Se alguém dissesse que aos 80 ou 90 anos você precisaria passar por período de quase um ano de isolamento para proteger-se contra um vírus contagioso e perigoso, provavelmente duvidaria ou pensaria ser trama relegada a filmes e a séries de terror. Mas esse pesadelo se tornou realidade para uma das parcelas mais vulneráveis da população a doenças respiratórias. Com muita resiliência e esperança numa solução, eles aguentaram firmes o tempo dentro de casa e, ontem, saíram às ruas. Desta vez, para se protegerem com a arma mais eficiente contra o novo coronavírus até agora: a vacina. O Correio ouviu vários desses idosos momentos antes de receberam a primeira dose dos imunizantes e mostra o que eles sentiram nesse momento histórico, que marca o começo do fim da pandemia.
Ao ritmo de Bum Bum Tan Tan
A pedagoga aposentada Wilma Campos, 84, comemorou a chegada da vacina contra a covid-19 com a dança do hit Bum Bum Tan Tan na fila da Unidade Básica de Saúde 2 da Asa Norte. “É a realização de um sonho. Estou feliz demais, é uma liberdade”, afirma. Ao receber a primeira dose da CoronaVac, ela se emocionou e agradeceu a Deus por proporcionar este momento. A filha, Carine Campos, não segurou as lágrimas por, enfim, saber que poderá abraçar a mãe depois de tanto tempo.
Dia de festa
“Hoje eu vim arrumada para festa, coloquei até um colar”, afirmou a aposentada Maria Batista, 82. “Esse é um dia importante, precisava de uma produção especial”, acrescentou. Assim que receber a segunda dose, disse que passará alguns dias em Uberlândia, para rever a família e voltar para o curso de inglês e de informática. Orgulhosa pelo sistema de saúde público do Distrito Federal, ela afirma que o postinho de saúde da 114/115 Norte representa seu porto seguro. “Sempre confiei demais no serviço de saúde público, venho aqui toda vez que preciso”, contou.
Símbolo de liberdade
“(Essa vacina) representa a minha liberdade. Agora vou poder ter escolha de ir e vir”, celebrou o aposentado Walter Coutinho, 81 anos. Ele chegou à Unidade Básica de Saúde 2 da Asa Norte, na Entrequadra 114/115, por volta das 9h40 e, após três horas de espera, recebeu a primeira dose da CoronaVac. “Trabalhei a minha vida toda em aviação, gosto dessa liberdade de poder sair. É uma agonia enorme ficar em casa”, comenta. A primeira coisa que ele quer fazer após receber a segunda dose, daqui a algumas semanas, é encontrar os amigos. Apesar disso, Walter acredita que só depois de seis meses que voltará à rotina de antes da pandemia.
Para matar a saudade
Quando chegou à Unidade Básica de Saúde do Lago Norte, Heraldo Cunha recebeu a senha de número 200. E seguiu firme até ser chamado para a tão esperada vacinação. “A pandemia foi cruel para todo mundo. Estou aqui esperando uma vitória, que é a vacina. Sinto falta de fazer atividades físicas, de sair, de ir ao cinema, ao restaurante, e de ver os amigos e parentes. Tudo isso. Com essa vacina, espero que a situação melhore ou, pelo menos, que a disseminação do vírus diminua bastante”, resumiu.
Perto do abraço dos netos
“Graças a Deus eu consegui me vacinar. É uma sensação de alívio indescritível. Estou desde o início da pandemia sem abraçar meus netos, sem andar na rua. Sinto falta disso. Estar perto do fim é uma emoção sem tamanho”, celebrou Maria do Nascimento, 80 anos. Ela chegou às 14h para se vacinar na UBS do Cruzeiro Velho. Acompanhada da filha, Nilza da Costa, 56, após cerca de uma hora na fila, Maria foi vacinada. “Com certeza vou tomar a segunda dose, quero me garantir, voltar a abraçar os netos e familiares, andar na rua livremente. Não vejo a hora”, finalizou.
Lembranças ruins para trás
Aos 90 anos, Teresa Trajano conheceu a dor de perder amigos para a covid-19 e não via a hora de se vacinar. “Estou a cinco passos da vacina. Estou feliz demais, dando graças a Deus e achando ótimo. De jeito nenhum eu ia deixar de me vacinar. Desde o início da pandemia, estou em casa, mas isso não foi o mais triste. O mais triste foi os amigos que perdi para a doença. Agora, estou feliz em dar mais um passo para o fim disso tudo”, contou. A filha, Patrícia Trajano, 50, avalia que a equipe da UBS do Lago Norte, aonde foram, conseguiu organizar bem a vacinação, apesar do grande número de pessoas. “Os servidores estão tentando fazer o melhor. Achei rápido, considerando a quantidade de pessoas”, disse.
Alegria no banco do carona
Hélio Barbosa, 80 anos, recebeu a vacina contra a covid-19 por acaso. Ele conta que estava em uma academia no Lago Sul quando ouviu um senhor comentar sobre o esquema drive-thru na Policlínica da região administrativa, no Setor de Habitações Individuais Sul, na QI 21, e não perdeu tempo. “Não quis perder a oportunidade. Aproveitei que tenho a idade correta e perguntei se ele se vacinaria. Ele disse que sim e pedi uma carona”, disse. A fila de carros chegava a 2km. Ontem, no horário limite de vacinação, às 17h, havia 17 doses restantes. Hélio comemorou e aguarda ansioso a segunda dose. “Estou muito feliz e esperançoso. Quero logo que a vacina chegue para todas as idades”, completou.
Picadinha do bem
Aos 96 anos, dona Margarid Clementino, moradora do Lago Sul, não mediu esforços para se vacinar. Acompanhada pela filha, ela foi até a Policlínica da região e, pelo drive-thru, recebeu o imunizante. Ela conta que, desde o começo da pandemia, tem ficado em casa para evitar o contágio pelo novo coronavírus e, agora, sente-se aliviada. De dentro do carro, ela esperava a enfermeira ansiosamente. De longe, a feição de quem recebeu uma picada no braço. No fim, ela descreve o sentimento como uma vitória. “Eu morro de medo de agulha e vou confessar que doeu um pouco, mas, agora, me sinto revigorada”, comemorou.
As coisas mais simples
Na Unidade Básica de Saúde nº 5 de Taguatinga, filas enormes rodearam o centro de saúde, e a recomendação de distanciamento social nem sempre foi cumprida. Nomar Campos Chaves, 80 anos, se protegeu como pôde. Chegou às 11h30 à unidade e foi uma das primeiras a receber o imunizante. Sentada no banco de espera, os olhos dela brilhavam à espera da dose. Desde o começo da pandemia, a aposentada cumpriu o isolamento social e não saiu de casa. “É uma alegria enorme. Agora, estou esperançosa para voltar à vida que eu tinha, ir à feira, conversar com minhas vizinhas na porta de casa e ir ao mercado. Coisas simples que, para mim, fazem toda a diferença”, disse.
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