No Brasil o novo coronavírus já infectou desde o começo da pandemia, segundo a última atualização do Ministério da Saúde, 16.274.695 pessoas. Por isso, apesar de sequelas serem raras, devido ao alto número de infectados, o percentual de pacientes com complicações provenientes da covid-19 também é alto. Soma-se a isso o fato de que, na avaliação do professor da Universidade de Brasília e neurologista do Hospital Sírio-Libanês, Felipe Von Glehn, o número de pessoas infectadas em quase 17 milhões está subnotificado.
“Estamos em uma pandemia e a taxa de infecção deve estar acima de 20 milhões de pessoas. Com isso, mesmo que as sequelas raras provocadas pelo vírus sejam abaixo de 1% o número de pacientes com esse tipo de agravante se torna alto”, explica. Os casos de alterações neurológicas envolvem perda, mesmo depois de recuperados da covid-19, do paladar e olfato, assim como polineuropatia ou síndrome de Guillain-Barré aguda, que tem como sintomas uma fraqueza ascendente nos pacientes.
Felipe Von Glehn foi o entrevistado, por Carmen de Souza, desta quinta-feira (27/5) no CB. Saúde — uma parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília. O professor explicou que casos de encefalite também foram relatados. “O vírus, em casos raros, pode causar uma inflamação no cérebro e levar a crises compulsivas e alteração do nível de consciência. O número de sequelas aumenta se colocarmos também alterações psiquiátricas como transtorno de ansiedade e estresse pós-traumático”, esclareceu.
“Qualquer infecção pode causar dor de cabeça, febre e dor no corpo. O que acontece é que vemos uma frequência maior de pessoas se queixando desses sintomas mesmo após passar pela fase aguda do covid-19. Só lembrando que a principal manifestação do vírus é um quadro respiratório e alguns sintomas como diarreia e gastroenterite”. O neurologista explica que um sintoma pode ser considerado uma sequela da covid-19 quando o paciente já passou duas ou três semanas da infecção aguda e continua com os sintomas. “Caso passe desse prazo e os sintomas persistam, como falta de memória e atenção, encefalite e outros, o conselho é procurar um neurologista para ver se existe algum agravante no quadro”, sugeriu.
Em busca de respostas
Apesar dos indicativos, os estudos estão em andamento para dados mais conclusivos sobre o assunto. O professor da UnB explica que identificar como acontece essa ação neurológica da covid-19 no cérebro é um desafio. “Quando surgiu o primeiro coronavírus, o Sars-CoV-1, em 2002, foi visto que ele afetava o nervo que nos dá a sensação dos odores. O vírus tinha a capacidade de invadir a mucosa nasal e afetar o nervo olfatório. Com o tempo, começamos a questionar se o novo vírus, do Sars-CoV-2, também possuía essa capacidade. Através de estudos anatomopatológicos e experimentos in vitro, foi visto que o vírus consegue, sim, invadir o neurônio. Mas não é em todo o indivíduo que isso acontece”, destaca.
Embora seja incomum, o professor relata que existem casos que o vírus chegou até o tronco cerebral, o que pode, inclusive, piorar o quadro respiratório do paciente. “Nós temos diversos casos em estudo, mas como a pesquisa ainda não foi finalizada, não tem como estabelecer uma correlação causal entre a covid-19 e os quadros de sequelas neurológicos. De qualquer forma é importante entender, até mesmo para as pessoas não ficarem em pânico, que isso acontece em casos raros e não é o comportamento comum da doença”, finaliza.