Entrevista Larissa Polejack / diretora de Atenção à Saúde da UnB

Cuidados na volta ao presencial

Professora alerta que há vários efeitos psicológicos causados pela pandemia e que é preciso observá-los e se readaptar ao sair do home office ou ao retornar às escolas. Pico de flexibilizar e frear as atividades afeta da mesma forma o emocional de cada um

A diretora de Atenção à Saúde da Universidade de Brasília (UnB) e também professora do Departamento de Psicologia Clínica na UnB, Larissa Polejack, foi a entrevistada de ontem do CB. Saúde — programa do Correio feito em parceria com a TV Brasília. À jornalista Sibele Negromonte, ela falou sobre os cuidados a serem tomados na volta do trabalho presencial para adultos e no retorno das crianças às escolas. Para a especialista, há vários efeitos psicológicos causados pela pandemia e que é preciso observá-los e se readaptar. “Também é necessário entender que a crise sanitária continua e que os brasileiros ainda estão dentro da transmissão comunitária”, destaca.

Com o avanço da vacinação, muitas empresas têm exigido a volta presencial dos funcionários. Depois de um ano e meio de home office, muitos têm receio desse retorno. Isso é normal?
É normal. Se você se adaptou ao home office, com o isolamento e sem o convívio social, é normal ter preocupações em relação a esse retorno. Outro dia eu escutei de um colega que ele já não consegue ficar em um local público, uma loja, e ver mais de duas pessoas, porque já gera ansiedade e toda a preocupação da aglomeração, por muita gente não fazer o uso correto da máscara ou simplesmente não utilizá-la. E todo mundo ainda precisa usá-la. Então, é normal esse estranhamento das pessoas.

Ao sentir os sinais, como a ansiedade, por exemplo, o que fazer?
Precisa procurar ajuda. O primeiro passo é se acolher, porque, às vezes, a gente tende a ser muito rígido com nós mesmos, de falar “não, mas eu não devia estar assim, imagina, tá tudo bem”. Não está tudo bem. Estamos vivendo um processo de exposição muito longo ao estresse. A pandemia trouxe esses agentes estressores, e é natural que a gente desenvolva algumas reações. E há vários institutos que atendem a preços sociais, e vários especialistas que atendem, inclusive, on-line. Então, é buscar ajuda e falar sobre isso. Porque ao conversar, você entende que não está sozinho nessa experiência.

O que as raras pessoas que tiverem o privilégio de poder escolher entre trabalhar on-line ou presencialmente devem levar em conta antes de retornar?
A primeira coisa que a gente precisa colocar na balança é entender em que momento a gente está na pandemia. Por exemplo, se eu tenho comorbidade, será que o risco de eu voltar compensa o benefício? A pandemia, infelizmente, não acabou, e quanto mais pessoas decidirem que acabou, mais ela vai permanecer. Então, se a gente ver que há menos riscos, podemos pensar em poder voltar ao ambiente de trabalho presencial.

Médicos e enfermeiros podem sofrer um efeito rebote com a aparente calmaria? A quais sinais devem ficar atentos?
Sim, a gente vem acompanhando ao longo da pandemia, e não só agora, as pessoas falarem que a saúde mental será a quarta onda; mas ela não vai ser, já está sendo. Então, essa separação que a gente faz da saúde física, emocional e mental é muito ruim. Precisamos olhar para esses fatores conjuntamente. Os profissionais de saúde lidam com a pandemia diariamente, e todos têm questões pessoais para lidar. Eles também perderam um amigo ou familiar, e ainda estão acompanhando esse sofrimento diariamente.

Muitas crianças que voltaram a estudar de forma presencial não encontram a mesma escola que deixaram quando foram obrigadas a se recolher. Como pais e educadores podem ajudar nessa readaptação?
É muito importante que os pais tenham sensibilidade nesse momento. Os sinais que podem observar é a mudança de comportamento da criança: se antes era comunicativa e alegre, e começa a ficar mais isolada e recatada, ou ao contrário, mais agressiva e responsiva, é sinal que a criança ainda não está pronta. É necessário um diálogo franco. A escola é um espaço social, e quando se começa a dizer que não quer voltar, é preocupante. Toda essa readaptação merece um olhar atento, assim como tem adulto que pensa em não voltar ao trabalho, é importante reparar nas crianças também. É importante que a gente se dê o tempo. A orientação aos pais é ter flexibilidade.

Os jovens e adolescentes, talvez, tenham sido um dos grupos que mais sofreram com o isolamento social. Há uma fórmula para reverter esses danos?
Os adolescentes são os que mais sofrem nesse isolamento social porque é uma etapa da vida em que há uma expectativa de construir novas relações, e há um impacto relevante. Por isso, é necessário trabalhar com os adolescentes para compreender a lógica de processo. Se eu entender isso, eu passo mais rápido por essa fase para chegar em outra. A possibilidade, agora, é a vacina, mas ainda não podemos relaxar.