INVESTIGAÇÃO

Relatório da perícia no local onde médica morreu pode ser decisivo para o caso

Especialista em perícia criminal afirma que documento compõe um dos principais elementos do inquérito policial, junto ao laudo cadavérico. No entanto, a peça ainda não consta no arquivo

A investigação sobre a morte da médica Sabrina Nominato Fernandes, 37 anos, em 10 de outubro, ramificou-se em etapas que ainda não terminaram. Como detalhado no sábado (3/4) pelo Correio, o caso segue sem um desfecho e com diversas arestas. O inquérito, ao qual a reportagem teve acesso, tem 121 páginas. Nas últimas folhas anexadas, em 23 de fevereiro, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) deu mais três meses para que a 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá) dê andamento às apurações.

Entre os documentos anexados, não constam ainda laudos da perícia do local onde Sabrina foi encontrada morta — a casa em que morava, no Lago Sul — nem das degravações de conversas encontradas nos celulares da médica e do marido dela, André Villela, 40. A polícia fez os pedidos desses relatórios, mas eles não estão no inquérito por enquanto.

Outros pontos chamam a atenção no documento policial. Um deles é um "recorte de tecido", cuja origem não é informada, que apresenta "uma mancha pardo-avermelhada". A amostra passou por dois exames para identificação da presença de sangue, e um teve resultado positivo.

Já no relatório da necropsia, há menção a lesões nos lábios de Sabrina, fraturas em duas costelas e a substâncias encontradas no organismo da médica: uma pequena quantidade de álcool e uma quantia indefinida de remédio para dormir. A família e os amigos da vítima descartam a possibilidade de suicídio.

Reprodução/Redes Sociais - Sabrina Nominato Fernandes, médica encontrada morta em casa no dia 10 de outubro de 2020.
Reprodução/Redes Sociais - Sabrina Nominato Fernandes, médica encontrada morta no dia 10 de outubro de 2020 em casa no Lago Sul
Reprodução/Redes Sociais - Sabrina Nominato Fernandes, médica encontrada morta em casa no dia 10 de outubro de 2020.
Reprodução/Redes Sociais - Sabrina Nominato Fernandes, médica encontrada morta em casa no dia 10 de outubro de 2020.

Possibilidades

Perito criminal aposentado pela Polícia Civil do Distrito Federal, Cássio Thyone confirma que o laudo não é conclusivo em relação ao que levou à morte da médica. Ele destaca, porém, que o exame da cena onde ocorreu a morte — ainda não apresentado — é um dos dois principais documentos de uma investigação.

"Quando recolhem as informações da perícia do local e cadavérica, há um conjunto de provas que permitem ir além nas investigações. (Na necropsia,) o médico examina um corpo que não está contextualizado em relação a uma cena. Já o perito de local de crime, se tiver os elementos, conseguirá estabelecer um diagnóstico diferencial de fato, para distinguir a possibilidade de morte: homicídio, suicídio, acidente ou natural", explica.

Um aspecto que pode comprometer as investigações, segundo o especialista, é o fato de o corpo de Sabrina não ter sido aberto na necropsia. Esse fato decorre de uma recomendação da direção do Instituto de Medicina Legal (IML), devido à pandemia. Nesse caso, os corpos são submetidos a um exame de imagem — uma tomografia —, o que pode limitar o trabalho dos legistas.

Cássio acrescenta que o nível de detalhamento quando há abertura das três cavidades — craniana, torácica e abdominal — é muito inferior ao proporcionado pelo exame de imagem virtual. "Quando você adota essa técnica como única opção, você perde elementos. Neste caso da Sabrina, um dos elementos mais importantes não se perdeu: os exames toxicológicos. Mas, por exemplo, apareceram fraturas em costelas. Se o médico-legista abrisse (o corpo), poderia ter verificado melhor a extensão delas e as partes moles (do organismo) apareceriam com mais clareza", destaca.

Conjunto de provas

Quanto à avaliação toxicológica, Cassio diz ser possível definir o volume de álcool encontrado pelo fato de envolver uma substância muito comum. Contudo, o fato de não haver precisão sobre a quantidade de remédios encontrados no organismo de Sabrina envolve uma limitação da técnica adotada para o exame. 

Nem todas elas podem ser identificadas com exatidão pela metodologia, segundo o especialista, como no caso do remédio contra insônia indicado. "Só de o exame ter detectado, é um grande feito, mas essa identificação foi facilitada porque, provavelmente, existia suspeita de que ela tivesse tomado a medicação", afirma o perito.

Mesmo assim, Cássio reforça a existência de "impasses": "Há pontos que realmente fazem acender uma luz amarela, como lesões nos lábios, escoriações. Elas são muito importantes do ponto de vista do que aconteceu antes da morte. Mas é preciso muita cautela. É importante para quem lida com isso entender que outras provas técnicas vão contextualizar o caso. Há momentos em que elas levam para um caminho da dúvida, da indeterminação. Mas elas não são o único meio probatório. Temos de entender outros pontos do processo", completa.