Força, Brasília

Mercados doam alimentos que seriam desperdiçados a quem precisa

Iniciativas para destinação adequada dos alimentos em mercados e feiras visam direcionar a comida que não foi vendida à população em situação de vulnerabilidade, especialmente em tempos de pandemia, com alta de preços e sem auxílio

Jéssica Moura
postado em 27/03/2021 06:00
 (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)
(crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

Com a pandemia de covid-19 em plena expansão, a alta no preço dos alimentos e o fim do auxílio emergencial contribuem para que mais famílias tenham dificuldade de colocar comida na mesa. No Distrito Federal, em 2020, os custos de alimentação e bebidas subiram 10,78%, puxados, sobretudo, pela variação dos valores nas gôndolas de supermercados. É o que apontam os dados levantados pela Companhia de Planejamento (Codeplan). Arroz e óleo tiveram as elevações mais expressivas no período, e itens como a carne, que eram básicos da dieta, são agora mais raros nas refeições.

Diante desse cenário de dificuldades, desperdiçar alimentos é uma atitude impensável. De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), se antes da crise sanitária a demanda por cestas básicas emergenciais era de 8 mil, agora a procura subiu para 32 mil cestas. Por isso, estabelecimentos como supermercados e padarias têm tentado dar um destino mais adequado para a comida que sobra nas prateleiras.

Doações

Um pedido tem circulado nas redes sociais: “Apelo aos donos de padarias, não joguem fora o que acham que não podem vender porque está perto do prazo de validade, deixem do lado de fora escrito ‘grátis’. Tem muita gente (até com crianças) com vergonha de pedir, mas está em grande dificuldade econômica”, diz a postagem publicada em um grupo no Facebook. O texto tem sido compartilhado na internet para sensibilizar proprietários dessas unidades comerciais, em uma rede de solidariedade.

Um dos mercados que já praticam essas doações é o Comper da Asa Sul. “É muito gratificante saber que podemos ajudar quem precisa”, ressalta a encarregada Antônia Lima. Ela explica que o mercado costuma doar, diariamente, as verduras que não foram vendidas e que se perderiam se não fossem consumidas. Os produtos de limpeza que têm alguma avaria, mas que ainda estão próprios para uso, também são entregues a representantes da Associação de Protetores Independentes de Animais (Aspia-DF). “É uma troca: eles nos ajudam com pequenos serviços, e já deixamos separadinhas as doações para eles”, conta.

Mas há ainda quem prefira fazer as doações de forma anônima. Os donos do supermercado Canteiros entregam cestas básicas à população em situação de rua em ou instituições parceiras. Um deles conta que, se antes da pandemia eram distribuídas 30 cestas básicas com os produtos que abastecem o mercado, agora, o número chega a 60.

Programas

Há, ainda, iniciativas coletivas para evitar o desperdício de alimentos. Um dos projetos que engaja os supermercados em prol da população em situação de insegurança alimentar é o Mesa Brasil. A ideia é combater a fome e o desperdício de alimentos de uma só vez. Para isso, o Sesc, que gerencia a iniciativa no DF, recolhe os alimentos que iriam para o lixo nos supermercados e os entrega às instituições parceiras.

“Frutas e verduras são muito sensíveis, as pessoas não compram se tiver um defeitinho, uma manchinha. A natureza faz a coisa do seu jeito, não sai perfeito, não é como fabricar sabão em pó. A gente seleciona todos esses produtos da prateleira que não têm aspecto comercial e encaixota para a coleta”, explica o diretor administrativo do supermercado Veneza, Jefferson Macedo.

Macedo diz que decidiu ingressar no projeto para organizar os repasses: “A gente começou esse trabalho com eles para que os alimentos tivessem uma destinação adequada, que não fosse o descarte”. Segundo o gestor, esse é o caso de 20% de todo o fornecimento de frutas, legumes e verduras da rede. Com isso, 20 toneladas desses produtos, que não teriam vazão nas prateleiras, vão para o Mesa Brasil.

Além dos perecíveis, o mercado também entrega itens como macarrão, arroz e feijão. “A gente sabe que é uma organização da sociedade, a gente faz parte desse sistema social, não podemos nos isentar das dificuldades que a sociedade passa, dentro da nossa possibilidade, é nossa responsabilidade social contribuir”, enfatiza Macedo.

Na Central de Abastecimento (Ceasa), o que não sai na feira, vai para o Banco de Alimentos. De segunda a sábado, os feirantes ofertam o que não foi vendido, mas que está apto para consumo, à população em situação de vulnerabilidade. Ao todo, 36 mil pessoas ligadas a 144 instituições são beneficiadas semanalmente.

“Quando era no tempo normal, já estava difícil para essas pessoas, imagina agora na pandemia. A gente tem que se unir e dar as mãos”, pondera o gerente de vendas da loja Comercial Mendes, na Ceasa, José Aurélio. O local vende frutas, que são muito perecíveis. Por isso, a triagem é diária: “Tem que ser jogo rápido, vapt-vupt”.

A loja chega a repassar quase duas toneladas de bananas, abacates, mamões e mangas por mês. “A gente faz de tudo para não perder: se vê que não vai vender, já manda logo o banco. Para que jogar fora se o outro lado está precisando?”, arremata José Aurélio.

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