No programa CB.Saúde — parceria do Correio com a TV Brasília —, ontem, o médico e pesquisador do Observatório PrEpidemia, da Universidade de Brasília (UnB), Roberto Bittencourt avaliou que a maior dificuldade do Distrito Federal no processo de imunização contra a covid-19 é o acesso à vacina. “Já está sendo levantada a possibilidade de interromper a vacinação”, alertou, em entrevista à jornalista Jéssica Eufrásio.
Em quase um ano de pandemia, quais foram os erros e acertos?
O indicador mais importante para se fazer uma análise de como foi o enfrentamento é o padrão de número de óbitos por 100 mil habitantes. Ele revela que existem três grandes blocos de continentes com enfrentamentos e resultados distintos. Ásia, Europa e América, cada uma com uma abordagem diferente. Nós consideramos, hoje, que o padrão ouro de enfrentamento da pandemia é o que foi feito nos países asiáticos. A taxa de mortalidade por 100 mil habitantes é impressionantemente baixa. O centro de enfrentamento à pandemia nesses países foi a vigilância epidemiológica. Na Europa, a marca é o lockdown, são países com uma condição socioeconômica que permite à população ficar em casa, mas o resultado não foi bom. Vários países estão com a taxa acima de 150 óbitos por 100 mil (habitantes). Na América, o padrão de enfrentamento da pandemia foi o negacionismo. Países como Estados Unidos e Brasil têm mortalidades altíssimas, acima de 120 por 100 mil habitantes.
A Anvisa retirou a exigência de apresentação de estudos da fase três para autorizar o uso emergencial das vacinas. Que implicações essa decisão traz?
À medida que a Sputnik apresentou a fase 3, publicada fora do Brasil na Lancet, uma das revistas científicas mais sólidas do mundo, nós tínhamos de considerar isso como uma etapa cumprida. Temos de abrir o leque para outras vacinas de outros países. Estamos nessa corrida contra o tempo. A pandemia não acabou, as cepas estão se modificando, e as vacinas têm um prazo de imunização.
Aqui, temos um modelo público de saúde exemplar na concepção. Na avaliação do senhor, quais potenciais desse sistema acabaram prejudicados por causa de problemas de gestão?
Na verdade, não existe um Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, mas um sistema misto, um sistema privado e público, sendo que este último foi muito sucateado. O ponto alto do SUS são as unidades básicas de saúde (UBSs), distribuídas em todos os municípios brasileiros, com um contingente de quase 400 mil profissionais especializados no combate a endemias. Nós tínhamos condições de fazer um enfrentamento (à pandemia), mas faltou liderança.
Desde o ano passado, o senhor fala sobre a importância do monitoramento por meio da vigilância epidemiológica. Como a rede nacional de saúde da qual dispomos poderia contribuir?
O que precisava ser feito era conter os casos positivos. Não custaria muito que os casos positivos ficassem em quarentena, 14 dias isolados. Aqueles que não tivessem condições de ficar isolados teriam que ter um apoio social e, dessa maneira, rastrearíamos os contatos e eliminaríamos a transmissão. A solução é eliminar a transmissão. É uma situação extremamente simples, é muito mais barata do ponto de vista de custo-benefício, de eficiência do sistema, para conter a pandemia. Isso poderia ser feito sem nenhum problema. Nós temos um pessoal treinado e infraestrutura. Imagina fazer isso durante o ano inteiro. Conseguiríamos conter (o avanço), como aconteceu nos países asiáticos.
*Estagiária sob a supervisão de Guilherme Marinho
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