabia como proceder. Mas, se pesquisarem na internet, saberão que o manuseio com a espécie não é como o de um inseto; o aconselhável é entrar em contato com a Zoonoses para remover o animal. E matá-lo é crime ambiental, caros vizinhos.
Brenda, que no início suspeitava estar ouvindo barulhos imaginários da cama e surtando, ficou realmente doida (de medo) quando eu falei que a coisinha peluda que ela acariciava, sem ver, não era uma parte da cama, mas sim um filhote de morcego. Sem saber como removê-lo do quarto, e tendo que lidar com o nervosismo da minha companheira, fui até a cozinha pegar uma sacola plástica para tentar capturar o Ozzy.
A primeira tentativa não deu certo, e ele resolveu subir da lateral da cama para a superfície dela, onde começou a correr pelo lençol e travesseiro. Brenda gritava: "troquei os lençóis ontem, meu Deus, que nojo. Pega logo ele, Adson. Pare de rir, ele não é seu bicho de estimação".
Eu tentava, meio que sem querer, prender o Ozzy na minha cama. Pequeno e ágil, ele se safava de todas minhas investidas. Com o celular, Brenda começou a filmar todas minhas tentativas frustradas de capturá-lo. Ele correu a cama de ponta a ponta, e, como um avião a decolar, bateu as asinhas quando o colchão acabou, mas foi direto ao chão. Foi quando consegui pegá-lo, bem de leve (para não machucá-lo), com a mão coberta pela sacola. Rapidamente, o joguei pela janela, de onde ele tinha entrado.
Por dias, fiquei me perguntando se ele havia conseguido sobreviver ao voo forçado. Brenda me acalmou com o argumento de que, se ele havia voado até nossa janela, no quinto andar, conseguiria voar novamente na partida, ainda que repentina. No mesmo dia, comecei a pesquisar na internet se era possível criar morcegos. Nas redes sociais, postei fotos do Ozzy em nossa cama.
Fiquei triste com a partida dele, e até hoje me questiono se ele ainda está vivo. De vez em quando, escuto da janela o barulho de algum morcego em pleno voo. Seria algum parente do Ozzy? Ou ele próprio? Sei que ele deixou saudades (ao menos em mim). Acho que preciso de um pet. Brenda disse que vai trazer o Ziggy, um bulldog francês que vive com a mãe dela, para morar conosco. Vamos ver se dará certo. Espero que Ziggy (eu o chamo de Winston Churchill) não mate Ozzy, caso ele resolva pousar novamente por aqui.
PS: Diferentemente do que informou a crônica O presente de Dad, de Severino Francisco, publicada no último sábado, o lançamento do livro As maravilhas de Brasília será hoje, das 16h às 18h, na banca da Conceição (308 Sul), e não no domingo.