O prédio da comercial da 713 Norte cuja laje desabou nessa sexta-feira (6/8) foi construído há 52 anos e passava por reformas elétricas e hidráulicas, devido a problemas de infiltração e alagamentos. Apesar do tempo, ele não tinha registros de irregularidades, segundo a Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística do Distrito Federal (DF Legal). Além disso, por ser de pequeno porte, a obra não exigia alvará. Mesmo assim, a falta de manutenção frequente nessas estruturas coloca em risco o patrimônio histórico da cidade e acende o alerta para outras construções nas vias W3.
O edifício pertence ao ex-deputado distrital Raad Massouh, que estava em Belo Horizonte no momento do desabamento, na tarde de sexta-feira (6/8). Ele reconheceu que a estrutura é uma das mais antigas da Asa Norte e afirmou que, nesta semana, uma equipe de operários fará o escoramento do que ficou em pé. “Foi meu pai quem levantou essa obra. E eu desocupei todos os inquilinos para fazer a reforma. Graças a Deus, não havia mais ninguém na hora. Minha consciência está tranquila, pois tive a preocupação de retirar todos os moradores para fazer as melhorias”, comentou.
Apesar de não haver mortes, um operário ficou ferido no pé, mas não precisou ser hospitalizado. Ele estava no térreo e conseguiu se proteger na hora do incidente. Em nota, a DF Legal informou que reformas como a do imóvel são de responsabilidade dos proprietários do edifício e dos técnicos que acompanham os trabalhos. “Não há em nosso sistema registro de pedido de vistoria ou denúncia quanto à obra”, ressaltou o documento.
Para a presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Heloísa Moura, o Distrito Federal sofre com a falta de manutenção de construções mais antigas. “Acham que, porque (o prédio) é velho, ele deve ser reformado. Destroem tudo (para reconstruir) ou deixam cair aos pedaços. Mas é preciso fazer manutenção constante dessas estruturas, porque, além de riscos de desabamentos, há perigo de incêndios”, alerta. Outro problema que a especialista menciona envolve a realização de reformas sem acompanhamento de responsáveis técnicos. “Às vezes, chamam alguém que trabalha com construções, mas não tem registro e (essa pessoa) tira elementos importantes da obra. É uma questão de preservação e de exercício legal da profissão”, comenta.
Heloísa lembra que o tempo de manutenção varia de acordo com a edificação e que o ideal é promover revisões na estrutura uma vez por ano. “Independentemente de a construção ser nova ou antiga. Todo edifício tem vida própria. Por isso, é preciso haver monitoramento de eventualidades. O próprio solo pode interferir com o passar dos anos”, acrescenta a presidente do IAB, que chama a atenção para a possibilidade de expansões irregulares interferirem nesse processo.
Susto
A laje do primeiro andar do prédio desabou por volta das 14h30. O edifício tem três níveis, e os dois pisos superiores, residenciais, passavam por reforma. No momento da queda, dois estabelecimentos funcionavam no térreo: um restaurante e uma elétrica. Vinte bombeiros acompanharam a ocorrência. Três operários atuavam nas obras, na parte superior. Ao ouvirem barulhos vindos da estrutura, eles desconfiaram do risco de desabamento e deixaram o local.
Antes de cair, o teto cedeu cerca de cinco centímetros. Após o incidente, os bombeiros esvaziaram todas as unidades residenciais e os dois edifícios vizinhos. A Defesa Civil não identificou anomalias nas outras construções, mas isolou a região. O órgão deu 24 horas para o responsável pela obra fazer o escoramento de toda a estrutura do prédio, a fim de impedir novos desabamentos, retirar os escombros e pedir um laudo técnico, em até 10 dias, com avaliação do que restou, apontando possíveis soluções.
Uma mulher, que preferiu não se identificar, morou em um dos apartamentos do edifício por três anos, mas mudou de endereço no fim do ano passado. Ela contou ao Correio que o espaço tinha muitas infiltrações e que alagava constantemente. “Tudo era muito antigo e precisava de reforma. A água é um câncer em uma laje”, desabafou. A cuidadora de idosos Jusciana dos Santos, 42, se surpreendeu ao chegar do trabalho e encontrar diversos bombeiros e policiais embaixo do bloco onde mora. “Eles falaram que eu não poderia dormir em casa. Peguei o necessário e arrumei um lugar para dormir, mas até quando ficarei fora de casa?”, questionou.
O barulho do desabamento foi tão alto que pôde ser ouvido por moradores da 714 Norte, como Natália Ribeiro, 24. “Foi um susto muito grande. Meus cachorros ficaram latindo, agoniados. No meu prédio, a estrutura é bem parecida com a do que desabou. Então, ficamo inseguros, com medo e reféns, sem saber o que pode acontecer. Os prédios da Asa Norte são bem antigos, principalmente esses da comercial”, observou.
Allan Miranda, 29, trabalha em uma quadra próxima ao local e também se assustou. O chaveiro conta que, depois do estrondo, viu muita poeira e itens quebrados. “Teve um fumaceiro. Ontem (sexta-feira), meu pai passou em frente à obra e estranhou, porque não havia mais qualquer estrutura de sustentação. Tinham tirado todas pilastras (que davam apoio à laje). Até comentamos que poderia dar problema. Era meio óbvio”, relatou.
Memória
20 de outubro de 2017
O técnico de edificação Agmar Silva, 55 anos, morreu soterrado pelos escombros de um prédio de seis andares, na Colônia Agrícola Samambaia. Ele vistoriava a construção, que ficava em uma área irregular, quando a estrutura desabou parcialmente. O corpo dele só foi encontrado 60 horas após o início das buscas, que mobilizou 30 bombeiros militares.
4 de fevereiro de 2018
O piso térreo do Bloco C da 210 Norte desabou sobre a garagem do prédio. Cerca de 25 carros foram esmagados, e os moradores deixaram o edifício às pressas, com medo de novos incidentes. Depois de uma avaliação da Defesa Civil, os moradores foram liberados para voltarem aos apartamentos. Ninguém se feriu, e a reinauguração do espaço após as reformas ocorreu dois anos depois.
6 de fevereiro de 2018
Duas das três pistas do Eixão Sul cederam sobre a Galeria dos Estados, no sentido Rodoviária do Plano Piloto. Os escombros atingiram, parcialmente, um restaurante, mas ninguém se feriu. O então governador, Rodrigo Rollemberg (PSB), afirmou que a estrutura colapsou porque não havia passado por reparos. Parte das vias foram liberadas para carros mais de um ano depois.
10 de dezembro de 2019
Parte do asfalto entre a 709 e a 909 Sul cedeu, e uma cratera engoliu quatro carros. O buraco, de 10 metros de profundidade, abriu-se em um canteiro de obras, após uma forte chuva. Os carros estavam estacionados ao lado do tapume que isolava o espaço de construção. À época, a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) informou que o incidente decorreu de um rompimento na tubulação da rede de esgoto.