Com mais de 4 mil óbitos diários pela covid-19 e 345 mil mortos pela doença, o Brasil chegou a um patamar dramático da pandemia, que atinge todos os cantos do país. Profissionais de saúde exaustos, unidades de terapia intensiva (UTIs) lotadas e uma realidade difícil para todos que atuam na área. Em Brasília, o Hospital das Forças Armadas (HFA) possui 40 leitos de UTI direcionados a pacientes com covid-19, que estão divididos em dois andares do prédio da unidade, no Cruzeiro. Desses, 37 estavam ocupados nesta quinta-feira (8/4), o que representa 92,5% das vagas.
O hospital atende somente militares, seus dependentes e servidores do Ministério da Defesa. A unidade possuía, no ano passado, 13 leitos de UTI e aumentou a capacidade para 40 devido à pandemia, sendo que desses, 30 são administrados por uma empresa terceirizada contratada em junho de 2020. O Correio visitou ontem a unidade, e pôde acompanhar, com exclusividade, o trabalho no pronto-atendimento e em uma das UTIs, em que há 20 leitos, todos ocupados.
Na UTI, o som das máquinas toma conta do ambiente. Alguns pacientes estão intubados. Enquanto a reportagem lá estava, dois técnicos de enfermagem faziam uma videochamada para uma paciente que conversava com a família. A estrutura conta com divisórias e televisão para os acamados.
No pronto-atendimento, com pacientes com covid-19 ou suspeita, era possível ver algumas pessoas sentadas em poltronas aguardando serem chamadas. Após passar pelo atendimento, os casos mais graves podem ser encaminhados para duas salas: a sala amarela ou a vermelha. Nessa segunda, duas pacientes ocupavam dois dos cinco leitos, aguardando o encaminhamento para enfermaria ou UTI. No local, apesar de ser bem equipado, o paciente não pode ficar mais de 4 horas.
Enfermeiro no HFA, Luis Cláudio de Morais, 39 anos, trabalhava em UTI móvel (ambulância) e passou a atuar em uma UTI na unidade de saúde durante a pandemia. Ele conta que o fluxo nas últimas semanas, período em que a situação do país piorou de forma acentuada, tem sido muito grande. “Tem muita gente brincando com a situação, não estão levando a sério. Não sabem o que é uma UTI e acham que é mentira, mas não é”, protesta.
Para ele, o período mais doloroso ao lidar com pacientes é o momento em que, em caso de óbito, um familiar precisa reconhecer o corpo. Ele lembra que o episódio mais marcante foi quando o filho chegou para identificar o corpo do pai, que era militar. O rapaz bateu continência. “É muito difícil acompanhar a pessoa”, revela.
Infectologista e assistente do comando da unidade, Hemerson Luz afirma que, após um ano de pandemia, a rotina continua muito cansativa. Nesta nova onda de aumento de casos e óbitos, ele ressalta que, em volume de atendimentos, o cenário é pior que o primeiro momento de pico no país, entre julho e agosto do ano passado. Entretanto, quando se fala em complicações e óbitos, a situação de 2020 foi pior, segundo o militar.
Em relação à ocupação de leitos de UTI, para o médico, o cenário é crítico. “Estamos trabalhando no limite”, diz. Hemerson frisa que a unidade tem atendido famílias inteiras infectadas. Desde o início do ano, autoridades sanitárias alertam para as variantes que circulam no país e podem tornar o vírus mais transmissível e agressivo.
Estrutura
Nesta semana, foi divulgado que o HFA negou ceder leitos de UTI covid-19 para pacientes da Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Apesar de contar com recursos públicos repassados pelo governo federal, as unidades das Forças Armadas não fazem atendimento geral de civis, como ocorre nas unidades públicas de Saúde do país e as particulares que possuem convênio com o Sistema Único de Saúde (SUS).
Comandante Logístico do Hospital das Forças Armadas, o general Ricardo Rodrigues Canhaci explica que não pôde ofertar leitos, porque não há vagas. Em fevereiro e março, segundo ele, a unidade teve pico de 100% de ocupação das UTIs. Em janeiro e fevereiro, o hospital recebeu pacientes (militares e dependentes) vindos de Manaus. “Não tenho leito ocioso”, ressalta.
O general afirma que 55% da verba usada para manter o hospital vem do fundo de Saúde dos militares, pago pelos servidores. Quanto à ocupação, Canhaci conta que, no mês passado, teve de transferir pacientes para o Rio de Janeiro por falta de leito e pelo menos 12 pessoas para hospitais da rede privada que possuem convênio com a unidade militar.
De acordo com o Comandante Logístico do HFA, logo no início, a unidade se preparou, abrindo mais leitos de UTI para pacientes com covid-19, transformando uma enfermaria em UTI e aumentando, por exemplo, a capacidade de oxigênio de 8 mil metros cúbicos — suficiente para 20 dias —, para 40 mil metros cúbicos — 50 dias.
Contêiner
O hospital está usando um contêiner frigorífico, que fica do lado externo, para armazenar os corpos das vítimas da covid-19. Segundo o general Canhaci, o necrotério da unidade é dos anos 1970 e estava com problemas sérios de infraestrutura, por isso está passando por uma reforma desde janeiro. O contêiner, entretanto, foi adquirido em setembro do ano passado, segundo ele, para respeitar normas da vigilância sanitária. “Não é nada estranho. É um espaço digno, feito para isso. E não tem nada a ver com quantidade de óbitos”, argumenta.
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