Gestão inspiradora
O Correio publicou na capa da edição de ontem o mapa do Brasil todo vermelho, mostrando como a escalada da pandemia, movida a aglomerações, levou ao colapso das UTIs no DF e em 24 estados do país. O título é Retrato da marcha negacionista. Pressionado por todos os lados, o presidente indagou: “Mas quem fez uma boa gestão da pandemia?”
A resposta a essa pergunta é fácil. Não faltam exemplos espalhados por vários pontos do mundo, embora enfrentar a pandemia seja uma tarefa titânica para qualquer governo. Por isso mesmo não é possível brincar com a covid-19 porque ela é uma inimiga traiçoeira.
Criar imunizantes em tempo tão curto foi uma façanha da ciência. Mas, no Brasil, parece que, em vez de comprar vacinas, a preocupação foi com a liberação de impostos para a importação de armas de fogo. Como se fosse possível enfrentar o vírus com pistolas, revólveres ou fuzis.
Suas excelências dormiram e não negociaram as vacinas necessárias para imunizar os brasileiros. No entanto, agora terão de correr atrás para recuperar o tempo perdido. Não adianta fingirem que não dão bola para a pressão. Ela vai aumentar. Quase tudo depende de ter ou não ter a vacina: saúde, economia, política e futebol.
Nos inspiremos no exemplo da primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinta Arden, de 40 anos. Ela faz, de fato, uma nova política. A gente conhece o valor real das pessoas nos momentos das crises. Emergiu da pandemia como uma das líderes mundiais mais competentes e lúcidas. Na juventude, foi DJ e adepta da religião mórmon.
Destacou-se pela bondade e por ser delicadamente firme muito antes da pandemia. Ela não ataca os adversários, mas toma decisões com pulso forte. Em 15 de março de 2019, mesquitas da cidade de Christchurch foram alvo de um ataque terrorista que matou 51 pessoas.
Arden pediu à imprensa que não divulgasse o nome ou a foto do atirador. E, seis dias depois, determinou a proibição da venda de fuzis e de outras armas automáticas. Em sinal de respeito, visitou as famílias das vítimas, usando na cabeça o hijab, o véu preto das mulheres muçulmanas.
Em plena pandemia, no mês de abril, o ministro da Saúde da Nova Zelândia, David Clark, resolveu furar a quarentena e tirou férias com a família em uma praia. Arden repreendeu o ministro, publicamente, mas decidiu não demiti-lo apenas para não prejudicar a gestão da pandemia: “Fui um idiota”, admitiu a autoridade.
Mais tarde, ele foi dispensado por outras razões. Somente 25 pessoas morreram de covid-19 na Nova Zelândia. Arden se antecipou e estabeleceu a quarentena. Com o carisma e a clareza, convenceu a população de que era preciso defender a vida em primeiro lugar.
Como disse o ex-presidente Fernando Henrique, ser líder não é mandar em todo mundo; ser líder é fazer com que todos caminhem juntos com você. E a previdência continua a nortear as ações de Arden.
Em vez de fazer como o Brasil, que apostou somente em uma vacina, a Astrazeneca, a Nova Zelândia assinou acordos com a Astrezeneca, com a Novavax, com a Pfizer/Biotech e com a Janssen. Uma vez que a população da Nova Zelândia é de 5 milhões de pessoas, o país terá o triplo das vacinas necessárias.
Por isso, Arden anunciou que oferecerá de graça as vacinas excedentes para países vizinhos: Tokelau, Ilhas Cook, Niue, Samoa, Tonga e Tuvalu. Que humanidade e que cuidado tem essa mulher. Os brasileiros deveriam mirar-se no exemplo de Arden na hora de votar. Precisamos de governantes que coloquem a vida acima de tudo e a Constituição acima de todos.