O aviso da chegada das ondas, a risada das pessoas que se reuniam no balanço de suas águas, e as histórias das centenas de brasilienses que marcaram presença em seus azulejos azuis fizeram da Piscina com Ondas, do Parque da Cidade Sarah Kubitschek, marco da capital federal. Quem passa pelo Estacionamento 7 consegue ver, ao longe, uma portaria de tijolinhos, espaço que, há muito tempo, era ponto de encontro das famílias do DF. À espera de sua reinauguração, antigos frequentadores compartilham as memórias saudosas da piscina de Brasília.
A psicóloga Juciléia Rezende Souza, 45, era uma das visitantes assíduas das águas movimentadas. Ela conta que o passeio era um dos favoritos da família. “Brasília não tinha tanta opção de lazer como tem hoje, e o parque era sempre uma. Então, costumávamos sempre ir para lá, usar a churrasqueira, reunir as famílias, amigos. Quando tinha a piscina, era especial. Íamos cedinho, passávamos o dia, ficávamos até depois do almoço. Era o dia de comer besteira, chupar picolé e se divertir”, recorda-se.
As ondas, que vinham após o alerta da sirene, eram motivo de festa. “Todos se levantavam para ir para dentro da água. Com o cuidado de brincar sem levar tromba d’água”, conta, entre risos. “Brincar com meu pai, na água, é a memória mais marcante. Entrávamos, e morríamos de rir. Era sempre especial, tinha sempre o desafio de brincar entre as ondas, nunca era o mesmo”, ressalta Jucélia.
Ponto de encontro
Conhecida como principal atrativo do, à época, Parque Recreativo Pithon Farias, a piscina tornou-se ícone dos anos 1980 e 1990. Inaugurada em 1978, ficou famosa como a primeira instalação do gênero na América Latina. Produzia ondas de até um metro de altura. Nos fins de semana, costumava receber cerca de 10 mil pessoas e tornou-se um dos pontos turísticos mais visitados de Brasília. Nas proximidades, aconteciam rodas de viola entoadas por estudantes brasilienses e por Zélia Duncan e Cássia Eller, quando ainda eram anônimas.
Depois da desativação, em 1997, o Governo do Distrito Federal vai reativar a estrutura. Em meio ao azul e às diversas pessoas que “surfavam” nas águas, estava a enfermeira Marcela Vilarim Muniz, 45 anos. Moradora do Jardim Botânico, ela relata que a piscina era um local de diversão e de conhecer gente nova. Para Marcela, à época, Brasília não oferecia opções de entretenimento para crianças. “Tinha o parque do foguete, atualmente conhecido como Ana Lídia, os castelinhos. Nós não tínhamos muitos parques, com exceção das quadras, que brincávamos com carrinho de rolimã. Nós não tínhamos um centro de encontro”, afirma.
Mãe de duas crianças, a enfermeira diz que está ansiosa para levar os filhos ao local que fez parte da sua infância. “A única piscina de ondas que eles conhecem é a do Hot Park e, mesmo assim, não queriam sair nunca mais. Imagina ter uma aqui, bem pertinho? Eu quero que vivam aquilo que eu vivi. Sei que as coisas não se repetem, mas pode ser tão legal quanto aquela época”, acredita.
Experiências
Brasília é terra de todo mundo e, a piscina com ondas, não poderia ser diferente. Natural do interior de Tocantins, o bombeiro militar Obernan de Santana Souza Borges, 44, conta que chegou à capital no final de 1991, em busca de uma vida melhor e, aqui, encontrou novas experiências. “A minha relação com a piscina de ondas é muito forte, porque foi a primeira que frequentei na vida. Aos 16 anos de idade, sertanejo, não tinha oportunidade de ir até uma. E, ao chegar aqui, ainda naquele ano, tive a oportunidade de frequentar e isso me marcou. O que vem em mente é um lugar de alegria, onde vimos vários jovens, famílias reunidas. Aquilo era um ponto de euforia, com o movimento das ondas”, destaca
Independentemente da classe social, foi ali, no Parque da Cidade, que muitos tiveram a chance de se divertir. O vigilante Valdenir Tomé da Silva, 45 anos, frisa que, apesar de não ter tido condições financeiras na infância, o local dava acesso à quem quisesse curtir. “Morávamos em Ceilândia. Na época, tínhamos poucas condições. Lanche era sempre pão com mortadela e garrafa de suco”, narra. Agora, a meta é voltar a frequentar o espaço. “Claro, com mais proveito ainda”, garante.
Reativada
O processo de reativação da Piscina com Ondas, no Parque da Cidade Sarah Kubitschek, está andamento. De acordo com a Secretaria de Esporte e Lazer do Distrito Federal (SEL-DF), a estimativa é concluir e enviar para licitação em 60 dias. “Nos próximos dois meses, estará concluído o projeto completo com toda tecnologia e custo-benefício necessários para o desenvolvimento das atividades”, informou o órgão, em nota oficial.
Com investimento estimado de R$ 8,5 milhões, provenientes do orçamento próprio da SEL, o projeto arquitetônico e urbanístico da empresa selecionada, por meio de chamamento público, começará a ser executado no segundo semestre deste ano. “O Parque da Cidade e a Piscina com Ondas fazem parte da história de Brasília. Sabemos como isso mexe com nós, brasilienses, que vivemos aqui”, defende a titular da pasta, Giselle Ferreira de Oliveira.
De acordo com Giselle, a piscina foi desativada devido ao alto custo de manutenção. “O governador Ibaneis Rocha (MDB) está muito atento, tanto à história quanto aos equipamentos públicos para a prática de esporte, porque sabemos que, quanto mais as pessoas praticarem atividades físicas, quanto mais tiverem o espaço público para lazer, mais a qualidade de vida e a imunidade melhoraram. Pós-pandemia, acreditamos que isso será valoroso”, destaca a secretária.
O projeto encontra-se em fase final de aprovação, para, então, ser licitado. Ao ser questionada sobre a possibilidade de um novo desligamento, devido ao alto custo de manutenção, a secretária afirmou que o propósito da iniciativa é encontrar métodos que evitem tal situação. “Nós estamos procurando, tecnicamente, fazer o projeto. Sabemos que a tecnologia dos materiais está bem avançada. Então, vamos aguardar. Mas eu acredito na democratização. O Parque da Cidade sempre foi tão democrático e acessível a todos. Vamos continuar assim”, acrescentou.