O mundo está barulhento. Os ecos reverberam aqui dentro de nós. Que sons queremos ou devemos escutar? Tocam os sininhos das notificações: notícias, atualizações, fulano postou, sicrano tuitou, toca o despertador. E, então, corremos... Para ver, curtir, deletar, passar, adiar para depois nem lembrar. Assim passam os dias e as horas, consumidos pela pressa de silenciar os barulhos do nosso tempo.
A zoada boa, de risos, conversinhas de bebê, sons da natureza, conselhos de amigos... Cadê? Você tem ouvido? Eu, sim! Preservo o meu silêncio para a escuta generosa dos sons que a vida proporciona. Também para ouvir minhas próprias inquietudes, indagações internas e as respostas que só eu posso me dar.
Sou feita também de silêncios profundos. Daqueles que nos deixam capazes de ouvir barulhos que remetem a um passado intracorpóreo e a uma infância de mistérios então incompreendidos. Como o que ouvíamos e sentíamos no ventre da mãe ou quando encostávamos o ouvido numa concha gigante. Traziam uma paz tão grande.
O que podemos ouvir no silêncio? Qual a escuta faz sentido? Tem uma música de Maria Bethânia que diz assim: "Silêncio, hoje eu preciso tanto ouvir o céu / Já não é mais urgente assim falar / Meu coração precisa repousar".
Em outros trechos, ela vai longe: "Silêncio, eu quero ouvir o que me diz a imensidão / Saber se minha alma tem razão / Quando acredita que essas coisas vão durar" ou "Silêncio, pra eu me lembrar de tanta coisa que eu sonhei / Encontrar todas as folhas que eu juntei / Por essa estrada que me traz até a mim".
Não sei a de Bethânia nem a sua, mas "essa estrada que me traz até mim" tem trechos de verde e luz, encruzilhadas, montanhas e trincheiras, ventos e trovões. Para atravessá-la, algum silêncio é necessário. Palavras e vozes amigas podem ser pontes seguras, mas a gritaria histérica dos tempos de hoje, eu estou dispensando.
Uma amiga que fez um retiro de silêncio recentemente me disse assim: "Depois de algum tempo, talvez uma ou duas horas, sem falar nem ouvir ninguém, a minha mente parou de fofocar, contar problemas, ruminar diálogos internos, e disse 'calma, vai ficar tudo bem; quem está dizendo é você mesma'".
O silêncio profundo é daqueles presentes que a gente pode se conceder de vez em quando. Não custa nada e o esforço de calar as vozes e os barulhos que ecoam na superfície é recompensador. Eu faço isso enquanto caminho pelas ruas e quadras de Brasília; quando fecho os olhos e penso que sou sobrevivente da pandemia; quando estou devotada a minha fé. Experimente encontrar seu silêncio.