Dados da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), divulgados na pesquisa Pessoas com deficiência: perfil demográfico, emprego e deslocamento casa-trabalho, mostram que a capital do país possui 139.708 habitantes com algum tipo de deficiência. O número equivale a 4,8% da população.
Apesar do grande número de brasilienses com algum tipo de transtorno ou deficiência física, muitos ainda sofrem com a exclusão da sociedade e com a falta de projetos que os beneficiem. Por isso, para ajudar essa parcela de moradores da capital e do Entorno, Almir Vieira, presidente da Federação Hípica de Brasília, criou o Projeto Abrace a Equoterapia. A iniciativa tem o objetivo de atender a crianças e adolescentes entre 3 e 17 anos de idade com algum tipo de transtorno ou deficiência física, cujas famílias recebam até três salários mínimos por mês.
Segundo Almir, o projeto foi apresentado na Câmara Legislativa em 2020 para ser aprovado no orçamento do DF deste ano. Até o momento, 28 pessoas já foram cadastradas para fazer as sessões de equoterapia que começaram na última terça-feira, no Centro Hípico do Parque da Cidade.
“Tivemos essa iniciativa porque muitas pessoas não têm condição de pagar por um tratamento como esse, por isso focamos em beneficiar as pessoas com baixa renda. Nosso objetivo é atender até 100 pessoas por mês. O projeto demorou para começar apenas devido ao lockdown em Brasília, mas estamos retomando as nossas atividades com todos os protocolos de segurança”, destaca o idealizador do projeto.
Almir Vieira explica que, para fazer parte da equoterapia, é necessário uma indicação médica que permita a intervenção com os cavalos. “Para participar, os pais precisam apresentar uma solicitação médica, porque temos um protocolo a cumprir e maneiras adequadas de atender cada paciente. Se algum deles tiver alguma restrição, por exemplo, a equoterapia tem que se adequar às suas necessidades”, explica.
Heitor Gomes Moreira, 8 anos, foi um dos que aproveitaram o primeiro dia de equoterapia no Centro Hípico do Parque. Moradora de São Sebastião, Junisvânia Santos Gomes, 33, falou sobre a felicidade do filho ao ter a primeira aula. “Ontem foi o aniversário dele, então foi um presente ter essa aula. Ele gostou bastante, até porque já andou outras vezes a cavalo. E eu já estava há um tempo procurando por uma equoterapia, mas nunca havia conseguido, principalmente devido ao valor”, contou.
A dona de casa recebeu o diagnóstico de Heitor há quase três anos e, desde então, dedica-se a conseguir terapias de intervenção para o filho. “Quando eu descobri que ele era autista, larguei tudo para cuidar dele e ajudar em seu desenvolvimento. A minha expectativa é de que será uma mudança muito grande no desenvolvimento e na coordenação motora do Heitor”, revela.
Interação com o animal
A educadora física Franciele Lopes Fenker, 39 anos, trabalha com a equoterapia há 10 anos. “Essa intervenção traz diversos ganhos na linguagem, no relacionamento e na organização das crianças. Auxilia a questão de espaço e temporalidade, assim como de percepção visual e auditiva. Crianças com paralisia cerebral, por exemplo, têm um ganho com a marcha do cavalo, pois desenvolvem musculatura e começam a andar sem cair”, explica.
Franciele lista alguns dos exercícios realizados. “Primeiro, começamos com um alongamento em cima do cavalo. Treinamos o equilíbrio com as crianças abrindo os braços enquanto o animal anda; há dinâmicas de colocar argolas nas orelhas do animal e andar de costa no cavalo. Com alunos que já possuem uma adaptação maior ou já tiveram aulas, também fazemos zigue-zague, controle do cavalo ao andar em cones e outras atividades. Tudo isso desenvolve muito a autonomia da criança”, destaca a educadora.
Por isso, Jéssica Silva de Carvalho, 27, moradora de São Sebastião e dona de casa, espera ansiosa pela primeira aula da filha, Aylla Carvalho de Oliveira, 6. “Eu conheci o projeto por meio do pessoal do Ceal (Centro Educacional da Audição e Linguagem Ludovico Pavoni) e não vejo a hora de começar, acredito que vai trazer um rendimento muito positivo para a Aylla, principalmente ajudando a se adaptar em ambientes diferentes do que ela vive”, explica a mãe.
