COMPORTAMENTO

Brasilienses adotam nova rotina para acompanhar jogos das Olimpíadas

Espectadores do DF driblam o sono para não perder as disputas dos brasileiros nos jogos de Tóquio. Do balcão da padaria bem cedinho ao sofá nas altas horas, vale tudo!

Acompanhar os Jogos Olímpicos no fuso horário do Japão exige dos torcedores uma disciplina semelhante à dos atletas de alto rendimento. É preciso vencer o cansaço e abrir mão de algumas horas de sono para assistir às partidas madrugada adentro. Os jogos que começaram em 21 de julho só terminam em 8 de agosto. Para dar conta da rotina, até um cafezinho vai bem. O importante é aproveitar... Torcer... E se emocionar.

Desta vez, em vez das partidas celebradas nos bares, é nas padarias que o público que precisa ssair cedo de casa acaba assistindo alguns flashes das modalidades. “Quem está lanchando olha rapidinho, mas não pode aglomerar”, destaca Dízia Ribeiro, 60 anos, dona de uma padaria na Asa Sul, onde há uma pequena tevê atrás do balcão.

Em outro estabelecimento próximo, a operadora de caixa Suelen Lopes ressalta que o movimento é maior na hora das partidas. “Por volta das 6h30, quando os clientes param para comprar o pão, dão uma olhadinha na televisão”. O servidor público Mateus Brandão, 34, é aficionado por esportes, mas não acompanha pela madrugada. Ele preferiu assistir de manhã, na padaria. “Enquanto tomo meu café, acompanho os resultados para ver se o Brasil ganhou alguma medalha”, disse, ao lado da irmã, a servidora pública Aline Moraes, 32.

Com medo da pandemia de covid-19, muita gente vê as partidas de casa mesmo. Quando o despertador toca no meio da madrugada, a advogada Isadora Saldanha, 29, resiste para acordar, mas fica tentada a ir para o sofá. “Várias vezes falei: ‘não vou levantar’”. Porém, enquanto fica na cama, logo vem à mente um pensamento: “Mas (o Brasil) pode ganhar o ouro”. Pronto, é assim que ela encontra motivação para se deslocar até a sala, ligar a tevê e torcer pelo Brasil.

Foi com esse impulso que às 4h20 da última terça-feira ela testemunhou pela televisão a conquista da primeira medalha de ouro do país no surfe, com Ítalo Ferreira. “Faltando uns três minutos para acabar a bateria, já estava chorando, não sabia nem o porquê, nunca tinha visto esse tipo de competição”, disse. “Mas no Brasil, que não investe em esporte, você ver um cara do Nordeste ganhar o ouro olímpico, é muito bonito, não tem como aguentar”.

Para se manter acordada noite adentro, ela não dispensa os reforços. Eu estou tomando muito café, são baldes (risos)”. Depois disso, a partida começa e a adrenalina toma conta da “arquibancada” de casa: a cada ponto favorável para as equipes brasileiras, ela e a mãe vibram no sofá. “Os canais vão informando qual a próxima partida do Brasil, vou trocando para ver em todos”.

Entre um jogo e outro, ela tira um cochilo de poucas horas para se recuperar e voltar à torcida. “É uma maratona, a gente tem que se adaptar. Fico cansada, o sono bate, não vou mentir, mas gosto muito”. Ao raiar do dia no Ocidente, Isadora se arruma e vai para o trabalho às 9h, onde fica até as 18h. Nesse meio tempo, os grupos no WhatsApp fervem com as últimas atualizações dos resultados dos jogos e, mesmo no escritório, ela não deixa de acompanhar as disputas. “Coloco o fone de ouvido, minimizo a tela e vou acompanhando”, revelou.

Vibração

Mas nem todo mundo consegue completar a prova do revezamento de quatro canais para ver todas as partidas. Thays Rocha, 23, é profissional de educação física e treina crianças de 3 a 12 anos na ginástica artística. O treinamento em várias escolas começa cedo: por vezes, às 8h, e, em alguns dias da semana, vai até as 20h.

“Se acompanhar tudo, não durmo nem trabalho, mas tento conciliar, porque é o evento de que mais gosto”, pontuou Thays. “Por isso, foquei na ginástica e no skate, que era uma modalidade nova e ganhou muita visibilidade”. A pequena Rayssa Leal, 13, conquistou a prata na modalidade street.

Quando o cansaço vence, Thays dá um jeito para se manter por dentro do que acontece na Vila Olímpica em Tóquio. “No dia da abertura, coloquei no celular e trabalhei com ele na mão. Quando não assisto, vou atrás de notícias e vídeos, vejo a reprise”. No trabalho, ela e os colegas instalaram uma televisão para assistir às partidas da manhã, inclusive com as alunas.

“Aqui, no trabalho, o sonho das meninas é ir para as Olimpíadas”, contou. Para incentivá-las, a treinadora colocou para tocar o hit Baile de favela, que viralizou com a apresentação da ginasta Rebeca Andrade, e as pequenas atletas treinaram no solo ao som do funk. “Foi superdivertido, preparamos as alunas para mostrar que também podem chegar a lugares altos”.

Bastidores

A professora Paula Rosa, 30, já tinha uma relação íntima com o evento: em 2016, foi voluntária nas Olimpíadas do Rio. “Gostei muito de fazer parte dos bastidores, ver a preparação dos atletas, sentir o nervosismo deles, a correria”, relatou. Depois da experiência, em que até carregou a tocha olímpica, ela queria repetir a dose, mas, com a pandemia de coronavírus, apenas os japoneses puderam se voluntariar para trabalhar no torneio. “Na próxima, pode ter certeza de que vou.”

Em recesso escolar, ela consegue ficar vidrada na telinha para ver os atletas. Na hora de torcer, pega o uniforme dos voluntários do guarda-roupa e prepara um lanche para se manter acordada. “É uma energia que dá, na torcida, vale a pena”, afirma. “Tem essa preparação de colocar a roupa para dar sorte, tem dado certo”.

Aliás, para Paula, essa é outra diferença dessa edição dos jogos em relação às anteriores, a relevância que ganharam as redes diante da necessidade do isolamento social. “Eu acompanho os atletas nas redes sociais, estimulam a gente a assistir, principalmente os do vôlei e do skate. Isso aproxima o público, é legal saber o que está acontecendo por trás, saber como funciona”. A torcida continua...