O apelido de “Ilha da fantasia” talvez não combine tanto com a capital do país. Em seus 61 anos de vida, uma das marcas que Brasília carrega é a da desigualdade social, entre as maiores do país. Apesar do triste cenário, por aqui o que não falta é gente disposta a tentar amenizar esse contraste. São inúmeras as ações de arrecadações de alimentos, agasalhos, roupas e o que for preciso para quem estiver necessitando.
Para comemorar o 61º aniversário de Brasília, a Aliança das Mulheres que Amam Brasília (AMA Brasília), que reúne empresárias e profissionais de diferentes áreas de atuação, lançou a campanha Uma caixa de amor. Apoiada pela Secretaria de Turismo do Distrito Federal (Setur-DF), a iniciativa convida a população a homenagear a capital federal com um gesto de solidariedade e carinho, fazendo doações para pessoas em situação de vulnerabilidade social, sobretudo devido à emergência da pandemia da covid-19. “Um presente para as pessoas que tanto precisam de ajuda. É oferecer o que temos em casa, nas nossas despensas, armários e compartilhar. O momento é agora, quando muitos estão precisando do nosso olhar”, afirma Cosete Ramos, presidente da aliança, que, desde 2017, quando foi criada, promove ações sociais pelo Distrito Federal.
A campanha vem chamando a atenção dos brasilienses e arrecada alimentos, roupas, produtos de limpeza, entre outros. Para participar, basta colocar as doações dentro de uma caixa — como as de papelão de supermercados — e ligar para a AMA Brasília (veja em Como ajudar), a fim de ser recolhida. Cosete explica que tudo está sendo entregue neste mês. “Nosso intuito é que as pessoas façam suas doações da forma mais segura, sem sair de casa. É abrir a própria despensa, o próprio armário e doar aquilo que tem. Esse é o nosso presente para Brasília: que todos tenham um aniversário da capital especial”, ressalta a presidente da entidade.
As entregas serão feitas em cidades a serem definidas pela Setur-DF. “Em um período de tantos desafios, o aniversário de 61 anos da nossa Brasília é marcado pela solidariedade. E ações como essa mostram que, quando unimos forças, podemos ir muito mais longe. Reforça que a nossa capital da esperança nasceu acolhendo moradores de todos os cantos do país e do mundo, que vieram em busca de novas oportunidades, e, até hoje, continua com esse mesmo carinho e respeito a todos”, destaca a secretária de Turismo, Vanessa Mendonça.
Acolhimento
O Projeto Para o Reino realiza, há 11 anos, um trabalho de assistência a pessoas em situação de rua. “Confeccionamos e distribuímos, diariamente, em média, 200 refeições em Taguatinga e Ceilândia. Além das comidas, temos o banho sobre rodas que levamos a alguns pontos específicos, onde pessoas não têm acesso ao banho. Por meio desse trabalho, ajudamos na conscientização e na intermediação para aqueles que tentam ou querem sair das ruas, principalmente, os que precisam de um tratamento contra álcool e drogas. Há pessoas que só comem quando levamos, só banham quando vamos, então, não podemos parar”, explica o pastor Jônatas Duarte, criador da ação.
Segundo ele, durante a crise sanitária, o projeto se mostrou mais necessário e, ao mesmo tempo, as dificuldades também aumentaram. “Na pandemia, trabalhamos com número reduzido. Eu faço a comida com minha esposa e alguns ajudantes e, nas entregas, no máximo, cinco pessoas. O trabalho foi intensificado devido ao aumento de pessoas nessa situação vulnerável, muitas perderam seus empregos e suas casas por não pagar aluguel, e isso vem se agarvando a cada dia”, alerta Jônatas Duarte.
Tanto trabalho resulta em frutos positivos. É o caso do Rodrigo Tolentino, 36 anos. Por mais de cinco anos, ele morou nas ruas de Brasília, até conhecer o Projeto Para o Reino. “Uns 10 anos atrás, eu me encontrava como morador de rua, dependente químico e, por alguns anos, eu vinha me desfazendo nas ruas. Na Rodoviária de Taguatinga, o pastor Jônatas chegou com a equipe do Para o Reino. Ele me levou para uma comunidade terapêutica e, depois, ele me levou para a casa dele. Morei quase um ano lá”, lembra. Hoje, Rodrigo é missionário e palestrante. Para ele, tudo o que precisava era de alguém que estendesse a mão e o ajudasse naquele momento. “A importância veio com o resultado de hoje. Deus sempre surpreende aquele que se coloca à disposição. A importância de existirem pessoas como o pastor Jônatas que confiam na mudança do ser humano”, celebra.
Sem fome
Exatamente para tentar ajudar durante este período de pandemia surgiu a Organização Negra de Alcance Nacional (Ondan). “A ideia veio a partir da necessidade de criar ações emergenciais voltadas para a população negra e periférica durante e após a pandemia da covid-19”, explica a estudante de direito Jusianne Castilho, uma das fundadoras. “Neste momento, estamos com a campanha Ondan solidária, arrecadando alimentos, cestas básicas, produtos de higiene e limpeza e qualquer quantia em dinheiro para a compra desses itens, que são entregues para famílias no DF e do Entorno. Iniciamos uma rifa solidária, em que, junto às doações, será possível continuar as entregas de cestas”, descreve Jusianne.
O grupo Mulheres do Brasil está com duas campanhas de arrecadação em andamento. Uma para distribuir cestas básicas e outra de agasalhos. As doações serão destinadas a pessoas carentes na Estrutural. “Atendemos, ali, 30 famílias com outros programas, mas a ideia é a gente dar um suporte ao longo deste ano para que eles tenham um pouquinho mais de tranquilidade e fazer o curso que estamos oferecendo para terem uma segunda renda, porque a maioria é de catadores de lixo”, explica Ana Mazzei.
Experiência
A Legião da Boa Vontade (LBV) percebeu que muitos projetos sociais, como os citados nesta reportagem, precisavam de orientação. Há quatro anos, surgiu a Rede Sociedade Solidária da LBV, a fim de oferecer apoio às iniciativas. “Essa experiência que temos de anos, queremos compartilhar com outras organizações. Muitas vezes, eles não têm estrutura, documentação ou organização”, enumera o gestor social da LBV, Paulo Araújo.
A iniciativa recebe doações e destina às organizações, que repassam à população em vulnerabilidade. “Nesta pandemia, muitas instituições tiveram que parar os trabalhos e as famílias que recebiam a ajuda ficaram desamparadas. Já era uma situação difícil. A gente costuma dizer que uma segunda pandemia acontece na área social. Muitas pessoas perderam empregos. Pessoas que trabalham como autônomas ficam desamparadas quando tudo fecha. A realidade é que tem muitas famílias passando fome”, lamenta Paulo. Na última semana, o projeto levou 15 toneladas de produtos aos projetos assistenciais, entre alimentos, itens de higiene e agasalhos. As doações são feitas pela comunidade da LBV e por empresários.
Como ajudar
AMA Brasília
999813-4667/99963-7175/99905-9191
Projeto para o Reino
www.instagram.com/projetoparaoreino
Rede Sociedade Solidária da LBV
www.lbv.org
Ondan
www.instagram.com/ ondan_br
Mulheres do Brasil
www.facebook.com/grupomulheresdobrasildf/