Era mais uma segunda-feira de muito calor para o marinheiro Antônio Sampaio, de 52 anos. Ceará, como é conhecido pelos amigos, havia acabado de finalizar os preparativos de algumas embarcações no Clube da Aeronáutica, onde trabalha, quando decidiu se refrescar no Lago Paranoá. O mergulho o transformou em notícia. Quando submergiu, uma capivara subiu em suas costas e desferiu dentadas sobre o homem.
Marinheiro com 34 anos de experiência, ele conta que nunca imaginou uma situação como essa. “Tudo aconteceu muito rápido, senti o peso nas minhas costas e quando levantei, vi que minhas costas estavam sangrando e saí da água”, lembra. O animal o atacou nas costas e próximo ao ombro. Em um vídeo que circula na internet, é possível ver o momento do incidente.
O morador de São Sebastião foi socorrido por um motorista do clube que o levou até o Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Lá, ele foi medicado, recebeu pontos e curativos. “Passaram antibióticos, e estou em casa, me sentindo bem e sem dores”, afirma.
Passado o susto, o episódio protagonizado pelo roedor ganhou versões bem-humoradas nas redes sociais sobre o suposto “dia de fúria” da capivara. A espécie, residente do lago, na maioria das vezes, não se aproxima ou ataca humanos, mas, ontem, no Dia Internacional da Capivara, abriu uma infeliz exceção.
Pacíficos
De acordo com o especialista em zoologia e professor no Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília (UnB) André Mendonça, o caso foi isolado. “No vídeo, o que me parece é que foi um ataque eventual. A capivara simplesmente se assustou com o senhor e, como é um animal selvagem, se defendeu. Mas você nota que ela não vai atrás do banhista. Ela morde e vai para o outro lado”, ressalta.
Ele explica que é comum ver as capivaras andando em grupo. Em áreas urbanas, o bando pode chegar a ter 40 indivíduos, sendo formado por um macho dominante, as fêmeas, outros machos e filhotes. “Como elas vivem em bando e são roedores, se reproduzem muito e é comum estarem com filhotes. O que tende a ser mais agressivo é o macho dominante, mas é em casos extremos. Normalmente, ele é mais agressivo com outros machos de capivaras do que com pessoas mesmo”, explica.
Para quem admira a espécie, a dica é observar de longe. “Se você chegar perto, ela vai tentar se distanciar. Se a pessoa insistir em se aproximar, a capivara pode reagir”, pontua André, garantindo que as capivaras são tímidas. “Quando encontram alguma pessoa, elas fazem um barulho parecido com um latido e fogem para a água ou para a mata. Elas só reagem quando se sentem acuadas”, esclarece o zoologista.
Alerta
O Batalhão da Polícia Militar Ambiental (BPMA) destaca que os nadadores da Orla do Lago Paranoá devem ficar atentos aos animais. “Se o banhista estiver dentro d’água e vir um animal desses é recomendado não se aproximar ou mesmo sair da água”, alerta.
Os militares esclarecem que se a capivara não atacou ninguém e está em vida livre, no seu habitat natural, não há necessidade de chamar nenhum órgão estatal. No entanto, caso já tenha havido um ataque, a primeira coisa a se fazer é socorrer a vítima, podendo acionar o Corpo de Bombeiros pelo telefone 193 ou a Polícia Militar para o resgate pelo telefone 190. Caso a pessoa seja mordida, é necessário procurar o mais rápido possível um hospital para que a vítima seja medicada e tratada.
Monitoramento
Em julho deste ano, a Secretaria de Meio Ambiente do Distrito Federal (Sema), em parceria com a Universidade Católica de Brasília, assinou um termo para identificação e monitoramento da população de capivaras na orla do Lago Paranoá. Conforme publicado no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF), os recursos públicos para a pesquisa são de R$ 252 mil, e a execução do plano de trabalho terá duração de um ano com parceria de 13 meses.
Procurada pela reportagem, a Sema destaca que o projeto está em andamento desde agosto. A professora de zoologia da Universidade Católica de Brasília Helga Wiederhecker, que coordena as pesquisas, destaca que o trabalho permitirá identificar onde há prevalência dos grupos, tamanho das espécies e relacionar estas informações com outros estudos sobre o lago. “Com isso, conseguiremos descobrir as melhores formas de evitar acidentes como ocorrido esta semana”, acredita.
Helga ressalta que fatos como o de Antônio são incomuns. “Estas situações recentes são intrigantes e despertam hipóteses sobre o que está favorecendo esses conflitos. Neste sentido, o levantamento que já está em curso poderá responder se estes eventos ocorrem em áreas que estão sempre ocupadas ou se estas capivaras se sentem mais ameaçadas na água”, conclui.
Caso recente
Em fevereiro, um morador do condomínio Life Resort, localizado no Setor de Hotéis de Turismo Norte (SHTN), foi mordido por capivara enquanto fazia exercícios na orla do Lago Paranoá. Após o ocorrido, ele foi encaminhado para o hospital com ferimentos na perna, na mão, nádegas e virilha.
Segundo outro residente do condomínio, a vítima estava encostada no píer com as pernas dentro d’água quando houve o incidente. Uma placa de advertência sobre a presença dos animais foi colocada na entrada de acesso ao deck para os moradores.