Das 192.235 pessoas que saíram de uma região administrativa do Distrito Federal para morar em outra, entre 2015 e 2018, 55% tinham mais de 30 anos. O número é de um estudo pioneiro da Companhia de Planejamento do DF (Codeplan) divulgado na semana passada e se baseia na Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Pdad) de 2018.
A chefe do Núcleo de Estudos Populacionais da Codeplan, Mônica França, explica que não é possível saber o motivo da predominância de adultos nas migrações dentro da capital federal. “O perfil de quem se desloca em longas distâncias, geralmente, é composto por jovens de 15 a 29 anos. No entanto, no DF, verifica-se a mobilidade de pessoas mais velhas. O estudo não capta as causas, mas é possível supor. Por exemplo, se as pessoas estão se casando e constituindo família mais tarde, então, isso pode ser um motivo para sair da casa dos pais com mais idade”, sugere a pesquisadora.
Uma hipótese que coincide com a trajetória do editor de vídeo Victor Todeschini, 34 anos, que após assumir união estável, em 2016, trocou a Região Administrativa de Samambaia pela do Jardim Botânico, onde mora atualmente. Uma mudança que não chegou a ser singular para quem nasceu em Porto Velho (RO), morou até os 21 anos com os pais no Guará e planeja fixar novo endereço, em breve, no Taquari, Lago Norte. “Estou construindo uma casa em um setor de chácaras e pretendo mudar para lá até junho de 2022”, programa.
Victor integra o grupo de adultos acima de 30 anos que migrou para o Jardim Botânico, região que mais recebeu novos moradores nessa faixa etária. Dados da Codeplan apontam que 65,8% de quem passou a residir na região tinha de 30 a 59 anos.
Desigualdade urbana
Em menor proporção, 28,6% dos jovens também alteraram o endereço das moradias. A antropóloga Ana Carolina Ramos de Oliveira, 27 anos, é natural de Goiânia (GO) e, em 2012, passou a morar na Asa Sul, mas, em 2015, mudou-se para a Asa Norte, pela proximidade com a Universidade de Brasília (UnB) — onde cursava a graduação. A escolha também foi influenciada pela possibilidade de dividir os custos com outra pessoa. Em 2018, veio a terceira residência no DF, desta vez, a escolha foi pelo Jardim Botânico, e a decisão veio do desejo de morar em uma casa, o que não durou muito, já que no início do ano ela retornou para um apartamento na Asa Sul, mas reconsiderando regressar para o local do domicílio anterior.
Das andanças pelo DF, a antropóloga encarou a desigualdade de acesso a certos serviços públicos. “Foi um choque quando fui para uma parte do Jardim Botânico em que o acesso aos transportes públicos não era tão fácil. A vantagem que eu sentia era a tranquilidade dos condomínios. Por outro lado, o Plano Piloto tem facilidades e privilégios, como a possibilidade de não usar carro”, pondera a jovem sobre o dilema de escolher entre praticidade e mais conforto. “A gente acaba tendo que escolher entre uma vida mais calma, mais distante e com mais espaço, ou por uma rotina mais acessível, com menos necessidade de transporte particular, mas em um espaço menor e mais caro no Plano Piloto”, reflete.
A mobilidade é justamente um dos motivos que levaram a Codeplan à realização do estudo de fluxos migratórios internos no DF. “É importante conhecer esse movimento para planejar políticas públicas para transportes, escolas e para a demanda habitacional, por exemplo. Se boa parte de quem se mudou para determinada região foi para domicílios alugados, podemos supor que há carência por habitação nessa área”, exemplifica Mônica França.
De acordo com o estudo, do total de novos moradores do Paranoá, 91,7% declararam que o imóvel era próprio e, no Riacho Fundo 2, a taxa foi de 83,3%. “São regiões contempladas por políticas públicas habitacionais, então, os migrantes foram diretamente para casa própria”, destaca a responsável pelo estudo.
As duas RAs compõem as novas áreas habitacionais do Plano Diretor de Ordenamento Territorial do DF (Pdot) e ambas receberam, em 2016, unidades habitacionais de políticas públicas de moradia. Para Júlia Pereira, gerente de Estudos e Análises de Proteção Social da Codeplan, o acompanhamento é importante para a compreensão territorial. “É necessário entender quais movimentos levam as pessoas a se mudarem. É uma questão de especulação imobiliária, com o surgimento de novos condomínios em determinadas áreas? Novos empreendimentos levam a novas possibilidades de disposição territorial”, supõe a gerente, destacando que a PDAD de 2021 vai permitir a comparação de dados. “Antes não era possível fazer essas observações porque faltava estudo, esse é o primeiro nesse sentido”, completa.
Saídas e entradas
Os maiores saldos migratórios entre 2015 e 2018 — ou seja, o total de pessoas que entraram em uma RA descontando as que deixaram a região — ficaram com Águas Claras (18.901), Sobradinho 2 (17.825) e Riacho Fundo 2 (12.987). Por outro lado, Sobradinho, Plano Piloto e Ceilândia foram as regiões com os menores saldos migratórios: -22.813, -17.208 e -12.987, respectivamente. Em Sobradinho, a maior parte de quem se mudou foi para Sobradinho 2. Os migrantes que saíram do Plano Piloto foram para Águas Claras, Guará, Lago Sul e Lago Norte. Quem saiu de Ceilândia passou a morar em Taguatinga, Riacho Fundo 2, Águas Claras e Samambaia.
A pesquisa também revela que 53% das pessoas que se mudaram no DF vivem em domicílio próprio. A publicitária Suzanny Costa, 29, está nessa estatística. Ela saiu de Ceilândia, RA em que nasceu, e fixou residência em Samambaia, em junho de 2017. “Morava de aluguel, em Ceilândia, desde que havia me mudado da casa dos meus pais. Surgiu, então, a oportunidade de financiar um apartamento junto com a minha mãe”, conta a jovem. Apesar da ligação com a RA onde nasceu, ela não pensa em voltar para Ceilândia por enquanto. “Ainda frequento a região por conta da minha família e também gosto muito da cultura, dos movimentos. Mas me apaixonei por Samambaia, que é tão rica culturalmente quanto a Ceilândia. Gosto de como as coisas são próximas umas às outras, você consegue resolver tudo perto de casa, além de ser um lugar bem tranquilo para viver”, elogia Suzanny.