VALORIZAÇÃO

No meio do caminho: arte em grafite renova ares na Galeria dos Estados

Marcada por um incidente em 2018 — felizmente, sem vítimas —, a região da Galeria dos Estados vive um novo momento. Após passar por uma intervenção artística, recentemente, o espaço ganhou vida, cores e se renovou graças ao grafite. Trabalhos transformaram subsolo em mostra livre para a população

Mariane Rodrigues
postado em 17/08/2021 06:00 / atualizado em 17/08/2021 06:51
 (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Desde que foi totalmente reformada, há quase um ano, a Galeria dos Estados voltou a atrair brasilienses de todas as partes do Distrito Federal. Um dos novos chamarizes é a arte, que, por meio do grafite, tirou o cinza do espaço para dar lugar às cores. A transformação ocorreu recentemente, graças ao trabalho de 100 artistas que promoveram uma intervenção no local, em painéis com áreas de 10 a 20 metros quadrados sob o viaduto de mesmo nome. Cada profissional recebeu R$ 1,5 mil do Executivo local para produzir os trabalhos.

As ilustrações de tema livre renovaram os ares na região, marcada pela queda de parte do viaduto, em 2018 (leia Para saber mais). Para representar mulheres fortes que levantam bandeiras pela conquista de direitos, sete grafiteiras se uniram na produção de um dos trabalhos. Entre as artistas está Lua Pereira, 26 anos. A jovem elaborou uma pintura em homenagem à rainha Nzinga, conhecida pela luta contra a escravidão de negros no continente africano. “Foi uma experiência incrível poder produzir coletivamente, com vários grafiteiros do DF e do Entorno. É algo enriquecedor para mim, pois aprendo muito quando pinto na rua com outros artistas”, comenta.

Para Lua, a mensagem transmitida por meio da arte carrega informações transformadoras para o público que passa naquele espaço. “Eu sempre me inspiro nas mulheres negras que são fortes. Busco apreender essa força para mim e levá-la para outras mulheres que possam acessar minha arte”, acrescenta a grafiteira. A intervenção ocorreu no mês passado, em uma ação da Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa (Secec) intitulada 4º Encontro do Graffiti, que havia selecionado os 100 autores das pinturas por meio de um edital. “O projeto reflete a política pública de valorização da arte urbana, uma das pioneiras no país. O legado da Galeria dos Estados, transformada por 2 mil sprays de tinta, é de pertencimento e valorização artística”, informou a pasta.

O grupo de Lua não foi o único a se unir para se expressar. A grafiteira Naiana Alves, 32, ficou responsável por um painel de 20 metros quadrados com outras cinco artistas. O grupo optou por uma temática focada nas mulheres. “Colocamos essas personagens como tema principal, em uma atmosfera mística, lúdica e com elementos orgânicos. Cada grafite levou um universo de sensibilidade, garra, força e sensualidade. Cada artista, à própria maneira, representou as diversas almas femininas”, detalha.

Movimentação

Além das artes, a reforma da Galeria dos Estados incluiu a instalação de pisos em granito, revestimentos nas paredes e no teto, cabeamento para internet, reforma dos banheiros, circuito interno de câmeras, além de iluminação de LED. Ontem, o bartender Eduardo Vitor Santos, 32, passou pelo corredor para andar de skate e parou para apreciar as artes. Ele conta que as pinturas levaram vida ao local e ampliaram o espaço. “Parece estar mais alegre, mais vivo. E, no geral, a transformação me trouxe mais segurança. Antes, eu passava por aqui e sentia tremer a estrutura”, relata.

O público que passa por ali agora tem um espaço reformado e acessível. E, para quem trabalha no local, a reforma era esperada há anos. Edmilton Miranda, 58, é chaveiro e dono de uma lojinha na Galeria há 25 anos. Ele conta que o ambiente ficou mais agradável e seguro, tanto pelo ponto de vista dos que passam quanto dos profissionais que atuam na área. “Estávamos na luta pelas obras havia mais de 20 anos. Finalmente aconteceu. Agora, tenho esperança de dias melhores com a população passando sempre por aqui novamente”, comemora.

Josino Evangelista, 66, tem uma barbearia há 43 anos. O local tinha dois funcionários. No entanto, com a queda do viaduto e, depois, o início da pandemia, ele dispensou a equipe e, hoje, trabalha sozinho. “O lugar está muito bonito. Espero que as pessoas voltem aos empregos, para a Galeria dos Estados ser frequentada como antes”, torce. Josino lembra que a maioria dos órgãos e das empresas nos bairros próximos adotaram o regime de home office, o que levou a uma queda de 50% no faturamento mensal do estabelecimento dele.

E, para quem passou ao menos uma vez pelo subsolo, o restaurante Sancho Pança é velho conhecido. Uma das responsáveis pelo comércio, Zelma Soares, 40, conta que, desde a queda do viaduto, o movimento de clientes caiu 70%. “É estranho ver este lugar vazio. Mas a revitalização do espaço tem trazido o público de volta. Com o pessoal se vacinando, no último mês, senti melhora do fluxo por aqui”, destaca.

A Galeria dos Estados tem, atualmente, 25 lojas fechadas no subsolo. Para Zelma, a chegada de novos negócios pode agregar muito para o ambiente e melhorar o trânsito de pedestres — os possíveis clientes. “Algumas fecharam por causa da pandemia, mas a maior parte dos estabelecimentos estavam sem atividades havia muitos anos, antes mesmo do desabamento”, acrescenta Zelma. A ocupação dos espaços ocorrerá por meio de licitação para novos comerciantes. No entanto, ainda não há data de lançamento do certame.

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  • Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
    Marcelo Ferreira/CB/D.A Press Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
  • Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
    Marcelo Ferreira/CB/D.A Press Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
  • Edmilton é dono de uma loja no local há 25 anos; para ele, ambiente ficou mais agradável e seguro
    Edmilton é dono de uma loja no local há 25 anos; para ele, ambiente ficou mais agradável e seguro Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
  • Uma das donas do restaurante Sancho Pança, Zelma diz que revitalização tem levado público de volta à Galeria
    Uma das donas do restaurante Sancho Pança, Zelma diz que revitalização tem levado público de volta à Galeria Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press

Reconstrução

Parte da estrutura do viaduto do Eixão Sul que fica sobre a Galeria dos Estados cedeu, de maneira repentina, em 6 de fevereiro de 2018. O desabamento atingiu quatro carros e não houve vítimas. A região passou mais de um ano interditada devido às obras. Em junho de 2019, o acesso foi liberado novamente para motoristas. A reconstrução contou com o trabalho de 138 operários e investimento de R$ 12 milhões. A revitalização interna do espaço se deu por meio da recuperação da estrutura viária e da passagem subterrânea, onde há comércios e uma estação do metrô.

 

 

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