OBITUÁRIO

Cláudio Falcão, encantado

Ícone do teatro e do humor brasiliense, o ator morreu nesta segunda feira aos 49 anos. Artistas e amigos destacam a grandeza dele nos palcos e marcou a cena cultural brasiliense com irreverência e muita alegria

Morreu ontem, aos 49 anos de idade, o ator Cláudio Falcão, ícone do humor e do teatro brasiliense. Com 40 anos de carreira, o ator deu vida a personagens marcantes como Mary Help, Gorete e Berenice, muito conhecidos pelo público da cidade.

A causa da morte ainda não foi divulgada. O artista era cardiopata, lutava contra problemas renais crônicos e pode não ter resistido à hemodiálise e sofriudo um infarto. Ele se preparava também para fazer uma cirurgia no braço, para lidar com uma trombose. O ator teve outros quadros de infarto antes, inclusive no ano passado.

Apesar dos problemas de saúde, a morte do ator pegou os familiares de surpresa. “Eu falei com ele ontem à noite e estava tudo bem, ele estava de boa. Ele não chegou a ir para o hospital. Estava sereno ontem”, relata a funcionária pública Cláudia Gardênia, irmã de Cláudio, um ano mais velha do que ele.

O ator morava no Guará 2 com a mãe, Ruth Guimarães, de 74 anos. Ele não tinha filhos. Nascido em Brasília em 1972, começou no teatro aos 14 anos, em espetáculos como Medos e segredos e O caso Greta, dirigidos por Fernando Villar. Trabalhou com diretores como Hugo Rodas, Irmãos Guimarães e Alexandre Ribondi. No final dos anos 1980, participou da criação do grupo A culpa é da mãe, que daria origem aos Melhores do Mundo.

A atriz Adriana Nunes, d’Os Melhores do Mundo, conheceu Falcão quando entrou para o grupo Caricaturas, criado pela mãe do ator, que se tornou um grande amigo. Das escolas públicas da Asa Norte, passaram a se apresentar em teatros como o Dulcina e em festivais como o Jogo de Cena, que produziu o primeiro espetáculo deles, e o Caderno 2, em que eles ganharam. “Ele esteve com a gente desde o início da nossa trajetória, foi sempre presente. Várias vezes, nos Melhores do Mundo, veio substituir quando alguém não podia fazer. Foi uma pessoa muito presente na nossa história”, conta Adriana Nunes. “Xuqueco (apelido carinhoso de Cláudio) é um precursor do teatro e do humor na capital. Um dos maiores comediantes que tivemos. Ele lotava o teatro da Escola Parque e o Chez Michou, onde a gente fazia Confissões de Aborrecente. Um fenômeno. Carismático, influenciou toda uma geração de artistas. Sensível, artista puro. Doce, amigo. Engraçado. Muito triste”, homenageia a amiga.

Amigo de Cláudio desde a época do A culpa é da Mãe, o diretor James Fensterseifer produziu mais de 50 espetáculos com o ator. Assim como Adriana, ele também se recorda do amigo como alguém com pleno domínio de cena: “Um cara muito talentoso e criativo. Um dos maiores comediantes que vi trabalhar. De 1995 a 2005, produzi seus espetáculos e foram todos um sucesso. Claudio tinha o público na palma da mão e orquestrava as risadas e aplausos“, conta. “Foi muito importante para um movimento cultural da cidade, que acabamos até exportando para o resto do Brasil. Ele foi um dos pioneiros de um tipo de comédia mais ousada, ultrapassando os besteiróis que se fazia nos anos 1970”, diz.

O ator e produtor André Deca conheceu Cláudio no início dos anos 1990, nas oficinas ministradas por Robson Graia. “Claudinho foi um dos grandes e pioneiros humoristas da cidade. Não éramos muito próximos, mas tínhamos um carinho grande um pelo outro. Certa vez, ele me pediu para produzi-lo, mas eu não consegui na época. Um talento e um guerreiro. Vai deixar muita saudade”, afirma.

O professor da Universidade de Brasílian(UnB) João Antônio, um dos fundadores do Departamento de Artes Cênicas, se recorda da candura de Cláudio. “Ele sempre teve uma atuação muito forte e poderosa na comédia. Além de ter sido uma pessoa extremamente doce e talentosa. É uma lástima. Ele nunca deu uma pausa. Sempre esteve presente”, recorda. Esse lado leve e agradável de Cláudio também está nas memórias da colega de palcos Tereza Padilha: “Ele era um ator que, quando chegava no teatro para ensaiar, fazia coisas engraçadíssimas. Ele era hilário tanto no palco quanto fora do palco. Parecia que os personagens estavam introjetados nele”, lembra. “O Cláudio Falcão nunca vai morrer, porque ele está na cidade. Ele faz parte da cidade. Existe uma memória dele. Voa, Claudinho, voa!”

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira