A conclusão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Feminicídio é que o Estado falhou em amparar as mulheres vítimas de violência doméstica. O relatório final foi apresentado nesta segunda-feira (3/5) pelo deputado distrital Fábio Felix (Psol), na Câmara Legislativa do Distrito Federal. Conforme o Correio adiantou, o grupo encontrou diversos problemas de integração entre os serviços, além de falta de estruturação dos trabalhos especializados e defasagem no quadro de servidores dos órgãos de proteção. Foram analisados 90 processos entre 2019 e 2021.
O relatório pediu à Procuradoria-Geral de Justiça a apuração da ausência de coordenação e articulação das políticas públicas voltadas à promoção e garantia de direitos das mulheres que caracteriza ilegalidade, improbidade ou outra irregularidade. Segundo o documento, a responsabilidade é do governo do Distrito Federal, secretários e outros gestores incumbidos das atribuições.
A CPI também propôs criar o Observatório do Feminicídio do Distrito Federal para congregar os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário na fiscalização das políticas públicas para as mulheres e na produção de um relatório anual de estudo de caso dos feminicídios.
Outro destaque é a recomendação de que seja criada Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) nas regiões administrativas com a presença proporcionalmente maior de população negra. De acordo com a CPI, dos 90 processos, 11,11% são de mulheres brancas, 43,3% de negras ou pardas e em 45,5% sequer existe informação sobre a raça da vítima.
Foco no DF
No documento, a comissão destacou que o papel do Estado é o de promoção de ações para a equidade de gênero e raça, além de fazer chegar até essas mulheres o apoio necessário dos serviços públicos para que seja rompido o ciclo da violência.
Segundo a relatoria, em 2019, o DF ocupou o quinto lugar entre as unidades da Federação mais perigosas para se viver enquanto mulher e bateu recorde, desde a promulgação da Lei Federal nº 13.104/2015, que tipifica o crime de feminicídio.
Durante 11 meses de funcionamento, a comissão realizou oito reuniões ordinárias; dez reuniões extraordinárias; quatro audiências públicas; e dez oitivas com Secretários e especialistas em políticas de enfrentamento à violência contra a mulher. Foram feitas 17 diligências em serviços que fazem parte da rede de proteção e de atendimento. O grupo também realizou sete audiências públicas e oitivas para ouvir movimentos, organizações e frentes da sociedade civil.
Em relação à sua estruturação, a comissão afirmou que enfrentou grandes dificuldades, tendo sido negada a totalidade das requisições de servidores sem ônus para compor a equipe da CPI. O relatório apontou que não houve cooperação da Polícia Civil no envio de remessa de inquéritos policiais solicitados ainda em 2019.
Confira os principais dados apontados pela CPI do Feminicídio
» Total de 90 processos analisados
» 37 mulheres foram mortas por feminicídio e 53 sobreviveram a crimes tentados
» 84,9% das sobreviventes tiveram Medidas Protetivas de Urgência (MPUs) solicitadas somente após a tentativa de feminicídio
» Em relação à proteção pelo sistema de Justiça, 48,6% das vítimas de feminicídio tinham medidas protetivas de urgência deferida
» 100% dos autores de feminicídio em 2021 tinham reincidência no crime de violência doméstica
» No primeiro trimestre de 2021, houve aumento de 40% dos feminicídios tentados em relação a 2020
» Entre 2019 e 2020, 72,2% relatam violências anteriores sofridas pelas vítimas pelo mesmo autor e, em 85,55% dos casos, foram identificados fatores de risco, como ameaças e agressões anteriores motivados por sentimento de posse do autor
» Em 40,4% dos casos havia filhos ou dependentes comuns entre a vítima e o agressor. A maioria tem faixa etária entre 0 e 12 anos, no entanto, em nenhum dos casos houve encaminhamento dos órfãos para algum dos serviços da rede de proteção;
» Dos 90 processos, 11,11% são de mulheres brancas, 43,3% negras ou pardas e 45,5% sem informação
» Arma branca foi utilizada em 68,88% dos casos, arma de fogo (11,11%), queimaduras (5,55%), asfixiamento (4,44%), paulada (2,22%) e espancamento (1,11%). Não houve esclarecimento sobre a arma usada em 6,66%
dos feminicídios
» Em 77 (85,5%) dos casos foram identificados fatores de risco, como ameaças e agressões anteriores motivados por sentimento de posse do autor;
» 65 vítimas (72,2%) relatam, em algum momento nos autos, que sofreram tapas, enforcamentos e outros tipos de agressão pelo agressor previamente ao feminicídio (tentado ou consumado);
» A prevalência de casos de feminicídio íntimo converge com a motivação dos crimes: 72,2% (65 casos) foram motivados por conflitos relativos à manutenção da relação (suspeita de traição, não aceitação do término, não aceitação de novo relacionamento pela ex-companheira/namorada);
» A CPI do Feminicídio constatou que, em 55,5% dos casos, os crimes ocorreram dentro do próprio lar das vítimas. O dado reforça que os agressores são, na maioria das vezes, próximos das mulheres que mataram. Outros 17,7% dos feminicídios foram registrados em via pública ou local ermo;
» Em apenas sete casos algum serviço foi acionado previamente para atendimento do agressor;
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