Crônica da Cidade

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Viagem de 1ª classe

Deparei-me, dia desses, com uma pérola. As Palavras. Uma ideia genial, com execução sensível. Sabe quando a gente lê um livro e sai marcando todos os trechos que achou interessantes e memoráveis? Pois a obra, lançada em 2013 pela Rocco, com curadoria de Roberto Corrêa dos Santos, mergulha nos principais textos de Clarice Lispector e seleciona frases e parágrafos que resumem um pouco da essência da escritora.
Além de uma ideia genial, não poderia ter sido aplicada em obra literária mais apropriada. “As palavras nada têm a ver com sensações. Palavras são pedras duras e as sensações delicadíssimas, fugazes, extremas”, resume a capa do livro. A partir daí, começa uma viagem de primeira classe pela literatura de Clarice. A impressão é de estar caminhando pelos labirintos de um museu, com cada trecho e cada frase emoldurada. Ilustrada com a perfeição de quem descreve uma alma humana, cheia de defeitos. Convido você, leitor, a embarcar por alguns instantes. Vamos?
Um sopro de vida
“Escrevo como se fosse para salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida.”
“Escrevo muito simples e muito nu. Por isso fere.”
“Minha vida me quer escritor e então escrevo. Não é por escolha: é íntima ordem de comando.”
“Estou na vida fotografando o sonho.”

Água viva
“Alegria é matéria de tempo e é por excelência o instante.”
“Liberdade? É o meu último refúgio, forcei-me à liberdade e aguento-a não como um dom mas com heroísmo: sou heroicamente livre.”
“Estas minhas frases balbuciadas são feitas na hora mesma em que estão sendo escritas.”

Perto do coração selvagem

“Desejava ainda mais: renascer sempre, contar tudo o que aprendera, o que vira, e inaugurar-se num terreno novo onde todo pequeno ato tivesse um significado, onde o ar fosse respirado como da primeira vez.”
“Eu toda nado, flutuo, atravesso o que existe com os nervos, nada sou senão um desejo, a raiva, a vaguidão, impalpável como a energia.”

A descoberta do mundo
“Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo nas minhas mãos. E este desejo todos os que escrevem têm. Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança de língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida.”
“Nada mais tenho a ver com a validez das coisas. Estou liberta ou perdida. Vou-lhes contar um segredo: a vida é mortal.”