Pesquisa

Pesquisadoras formam rede de enfrentamento à pandemia da covid-19

Com foco nas questões de gênero, a ação pretende expor os efeitos da situação sanitária em relação às mulheres e sugerir iniciativas para lidar com esse cenário

Correio Braziliense
postado em 05/05/2021 11:37 / atualizado em 05/05/2021 11:37
A situação das mulheres na pandemia é um dos focos da rede -  (crédito: Acácio Pinheiro/Agência Brasília)
A situação das mulheres na pandemia é um dos focos da rede - (crédito: Acácio Pinheiro/Agência Brasília)

Um grupo pesquisadoras de várias universidades brasileiras lançou uma rede nacional de enfretamento à pandemia da covid-19 e suas consequências. Com mais de 3 mil signatárias, a Rede Brasileira de Mulheres Cientistas tem o objetivo de abordar o debate público sobre os efeitos da atual situação sanitária entre as mulheres, dando visibilidade a pesquisas e iniciativas que podem colaborar para respostas mais adequadas.

A professora Flávia Biroli, do Instituto de Ciência Política (Ipol) da Universidade de Brasília (UnB), é uma das integrantes. Ela explica que a proposta surgiu em uma reunião realizada com cerca de dez cientistas mulheres, de diferentes áreas do conhecimento, em que foram levantadas algumas provocações sobre a situação das mulheres na pandemia.

"No mesmo dia em que iniciamos as conversas para compor um grupo de assinantes para a carta que lançou essa articulação, passamos a ser 500. Hoje somos mais de 3 mil mulheres pesquisadoras, professoras, de diferentes áreas de conhecimento e regiões do país, comprometidas com a ciência", conta.

Ana Farranha, professora da Faculdade de Direito (FD/UnB), também compõe a articulação e destaca que o trabalho será desempenhado em um modelo de coparticipação, a partir de conexões. O grupo conta com um comitê executivo, composto por 30 professoras de diversas instituições de todo o Brasil. Este trabalhará a partir de sete eixos: saúde, educação, violência contra as mulheres, trabalho, emprego, moradia, mobilidade social, assistência social e questão indígena.

"A Rede pretende auxiliar os tomadores de decisão em políticas públicas a melhorarem a vida das mulheres a partir da situação da pandemia. Portanto, a nossa atuação é nesse sentido, de fornecer subsídios e informações para trabalhar com formação de agentes públicos e políticos na tomada de decisão e também na divulgação do trabalho científico das cientistas que coordenam a Rede", afirma a professora.

Soluções

As integrantes da Rede consideram que as respostas em relação aos impactos da pandemia entre mulheres serão mais eficazes e justas se pautadas simultaneamente pelo conhecimento científico e pelo compromisso com a igualdade e a justiça social. "Nosso compromisso é com a saúde da população, com a construção de paradigmas de desenvolvimento mais justos, com a produção de respostas para as múltiplas crises que enfrentamos pautadas pela ciência", defende a professora Flávia Biroli.

No âmbito da Rede, estão sendo desenvolvidas ações para contribuir com gestores públicos, sobretudo nos municípios, no sentido de ampliar a visibilidade de iniciativas de combate à covid-19 já existentes e fortalecer redes pelo país com atenção às desigualdades regionais. Além disso, as cientistas também trabalham para levar a debate público colaborações para ampliar as informações sobre as disparidades de gênero e as respostas adequadas a essa problemática, para garantir direitos.

Análise do cenário

Ainda que no Brasil as maiores vítimas da covid-19 sejam homens negros e empobrecidos, as mulheres são as principais afetadas pelos múltiplos efeitos da pandemia, ou seja, são atingidas de maneira específica pelas diferentes crises (econômica, social, entre outros) geradas pela situação sanitária. "A resposta inadequada à pandemia já ceifou 400 mil vidas. Também produziu uma taxa de desemprego recorde de 14,4%. Entre as mulheres, chegou a 17%. A participação das mulheres na força de trabalho remunerado retrocedeu 30 anos", aponta Flávia Biroli.

Outra problemática enfrentada pelas mulheres é a dificuldade de sair para trabalhar ou para procurar emprego. Isso porque elas têm maior responsabilidade nos cuidados com os filhos, que permaneceram em casa com a suspensão das atividades presencias nas escolas, e das pessoas que adoeceram por covid-19 – seja em casa, nas redes familiares, como cuidadoras, técnicas de enfermagem, enfermeiras ou em outras profissões.

Segundo a pesquisadora do Ipol, a combinação entre isolamento social, ausência de rotinas escolares dos filhos e precarização do trabalho tornou mais agudos padrões preexistentes de disparidade de gênero.

Além disso, as mulheres têm lidado com outras questões severas durante a pandemia, como o aumento dos índices de violência doméstica e o fato de que a insegurança alimentar avança entre os lares mais empobrecidos, principalmente os que são chefiados por mulheres negras.

"Diante das evidências existentes dos efeitos conjuntos das múltiplas crises [geradas pela pandemia] sobre as mulheres, é urgente construir respostas que evitem a reprodução e ampliação de desigualdades e injustiças no futuro próximo", alerta.

Para promover reflexões sobre o assunto, as cientistas da Rede estão trabalhando na produção de materiais a serem encaminhados para a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19, instaurada pelo Senado Federal. "Publicamos três notas técnicas que vão subsidiar a CPI. São notas que apresentam dados para que os tomadores de decisão possam identificar que há fundamento quando falamos que os efeitos da pandemia aprofundam as disparidades de gênero", afirma a professora Ana Farranha.

Segundo ela, muitas das decisões tomadas em relação ao combate à covid-19 desconsideram a dimensão de gênero. "O nosso papel é exatamente mostrar que é necessário fazer políticas focadas nas mulheres considerando esse contexto", conclui.

*Com informações da UnB


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