Coordenador da força-tarefa contra a pandemia da covid-19 no Distrito Federal, o procurador José Eduardo Sabo Paes requisitou à Secretaria de Saúde (SES) informações sobre denúncias de que pessoas estariam furando a fila de vacinação contra o novo coronavírus na capital. A pasta tem menos de 48 horas para enviar uma resposta ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). No ofício, o procurador afirmou que a situação representa violação ética “inaceitável”. A Secretaria de Saúde afirmou que o caso será apurado pelo setor de controle interno da pasta.
“Após intensas tratativas e um esforço muito grande, o DF recebeu pouco mais de 106 mil doses que são destinadas, exclusivamente, num primeiro momento, para aqueles que atendem direto nos hospitais pacientes infectados com o coronavírus. Chegou ao MPDFT uma denúncia de que outras pessoas estariam sendo vacinadas também. Nós requisitamos que a SES nos informe, imediatamente, quais são essas pessoas”, explicou o procurador.
Na avaliação de José Eduardo Sabo Paes, “tal situação, uma vez comprovada, além de representar violação ética inaceitável, importa em grave descumprimento da legislação, com inevitáveis consequências nas esferas administrativa e penal para os autores e beneficiários indevidos da medida”.
Em nota à imprensa, divulgada na noite de ontem, a Secretaria de Saúde informou que chegaram ao conhecimento da pasta denúncias de supostas irregularidades no processo de vacinação em algumas unidades e que “imediatamente, o secretário de Saúde, Osnei Okumoto, solicitou aos superintendes regionais a lista com os beneficiados pela vacina até o presente momento”.
Cada unidade hospitalar tem um gestor responsável pela definição dos profissionais que se enquadram nos critérios estabelecidos pela secretaria. Além disso, a vacina está ligada ao CPF de quem a recebeu e, para a aplicação da segunda dose, o paciente deve retornar ao local de vacinação na data informada no cartão de vacinação. Em relação a possíveis fraudes, a pasta afirma que o gestor responsável pela área e o servidor beneficiado, sem que atenda aos critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde, vão responder administrativamente pelos seus atos.
A respeito da prioridade de vacinação, segundo a secretaria, aqueles que atuam na linha de frente no atendimento à covid-19, como médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e administrativos, vigilantes e funcionários da limpeza — desde que exerçam funções em unidades consideradas de alto risco de contágio — serão vacinados. Quem trabalha em hospitais da rede pública receberá a dose no estabelecimento. Aqueles lotados em Unidades Básicas de Saúde (UBS) serão vacinados em seus locais de trabalho.
Povos tradicionais
A imunização à forma mais grave da covid-19 chegou às aldeias dos povos tradicionais (indígenas) do Distrito Federal, ontem. Em uma comunidade Guajajara, no Noroeste, 17 pessoas receberam a primeira dose da CoronaVac. Cacique da aldeia, Francisco Filho Guajajara, 43 anos, foi o primeiro. Com o cartão de vacina nas mãos, ele comemorou a chegada dos imunizantes. “(A covid-19) está prejudicando a saúde de todo mundo. Estamos aguardando o melhor resultado com a vacinação dos indígenas, não só aqui, no Distrito Federal, mas no Brasil como um todo”, afirma.
De acordo com o cacique, na aldeia vivem 23 famílias, cada uma com cinco a 10 pessoas, e não houve casos da doença. “Graças a Deus, ninguém teve covid-19. A vacina chegou com esperança de termos saúde. Melhor evitar o vírus, porque a doença não escolhe ninguém”, ressaltou. Para Fetxawewe Tapuya Guajajara Veríssimo, 21, o imunizante se tornou fundamental para a manutenção da memória dos povos originários do Brasil. “É uma esperança para nós. Perdemos muitos anciões nas outras comunidades, em outros estados”, lamenta.
No entanto, houve aqueles que ficaram receosos quanto à segurança da vacina. O gerente da Unidade Básica de Saúde 2 da Asa Norte, Tiago Neiva, que esteve presente na aplicação das vacinas. Ele relata que uma das maiores preocupações da campanha é a desinformação. “Explicamos sobre a eficácia da vacina, que ela evita a forma mais grave (da doença). Mas, respeitamos a decisão deles. Vamos retornar, em outros momentos, para vacinar quem não foi imunizado. Nos informaram que muitos estão viajando”, adianta Neiva.
Outras comunidades indígenas também serão contempladas com as doses da vacina contra a covid-19 neste primeiro momento de imunização. A perspectiva da Secretaria de Saúde é de que 300 pessoas de tradicionais sejam vacinados pela campanha. Na comunidade Guajajara, uma equipe da Saúde, acompanhada por escolta policial, levou as doses da vacina chinesa CoronaVac. Esse será o processo de vacinação que seguido em todas as aldeias do DF.
Previsão
Apesar das expectativas para o início da segunda fase, de acordo com a Secretaria de Saúde, ainda não há uma data prevista. A pasta informa que isto depende do envio de mais doses de vacina por parte do Ministério da Saúde e descartou a possibilidade de adquiri-la diretamente. Mesmo sem datas, o GDF espera que, até o fim do ano, toda a população da capital federal esteja vacinada.
No entanto, isto depende da aprovação de novas doses pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em 18 de janeiro, o Instituto Butantan — responsável pela produção da CoronaVac no Brasil — registrou, junto à agência, um pedido de uso emergencial de mais 5 milhões de doses do imunizante. O Butantan espera que, na próxima semana, este material esteja disponível para uso. Caso isso ocorra, o instituto enviará as doses para o Ministério da Saúde, que distribuirá para as unidades da Federação. Até o momento, o ministério não tem uma previsão de quantas doses devem ser enviadas ao DF.
Mesmo com a vacinação, é importante lembrar que a pandemia não acabou. Segundo o infectologista do Hospital das Forças Armadas (HFA) Hemerson Luz, caso a população brasiliense não se cuide, o sistema de saúde local pode entrar em colapso, e mortes podem ocorrer por falta de estrutura. “A guerra ainda não está ganha. Caso as pessoas continuem a sair, o vírus vai continuar circulando e se transformando, o que pode atrapalhar a vacinação. Por isso, neste início da imunização, é essencial que as pessoas tentem evitar ao máximo a disseminação do vírus”, alerta. “Só poderemos voltar ao normal quando a doença for controlada e, atualmente, cada pessoa precisa contribuir para a diminuição do número de casos”, finaliza Hemerson.
» Colaborou Pedro Marra