Crônica da Cidade

Crônica é cringe?

Definitivamente sou cringe. Devo me encaixar em, pelo menos, 80% das definições dessa nova gíria que chegou ao mercado de ações da juventude Z. Gosto de sapatilha de bico arredondado, uso emojis em conversas pelo “zap” — e até prefiro as carinhas digitadas no teclado —, adoro um sucesso musical do passado, tenho dificuldade em acompanhar os hits da temporada, não assisti ao Big Brother Brasil e prefiro convites a uma tarde em um café às “baladas” virando a madrugada.

É claro que nada dessa declaração faz sentido, já que só mesmo os jovens, população, portanto, fora do espectro cringe, são os detentores da prerrogativa de taxar outra pessoa com esse rótulo. Prova cabal do meu nível de “cringice”. Eu provavelmente erraria até a forma de pronunciar a palavra. Colocaria aquele sotaque pretensioso e impecável aprendido no cursinho de línguas.

Não à toa, o termo escolhido é justamente o que, no inglês, se refere a “vergonha alheia”. Sim, porque, aparentemente, usar uma expressão em outro idioma é que está realmente na moda e nos torna superconectados. Para completar o nível cringe desse comentário, reforço que ele contém ironia.

Fiquei pensando se escrever crônica seria considerado cringe. Mas acho que nossos julgadores de plantão poderiam abrir uma exceção. Afinal, não há texto mais versátil e passível de reinvenção e de transformação para as necessidades e realidades de cada tempo do que este. Se minha humilde opinião valer de alguma coisa, peço que a considerem com carinho.

Desisti de tentar acompanhar as novidades desse mundo 4.0 quando, na semana em que aprendi a usar os GIFs nas conversas por aplicativos, surgiram as figurinhas, os tais “stickers”. Sabia que se tratava de uma jornada fadada ao fracasso. Nunca, porém, dei a luta por encerrada.

A internet e, mais especificamente hoje, as redes sociais abrem um mundo de possibilidades. Negá-las é, na melhor linguagem da minha geração, ultrapassado, e fingir fazer parte sem ter a menor noção do que se tratam significa, ao estilo da geração dos meus pais, breguice extrema.

Sim, amigos, todos nós, naquele arroubo da adolescência e da juventude, já criamos ou disseminamos as nossas cringices pelo mundo. Aos novinhos da geração Z, um recado direto de uma cringe, com orgulho (e digo isso também com ternura S2): o alfabeto acabou, e o que é de vocês tá guardado! Vamos no ritmo de Bethânia? “O que é teu já tá guardado / Não sou eu que vou lhe dar / Não sou eu que vou lhe dar / Não sou eu.”