Aylla foi diagnosticada em 2019 com perda auditiva moderada-severo bilateral. Atualmente, utiliza um aparelho auditivo obtido pelo Sistema Único de Saúde. “Ela desenvolveu a leitura labial para entender o que falamos, por isso olha muito para a nossa boca. Agora, com o aparelho, facilitou muito a nossa vida, e com a equoterapia ela vai se desenvolver ainda mais. Ela gosta muito de animais e imagino que a equoterapia vai facilitar as dificuldades que ainda enfrenta”.
Incentivo
Flávio Pereira dos Santos, titular da Secretaria da Pessoa com Deficiência, explica que a pasta busca auxiliar esse e diversos tipos de atendimento para as pessoas com deficiência na capital federal. “O projeto de Equoterapia é uma ação importante para o segmento, pois é um auxílio no desenvolvimento social e psicológico. A gente entende que é super-relevante esse tipo de iniciativa, e estamos acompanhando a execução do projeto. E claro, buscamos incentivar outras instituições a também desenvolverem projetos como esses”, afirma o secretário.
A moradora de São Sebastião, Cristiane Gonçalves da Silva, 27, mãe do pequeno Kauan Gonçalves da Silva, 6, espera ansiosa pelas aulas do filho que vão começar nesta semana. “O Kauan é autista e tem muita dificuldade motora. Espero que a equoterapia o ajude bastante nas questãos da escrita e do caminhar, que são um pouco atrasados, assim como na interação dele com os animais e pessoas”.
Para a dona de casa, a oportunidade serve também para o filho sair um pouco de casa e ter contato com outros ambientes. “Só em casa não rende tanto, porque ele fica isolado, sem ver outras pessoas. Antes da covid-19, ele fazia diversas terapias e agora que estamos retornando. A pandemia quebrou a rotina que ele tinha e os exercícios que ele fazia, agora espero retornar a um dia-a-dia mais ativo com ele”, finaliza.
Como participar
Entre em contato para agendar uma avaliação:
(61) 3322-1167 - (61) 3963-3767
O público-alvo são crianças e adolescentes entre 3 e 17 anos, que possuam algum tipo de transtorno ou deficiência, como Transtorno do Espectro Autista (TEA), Síndrome de Down, paralisia cerebral, disfunções sensório-motoras, distúrbios de aprendizagem.
Podem se inscrever famílias que ganhem até três salários mínimos.
Benefícios da equoterapia
Melhora da autoestima e da autoconfiança
Favorece a interação social
Aquisição de autonomia
Estimula a linguagem
Adequação do tônus muscular e força
Aumento da concentração e atenção
Melhora da coordenação motora
Fonte: Franciele Lopes Fenker, educadora física
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.
EquilÃbrio e autocofiança
O cavalo é um animal que, devido à sequenciação dos passos, permite que o indivíduo montado fortaleça a musculatura e reestruture a sua postura. Isso é importante tanto para questões de déficit motor quanto emocional e intelectual. O cavalo permite uma tomada de segurança por parte da criança por meio do reequilíbrio constante em cima do animal. Sem contar o trabalho respiratório fundamental, pois, quando o cavalo dá um passo, o seu corpo acompanha o movimento do animal e se ritma com ele. E todas essas questões se relacionam, também, com a educação e o aprendizado. Ao fazer esse exercício de respiração, a criança consegue desenvolver a articulação de fonemas, por exemplo. São diversos os benefícios psicomotores da prática e eles não se restringem apenas a pessoas com alguma demanda especial de atendimento, todos deveriam adotar a equoterapia para a vida, porque ela nos oferece um retorno à natureza para vivenciar de outra forma o nosso corpo. E isso é primordial, pois é por meio do corpo que nos comunicamos com o mundo.
Eduardo Ravagni,
pesquisador do programa de educação, psicomotricista, fisioterapeuta, pedagogo e professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB).