Nunca fui otimista. No papo do copo meio cheio ou meio vazio, sempre preferi a medição exata e entender que o que há é o que há. Não é que eu defenda um mundo sem esperança e sem utopias, pelo contrário. Só acho um perigo cultivar sonhos com base em nada ou com fundamento em mentiras que contamos a nós mesmos em busca de alguma maneira de conforto.
Ocorre que, em tempos de selfies e sorrisos compulsórios, criou-se uma positividade que beira o delírio. Como Pollyanas em níveis extremos, os gurus dos novos dias vendem felicidade engarrafada e crenças infundadas numa alegria tão fútil quanto falsa. Daí, nascem padrões impossíveis de ser mantidos (que, paradoxalmente, causam sofrimento, olha só) e justificativas para desvios morais e éticos (em nome de um bem interior).
Nesta semana, correu a internet uma irresponsável postagem com sete motivos para acreditar que estávamos saindo dessa (a pandemia). Além de usar dados de outros países para embasar as conclusões, o texto, ao fim, respaldava atitudes como desrespeito às medidas de isolamento e questionamento às notícias ruins (chamamos, é claro, de pessimistas).
O texto ainda se valia de um clichê implementado por aqueles que preferiram o egoísmo ao respeito ao próximo e à vida no Brasil: a defesa da saúde mental. É desonesto usar algo tão sério e grave para justificar saídas desnecessárias, aglomerações e suas variáveis. É um desrespeito para quem realmente luta, diariamente, com as agruras das doenças mentais e sabe, de fato, do que está falando.
No Brasil de hoje, quem não está desesperado é mal-informado ou mau-caráter. Nem preciso repetir muito os nossos dramas cotidianos e nosso interminável luto. Então, é de se entender que as pessoas busquem refúgios e tentem encontrar alívio. E não há nada de mau nisso. Mas nossos remédios não podem incluir o negacionismo.
Não venceremos a covid-19, o desemprego e a crise fechando os olhos para o que está em andamento. É impossível derrotar o inimigo se o minimizamos. O que vivemos hoje é, por si, uma prova disso. Nossos líderes quiseram derrotar o vírus na base do grito, da mentira e da ignorância. Não dá. Precisamos de coragem, de dignidade e, por que não?, de esperança (mas uma esperança verdadeira), para enfrentar de olhos bem abertos a tragédia. Façamos a nossa parte.