O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), pretende reabrir alguns setores da capital do país a partir de segunda-feira (22/3), 18 dias após a publicação do decreto que estabeleceu o fechamento de comércios e serviços, na tentativa de diminuir o avanço da covid-19. O toque de recolher deve continuar, segundo interlocutores do Executivo local, mas deve haver redução dos horários de funcionamento do comércio. A decisão de flexibilizar está sob avaliação no Palácio do Buriti e vai depender do resultado das taxas de transmissão e ocupação dos leitos nas unidades de terapia intensiva (UTIs) brasilienses. Até sábado (20/3), o governador não deve adotar novas medidas nesse sentido. Contudo especialistas da área de saúde alertam para os riscos de uma possível mudança.
Em visita ao posto de vacinação drive-thru do Estacionamento 13 do Parque da Cidade, ontem, o governador ressaltou que a reabertura só ocorrerá se os índices de contaminação e hospitalização caírem: “(Os comércios abrirão) nem que seja com carga horária menor, para que a gente tenha, pelo menos, um turno de funcionamento, colocando as pessoas para trabalhar e com toda a fiscalização necessária”, declarou Ibaneis Rocha.
Apesar do otimismo do chefe do Executivo local, dados divulgados pela Secretaria de Saúde (SES-DF) mostraram que a taxa de transmissão da covid-19 estava em 0,99, nessa quinta-feira (18/3). O resultado indica que cada grupo de 100 infectados é capaz de contaminar, em média, outras 99 pessoas. No entanto, entre 23 de fevereiro e 10 março, a média desse indicador ficou em 1,12, o que indica avanço da pandemia. Para a infectologista do Hospital Águas Claras Ana Helena Germoglio, a decisão pela reabertura é precipitada. “Realmente é nossa taxa de transmissão que vai nos guiar, e isso é dinâmico, pois ela varia de acordo com o comportamento da população. Mas, no cenário atual, em que temos mais de 200 pessoas na fila para UTIs de pacientes com covid-19, essa ação é temerária”, destaca.
Lívia Vanessa Ribeiro, da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, concorda que o momento não é adequado para a retomada. “Entendemos que a economia tem de girar e que as pessoas dependem de emprego, mas estamos em uma situação de risco. Não tem vaga na UTI nem leitos de enfermaria nas redes pública ou privada. Liberar as atividades agora pode fazer com que as poucas medidas restritivas adotadas percam o efeito, o momento é realmente crítico”, salienta. “A população precisa ganhar o pão de cada dia, mas há outras medidas governamentais que poderiam ser feitas, como auxílio fiscal para empresas e à população. Precisamos, ao menos, que a taxa de transmissão da doença esteja bem abaixo de 1, o que ainda não é a realidade”, reforça a especialista.
Desemprego
Desde 28 de fevereiro, apenas atividades consideradas essenciais estão permitidas no Distrito Federal. De lá para cá, o decreto publicado pelo governador Ibaneis Rocha passou por mudanças, uma delas para permitir o funcionamento de academias e escolas da rede privada. Além disso, o chefe do Executivo local implementou em todo o DF um toque de recolher, das 22h às 5h. Em caso de descumprimento, o infrator deverá pagar multa de R$ 2 mil. As restrições ficam em vigor até 22 de março.
O Sindicato do Comércio Varejista do Distrito Federal (Sindivarejista), em nome de 30 mil lojistas de entrequadras e shoppings brasilienses, divulgou, nessa quinta-feira (18/3), uma nota pedindo que Ibaneis antecipe o fim do lockdown no DF. “O comércio não aguenta mais. O desemprego e a informalidade estão crescendo a níveis alarmantes”, destacou o presidente do sindicato, Edson Castro.
A instituição apresentou dados de uma pesquisa da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) que contabilizou 291 mil desempregados no DF antes do fechamento do comércio. Agora, segundo estimativas do sindicato, o número pode ter subido para 330 mil.
Além do sindicato, a Câmara de Dirigentes Lojistas do Distrito Federal (CDL) criticou as medidas de restrição ao comércio, na quinta-feira (18/3). “Estaremos fadados à falência e ao desemprego”, afirmou Wagner da Silveira, presidente da entidade. O representante enviou um documento a Ibaneis Rocha para pedir uma série de medidas de socorro aos comerciantes da capital do país. “Deixem-nos sobreviver, precisamos que o senhor governador seja sensível ao que estamos passando”, reforçou Wagner, em declaração à coluna Capital S/A, do Correio.
A Defensoria Pública da União (DPU) entrou, na quarta-feira (17/3), com uma ação civil na Justiça Federal no DF do para pedir a decretação de lockdown total na capital do país. O processo está em fase de conclusão e aguarda decisão da juíza Katia Balbino de Carvalho Ferreira, da 3ª Vara Cível Federal. A ação tenta conseguir a interrupção de todas as atividades, como em escolas, comércios, parques, academias e igrejas. Dois defensores públicos pedem que o Executivo local relaxe as medidas apenas quando estiver comprovada ocupação inferior a 70% dos leitos de UTI adultos e pediátricos disponíveis no sistema de saúde.
A história se repete
» Há exatamente um ano, o governador Ibaneis Rocha (MDB) reforçava as medidas que previam a interrupção de atividades em comércios e serviços no Distrito Federal. Em 19 de março de 2020, um decreto ampliou o prazo de fechamento de estabelecimentos como bancos, cinemas, teatros, museus, academias e instituições de ensino. No entanto, passaram a fazer parte da lista dos setores proibidos: bares, restaurantes, parques, o Zoológico de Brasília, igrejas, boates, casas noturnas, festas, eventos esportivos, shows, salões de beleza, barbearias e shoppings centers.