A vacinação para idosos acima de 80 anos começou ontem, no Distrito Federal. Há 42 mil pessoas desse grupo morando na capital, segundo dados da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan). Ao programa CB.Poder — uma parceria do Correio Braziliense e da TV Brasília —, o epidemiologista e professor da Universidade de Brasília (UnB), Jonas Brant, alertou para os cuidados que devem ser adotados na ida aos postos de vacinação. “Ao estar nessa fila, com uma grande densidade de pessoas, eu estou me expondo a outras pessoas que estão ali, e algumas delas podem estar no início de transmissão”, disse ao jornalista Alexandre de Paula.
Qual a importância dessa etapa da vacinação e como isso vai impactar na cidade?
Nós conseguimos começar a imunizar o maior grupo de risco da doença, então é um momento importante, de muita alegria. A gente espera que, com isso, consigamos diminuir o número de internações e de casos graves, além de aliviar um pouco a rede hospitalar de alta complexidade no DF.
Qual a preocupação que as filas trazem?
O GDF (Governo do Distrito Federal), historicamente, tem uma dificuldade muito grande em termos de mobilização e comunicação social. Poderíamos ter trabalhado essa campanha de maneira mais esparsa, garantindo que os idosos soubessem quando deveriam ir para a unidade mais próxima de sua residência. Não foi o que aconteceu, e, com isso, tivemos o adensamento de pessoas na porta de unidades de saúde, causando um risco. Para as pessoas que ainda não foram, é importante recomendar que esperem, pois essa fila vai diminuir. Existem doses suficientes para todas as pessoas desse grupo de risco e, depois, ao final da semana, ela deve buscar essa unidade com mais calma.
As pessoas, quando estão em fila, estão se expondo. Muitos pensam que após a vacina não haverá mais perigo. Qual cuidado deverá ser adotado?
Ao estar nessa fila, com uma grande densidade de pessoas, eu estou me expondo a outras pessoas que estão ali, e algumas delas podem estar no início de transmissão. E estou me expondo a outros riscos, também. O próprio fato de sair de casa e se expor ao Sol, para uma pessoa de 80 anos, é um risco grande. Então, é importante evitar filas, tentar se organizar para que, quando as filas diminuam, buscar o atendimento com bastante tranquilidade.
Muitas pessoas têm questionado a vacina, com dúvidas a respeito de quanto tempo demora, como funciona, se tem que esperar a segunda dose. Qual a orientação?
Quando eu tomo uma vacina, estou expondo o meu organismo a um antígeno — que é um pedaço do vírus — para que eu possa conhecê-lo e preparar meu sistema imunológico para combatê-lo. Na maioria das vacinas, somente uma dose não é suficiente. Eu preciso fazer uma dose para que o organismo conheça o vírus e, depois, reaplico outra, para que o sistema imune produza uma grande quantidade de anticorpos. Em geral, teremos que esperar a segunda dose para que a pessoa esteja realmente imunizada. Já vimos, por meio de estudos, que, mesmo que receba as duas doses, não haverá 100% de proteção. Provavelmente, não terão a doença em estado grave, mas ainda podem ser infectados. Então, será importante manter as medidas de proteção.
A vacina é a nossa saída da pandemia, de fato?
A população fala disso agora, mas os especialistas debatem isso o dia todo. Não é simples colocar uma vacina no mercado. Não colocamos uma nova, no calendário, sem uma discussão importante e grande com grupos de especialistas. As vacinas que estão sendo colocadas no calendário brasileiro de imunização provaram ser muito seguras, sem reações adversas. Os estudos nos mostraram evidências de que elas são seguras e que podemos ter acesso a elas e, a partir disso, garantir a prevenção da doença, que é muito mais importante neste momento.
Alguns dos pontos que levaram as pessoas a questionarem a vacinação é o tempo que levamos para desenvolver a vacina. Quais fatores pesaram para o desenvolvimento tão rápido?
Em 2003, tivemos uma epidemia chamada Sars, na China, que causou surtos em vários países e levou à mudança do regulamento sanitário internacional. Os países se reuniram para criar um regulamento como forma de preparação para o caso de haver uma nova pandemia. Desde 2005, quando o regulamento entrou em vigor, os países desenvolveram capacidades básicas e vêm se preparando para isso. Quando houve a H1N1, nós conseguimos desenvolver uma capacidade maior de organização para produção em larga escala. Ainda tivemos o ebola, na África. Esse surto, por muita sorte e um trabalho muito competente dos epidemiologistas daquela região, foi contido e, por pouco, não se espalhou. Na época, o mundo se mobilizou para fabricar vacinas contra o vírus. Então, essa expertise de ampliação de capacidade de produção tem se acumulado no mundo. É importante salientar que o Brasil está fora dessa corrida, uma vez que não tem investido em ciência. Por isso, não conseguiu estar entre os países com vacinas no mercado e tecnologias novas para enfrentar o vírus.