A culpa do lockdown
Com o acirramento da crise sanitária, assistimos a diversas manifestações de empresários contra o lockdown imposto pelos governadores. É compreensível o desespero dos que veem a derrocada das empresas que garantem a sobrevivência própria e de muitas outras pessoas.
Perto de onde moro, no dia seguinte ao anúncio do lockdown, um restaurante que oferecia um ótimo self-service promoveu uma reforma drástica, colocou tapumes e, tudo indica, mesmo depois do fim do isolamento, se prepara para só trabalhar com delivery.
Mas, parece-me que os protestos estão batendo à porta errada. O combate ao coronavírus é titânico, independentemente de quaisquer circunstâncias. No entanto, algumas autoridades contribuíram, decisivamente, para o aumento da contaminação e das mortes com a omissão, com atitudes negacionistas e com campanhas contra a vacina.
Não se trata apenas de erros na gestão, que podem acontecer em uma situação tão delicada e nova, mas, sim, de tragédias largamente anunciadas. São ações irresponsáveis em série. No meio de uma pandemia foram demitidos dois ministros e empossado um terceiro, que nada entende de saúde. Estamos na hora H e no Dia D, e onde estão as vacinas?
Em setembro do ano passado, a Pfizer ofereceu 70 milhões de vacinas para o governo brasileiro, com entrega em dezembro de 2020. Mas suas excelências recusaram, sob a alegação de cláusulas contratuais inadequadas, que já tinham sido aceitas por dezenas de outros países. Se tivessem comprado, a pandemia estaria controlada, como está em outros países.
Vários parlamentares fizeram campanhas contra o isolamento social e contra a vacina. Depois, quando a situação sanitária se agravou, apagaram os posts. Além de tudo, são covardes. Eles alardearam a falsa segurança de remédios sem comprovação científica. Estimularam as festas clandestinas, as aglomerações no comércio e o desrespeito ao uso de máscaras. Provocaram as mortes dos CPFs e dos CNPJs.
O Brasil já ultrapassou os Estados Unidos e figura no topo do ranking em número de óbitos por dia no mundo. Em uma situação de calamidade pública, é um absurdo permitir o funcionamento de igrejas. Os dirigentes religiosos deveriam ser os primeiros a orientar os fiéis a não fazer cultos presenciais.
Então, se querem protestar, é preciso dirigir-se aos verdadeiros responsáveis pelo lockdown. Eles estão instalados nos palácios, em um ministério e em vários gabinetes de parlamentares. Foram eles que transformaram uma tragédia sanitária em uma tragédia humana e econômica.
E, agora, é preciso cobrar que se mexam para comprar vacinas com urgência urgentíssima porque as variantes do vírus estão soltas e não respeitam a ignorância, a burrice, a incompetência, as emendas negociadas com o Centrão ou as eleições para 2020. Eles que se virem para adquirir os imunizantes que salvarão a todos. A vida acima de tudo, a vacinação para todos.