Logo após a inauguração de Brasília, a capital da República ganhou um charmoso espaço às margens do Lago Paranoá. Naqueles primeiros anos, o hoje Museu de Arte de Brasília (MAB) serviu de anexo para o Brasília Palace Hotel, para o clube das Forças Armadas e até para um casarão do samba. Só em 1985, pelas mãos de uma artista plástica e gravurista, a estrutura se consolidou como local das artes.
Lêda Watson foi incumbida pelo então governador do DF, José Ornelas, de abrir o museu em sete meses. Depois de inaugurado, enquanto esteve de portas abertas, o espaço era reduto da arte brasileira na capital do país e sediou eventos importantes do circuito nacional, como o Salão de Artes Plásticas. “A existência do museu foi muito festejada. Na inauguração, o salão estava tomado de dezenas de pessoas, todos felizes com o acervo que não conheciam e aquela vista maravilhosa”, lembra a artista.
No entanto, uma parte da história do MAB ficou esquecida. Por recomendação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), o espaço ficou fechado por 10 anos e, desde 2017, passava por reforma. Lêda diz que “foi uma tristeza muito grande quase se destruir para construir uma coisa e ela fechar”. A artista frisa que uma geração inteira de moradores do DF jamais colocou os pés no museu. “É lastimável que os jovens desta cidade não tenham tido contato com esse acervo”.
Mas essa história está prestes a mudar. Ao assumir a gestão da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF no ano passado, o secretário Bartolomeu Rodrigues vislumbrou a reabertura do MAB no aniversário de 60 anos da cidade. Os planos ganharam um ano a mais e, neste 21 de abril de 2021, Brasília receberá de volta o Museu de Arte de Brasília.
“Devolver o museu para a população e os artistas do Distrito Federal é um marco que representa a vitória da cultura em sentido amplo. Ora, nesses 15 anos, foi a sociedade civil que pressionou as gestões que se sucederam para reativar a instituição. O papel do governo, neste momento, é garantir o reencontro da arte de Brasília com os brasilienses, em um patamar de excelência. O MAB está à altura desse desafio”, afirma Marcelo Gonczarowska Jorge, gerente do Museu de Arte de Brasília e da Concha Acústica.
Lêda comemora a notícia. “Obra de arte não foi feita para ficar enfurnada, mas para ser mostrada”, pontua. “Estou emocionada, feliz e muito satisfeita. Desejo que essa reinauguração seja uma sucessão de exposições maravilhosas, eventos culturais para valer, que não sejam mais interrompidos”, celebra a artista.
Planos futuros
Apesar de finalizado, o espaço ainda não pode receber visitas enquanto perdurarem as medidas restritivas de contenção ao avanço da covid-19 no DF, assim como outros equipamentos culturais geridos pelo governo local. “No entanto, as obras de arte que comporão o parque de esculturas no entorno do museu já começaram a ser instaladas no local, assim como teremos uma pequena exposição de painéis nos pilotis com uma apresentação do MAB e de seu acervo. Enquanto isso, estamos lançando o perfil de Instagram oficial da instituição, @museudeartedebrasília, com conteúdos originais postados diariamente, contando um pouco da história do local, de suas coleções e dos artistas brasilienses”, enumera Jorge.
A Secretaria de Cultura planeja fazer um vídeo, chamado Rolê cultural, pelo MAB logo que a primeira exposição estiver pronta. A mostra será montada a partir do vasto acervo do museu. Formado por obras de arte moderna e contemporânea, que vão da década de 1950 ao ano de 2001, o conjunto é composto por 1.370 peças. Hoje, a equipe curatorial do espaço é formada por Jorge e pelo professor do Instituto Federal de Brasília Fred Hudson. “Mas a ideia é trabalhar com muitos curadores convidados no decorrer do trabalho do museu”, adianta Jorge.
Repaginado
Após a reforma, orçada em R$ 9 milhões, o espaço foi completamente adaptado à concepção museológica, com vãos mais espaçosos de exposição e salas para conservação e recuperação de obras. A obra permitiu que o museu atenda às necessidades de segurança e acessibilidade, com dois elevadores para cadeirantes.
Entre as novidades do novo espaço estão uma sala de reserva técnica, com quase 600 metros quadrados, e um laboratório de restauro e conservação; uma sala de triagem para receber e avaliar as obras; sistemas de climatização; e energia solar.
Com a reforma e o retorno do acervo ao MAB, Lêda considera que é hora de recuperar o tempo perdido. “A cultura é essencial à vida de um povo, não pode ser só racional, tem que ter a emoção da obra de arte”, completa.
Concha acústica
Ao lado do MAB está a Concha Acústica, que assim como o museu, foi projetada por Oscar Niemeyer e inaugurada em 1969 como uma grande casa de espetáculos a céu aberto. O silêncio no local, que passou por manutenção e revitalização para recuperar danos na estrutura, será rompido com a reinauguração neste mês.
“A gestão atual da Secretaria de Cultura uniu o MAB e a Concha Acústica em uma gerência só. Isso significa integração e cooperação entre os dois espaços culturais vizinhos, com programação de espetáculos prevista para o fim do distanciamento social”, destaca Marcelo Gonczarowska.
Duas perguntas para
Marcelo Gonczarowska Jorge, gerente do Museu de Arte de Brasília e da Concha Acústica
O que podemos dizer sobre o acervo do MAB? O que ele guarda e onde ele está hoje?
O MAB conserva a mais importante coleção de arte moderna e contemporânea brasileira da capital da República, com cerca de 1.300 obras. Com raríssimas exceções, todos os grandes nomes estão contemplados. Para citar alguns, basta apontar Tarsila do Amaral, Lygia Pape e Tomie Ohtake, entre dezenas de outros. O museu se destaca, sobretudo, por possuir o maior e mais destacado acervo do país no que se refere a obras de arte de artistas de Brasília. Para citar apenas alguns, há obras raras de Athos Bulcão, Rubem Valentim e Ana Miguel. Para a reinauguração, recebemos doações de obras inéditas de artistas como Suzete Venturelli, Taigo Meireles, Omar Franco, Darlan Rosa e Sanagê Cardoso. O acervo do MAB está guardado nas reservas técnicas do Museu Nacional da República, onde foi exibido por diversas vezes nos últimos 13 anos, assim como no Museu Vivo da Memória Candanga, que expõe, de modo permanente, obras de arte popular da coleção do Museu de Arte de Brasília.
Quais são os planos para o MAB após a reabertura oficial?
Temos trabalhado pensando na programação do MAB desde 2019. Há um planejamento curatorial de exposições para ele até os primeiros meses de 2023. Nesta gestão, entendemos que um museu possui um duplo caráter: formação e lazer. Por isso, vamos focar a curadoria em exposições próprias, que resgatarão a memória da arte e dos artistas da cidade, assim como apresentarão as pesquisas mais inovadores dos artistas distritais contemporâneos. Isso tornará o MAB uma vitrine do gênio artístico brasiliense, assim como permitirá que a população veja obras que pertencem à coleção, mas que nunca foram expostas. No mesmo ensejo, o papel educativo será reforçado, já que a equipe da instituição conta com um servidor especializado no assunto. Temos que lembrar, também, que um museu é uma instituição de pesquisa, e iniciamos, em parceria com artistas e pesquisadores, estudos sobre a coleção. O grande diferencial do MAB que reabre as portas para aquele que fechou em 2007 é a expansão do campo de atuação do museu para abranger o design moderno e contemporâneo de Brasília. O museu, que será reinaugurado em 21 de abril, contará com uma grande coleção de móveis de design — incluindo mobiliário urbano. Não é por acaso que Brasília foi reconhecida como Cidade Criativa em Design pela Unesco, em 2017.
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