"Amanhã eu vou sair mais cedo. Vou ver se consigo um dinheiro emprestado", disse Tenório para sua esposa e os dois filhos, um de 8 e o outro de 12, que estavam na sala. O terceiro, de 4 anos, estava deitado no quarto sob cuidados da tia. Ardia de febre.
Cedo, Tenório foi até a garagem, onde guardava a bagunça da casa, pegou seu 'trêzoitão' e foi atrás do empréstimo. Dias antes, havia escutado uma conversa no bar. Dinheiro fácil: chegar em alguém que faz frete para o Plano, combinar uma viagem e assaltar o motorista no meio do caminho.
Tenório estava desesperado. Desempregado fazia mais de um ano, só havia estudado até a quarta série e ainda tinha cinco bocas para alimentar: os filhos, a esposa e a irmã dela. Antes, conseguia fazer uns bicos, mas nem isso aparecia mais. Não pensou duas vezes, nem ao menos o que faria com o carro roubado. Poderia ter vendido a arma na Feira do Rolo, seria bem menos arriscado.
Naquela manhã, ele pegou o 38 que guardava para proteger a casa dos malandros da região e foi atrás de seu frete. Bateu à porta de uma casa onde se lia: "Fazemos frete". A camionete estava estacionada em frente à residência. Um senhor veio atendê-lo.
Combinaram um preço, e Tenório disse que só poderia pagar quando chegassem no local da "mercadoria". Inicialmente, o velho dono da camionete não aceitou a proposta. Quando Tenório estava prestes a desistir, o senhor deu o braço a torcer. Chamou o filho e o pediu para ir com o cliente.
Partiram rumo ao centro da Ceilândia. Tenório estava nervoso, tentando lembrar se a arma estava carregada. Geralmente, guardava-a sem munição. Porém, ao mesmo tempo pensava: se fosse necessário usar apenas uma bala, estaria mais encrencado do que nunca.
Estavam no trânsito havia uns 20 minutos, quando Tenório decide agir. "Estou passando mal. Pare o carro, por favor." O rapaz, que já estava desconfiado do nervosismo de Tenório, finge não escutar. Tenório tenta mais uma vez: "Você não quer que eu vomite aqui no carro, quer?".
O carro para. Tenório saca o revólver e anuncia o assalto. O rapaz sai correndo da camionete com as mãos para cima, e Tenório assume a direção. Passa a guiar, sem rumo. Nem ao menos se lembrou de revistar os bolsos do rapaz, que, após o susto, ligou para o pai do celular. Passou a localização do assalto e, minutos depois, Tenório foi parado por uma viatura da PM.
Na delegacia, recebeu a visita do delegado e de alguns jornalistas. No início, tentou fazer jogo duro em frente aos presentes. "Falar o quê? Não adianta mais nada. A merda já está feita", pensou. "Fala rapaz, conta a sua história", aconselhou um companheiro de cela.
Tenório acabou falando e, logo em seguida, chorou como uma criança. Lembrava dos filhos passando fome, do caçula doente e da vergonha que a mulher sentiria dele, agora preso. Conseguiu comover a todos. Mas a merda já estava feita. Mais uma família sem pai na periferia do Distrito Federal.
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