Bem na hora do almoço, o gás acabou. Telefonei para a distribuidora e, quando o funcionário da empresa trocou o bujão, perguntei onde ia parar o preço, só para saber o que pensava. Ele respondeu: “Está difícil. Já falei com a mulher que, daqui a pouco, vamos substituir o gás pela lenha”.
E, de fato, o auxílio emergencial é de R$ 150. Se alguém que recebe o benefício compra um bujão de gás, sobram R$ 50 para bancar a sobrevivência da família durante o mês. Em recente live, o presidente Jair Bolsonaro fez o seguinte comentário sobre a remuneração do diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres: “Tem gente que só tem R$ 15 mil por mês para sobreviver”. Imagine quem só tem R$ 150.
Não dá. Os governadores e prefeitos estão certos em reivindicar R$ 600. Mas eu toco no assunto porque gostaria de discutir a questão colocada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga: “Quem quer lockdown?” Ou, em outros termos: “É possível fazer lockdown no Brasil?”
Os Estados Unidos, a União Europeia e o Reino Unido adotaram ações econômicas de apoio às empresas e aos trabalhadores, para complementar as medidas sanitárias. Por isso, tiveram mais sucesso no enfrentamento da pandemia. Enquanto isso, o que disse o ministro da Economia, Paulo Guedes, na fatídica reunião de 22 de abril do ano passado, no Palácio do Planalto? “Não vamos ajudar as pequenas empresas. Vamos apoiar as grandes, porque ganharemos dinheiro.”
E o pior é que essa política econômica nociva foi levada adiante. As pequenas e médias empresas, as que mais criam empregos no país, não tiveram apoio, e muitas delas quebraram, destruindo milhares de postos de trabalho. Na primeira fase da pandemia, o governo também apresentou a mesma proposta de R$ 150 de auxílio emergencial.
Foi Rodrigo Maia que não aceitou. Exigiu R$ 500, e o governo se viu obrigado a bancar R$ 600, para não ficar mal na fita. O governo do Rio Grande do Sul está oferecendo auxílio emergencial de R$ 400. É pouco, mas compatível com os recursos do estado. Se é para fazer protestos, que os organizadores dirijam as carreatas aos palácios dos que atrasaram a compra das vacinas, concedem R$150 de auxílio emergencial e não amparam as pequenas e médias empresas.
Sem medidas econômicas de apoio da parte do governo federal, fica difícil enfrentar a pandemia. Elas são parte essenciais do tratamento. Por isso, é tão difícil fazer isolamento social no Brasil. Com todos os erros crassos na gestão da pandemia, chegamos a uma situação de colapso, que só poderá ser mitigada pelo isolamento social, segundo os cientistas.
Mas, neste momento mais dramático da crise sanitária, contra todas as recomendações dos cientistas, o governador do DF, Ibaneis Rocha, resolveu reabrir o comércio. Nós já vimos esse filme no Amazonas. A experiência com a pandemia tem nos mostrado que barganhar decisões inadiáveis sai caro para todos.
O ritmo e os compromissos políticos dos governantes não são compatíveis com a velocidade do vírus. Araraquara adotou o isolamento social e conseguiu reduzir os índices de contaminação e de óbitos de maneira drástica. A maioria dos governadores não é negacionista e está resistindo. Mas precisa agir na velocidade do vírus. O preço do lockdown meia-boca pode ser caro.