Nesta semana, o Governo do Distrito Federal (GDF) assumiu a gestão da frota de ônibus que circulam por algumas das cidades do Entorno. A Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) ficará responsável pela administração do sistema, que contempla 396 linhas de sete operadoras, em 11 municípios goianos (leia Locais afetados). A mudança ocorreu em janeiro, por determinação da Agência Nacional de Transporte Terrestres (ANTT). À época, a autarquia informou que as características do sistema que atende as duas regiões compõem um modelo urbano que deveria ser administrado, de maneira compartilhada e integrada, pelo DF, devido à proximidade entre as áreas contempladas.
Atualmente, a Semob administra 755 linhas. Miquaias Costa, 23 anos, mora em Valparaíso (GO) e trabalha como atendente em um mercado no Plano Piloto. Para conseguir assumir a função às 7h, ele acorda às 5h. Mesmo assim, costuma se atrasar. “A falta de ônibus e o próprio trânsito são coisas que fazem com que eu perca o horário”, relata. Para o jovem, mais coletivos ou uma via para BRT poderiam resolver o problema. “Além disso, tem o preço das passagens, que são altas e parecem aumentar a cada ano que passa”, critica Miquaias.
As tarifas do Entorno para o DF variam entre R$ 5,40 e R$ 7,80 atualmente. E, com a troca da gestão, não devem sofrer alterações, segundo a Semob. O mesmo vale para o sistema de bilhetagem automática. Na prática, a integração ocorrerá apenas de maneira operacional, sem descontos em passagens ou permissão para uso do Passe Livre fora da unidade da Federação frequentada pelos estudantes, por exemplo. “O aluno que mora em município fora do DF não poderá usar o cartão (do benefício) em ônibus do Entorno”, ressaltou a secretaria.
O GDF pretende fazer um planejamento das linhas em circulação e dar início a um novo Plano de Outorgas — processo para liberar a circulação de coletivos e que não tem data para acabar, por enquanto. Até janeiro de 2021, a administração ficava a cargo do Governo Federal. No entanto, enquanto a transferência estiver em andamento, não há previsão de trocas nas linhas, horários ou autorizações das empresas. A Semob informou que, com a mudança, pretende “racionalizar o atendimento” por meio da integração, a fim de “reduzir o tempo de viagem e facilitar a vida dos passageiros”.
Expectativas
Cleide de Oliveira, 55, mora no Entorno há 40 anos e depende de ônibus todos os dias para chegar ao trabalho, em um shopping na Asa Norte. A moradora de Valparaíso cobra a inclusão de mais veículos à atual frota como forma de garantir mais conforto aos passageiros. “Estão sempre muito lotados. E, de manhã, há muitos idosos nos ônibus. Era uma situação ruim antes, agora, em tempos de pandemia, fica mais perigoso. Nos fins de semana é pior. Por isso, muitas pessoas optam pelos transportes piratas”, pondera a operadora de caixa, que também reclama da precariedade dos veículos. Segundo a ANTT, eles têm nove anos de circulação.
Em vídeo publicado nas redes sociais, o secretário de Transporte e Mobilidade do DF, Valter Casimiro, reforçou que não haverá mudanças imediatas na prestação dos serviços, mas ressaltou que a expectativa é garantir a comodidade aos passageiros, por meio da integração. “(A nova gestão) vai facilitar a inclusão de novas regras na frota do Entorno, com aplicação das mesmas exigências que colocamos aqui para o DF, como idade da frota de ônibus e cumprimento de horário”, declarou o chefe da pasta.
Para Adriano De Bortoli, professor na Universidade de Brasília (UnB) e especialista em direito ao transporte, o GDF não poderá operar o sistema com a atual frota, pois uma transição é necessária. Ele concorda que os veículos são velhos e precisam de melhorias. “São antigos, malconservados, desconfortáveis, superlotados, e a frota é insuficiente para a demanda de passageiros. Deve-se melhorar muito a qualidade e a quantidade da oferta de serviços, com tarifas pequenas, como prevê a lei”, lembrou o pesquisador.
O especialista acrescentou que a falta de mobilidade pode ter outros impactos negativos para a população. “Isso é direito fundamental, deve ter eficácia imediata e plena. A ausência disso afeta o acesso a serviços públicos, emprego e renda, bem como empobrece e exclui parcela significativa da população”. Adriano também ressaltou que a chance de a população incentivar mudanças significativas é por meio das eleições: “Escolhemos nossos representantes para a Câmara Legislativa e para o governo do DF. É o voto que define a maior ou menor eficácia de direitos e do atendimento a interesses legítimos dos eleitores”.
Palavra de especialista
Sistema igualitário
Esse processo de integração era necessário. Demorou muito. Era hora de que o Governo do Distrito Federal (GDF) tomasse as rédeas sobre isso. Agora, seria necessário, no processo de transição, acompanhar a população, para ver de perto do que ela precisa. Ouvi-la de verdade, para ver se as alterações atenderão às demandas reais. A integração será um ponto fundamental, mas é preciso garantir que as pessoas que moram, por exemplo, em Luziânia (GO), consigam chegar ao fim do Lago Sul sem gastar mais e em um tempo adequado. Outras questões como a idade da frota e o uso de tecnologia precisam ser resolvidas com urgência. As pessoas do Entorno precisam ter a mesma condição daquelas que viajam pelo Plano Piloto. Não se pode ter essa diferença entre os públicos. É preciso trabalhar com um serviço igualitário para todos.
Pastor Willy Taco, professor do curso de engenharia civil da Universidade de Brasília (UnB)
Locais afetados
Confira por quais cidades de Goiás circulam as linhas que passam a ficar sob gestão do GDF:
» Águas Lindas
» Cidade Ocidental
» Formosa
» Girassol (distrito de Cocalzinho)
» Luziânia
» Mansões Marajó (loteamento em Cristalina)
» Monte Alto (distrito de Padre Bernardo)
» Novo Gama
» Planaltina de Goiás
» Santo Antônio do Descoberto
» Valparaíso