Sem piscina para treinar, durante boa parte do ano de 2020, devido à pandemia do novo coronavírus, atletas brasilienses de nado artístico — antigo nado sincronizado — conseguiram se classificar nas seletivas nacionais e se preparam para representar o Brasil em competições internacionais. A seleção, promovida pela Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), ocorreu, pela primeira vez na história, de forma on-line, divididas por etapas com apresentações solo, ao vivo pelo aplicativo de videochamada Zoom, e avaliação de coreografias pré-determinadas que foram gravadas pelas competidoras. Ao todo, foram convocadas 20 atletas da categoria juvenil, 22 da categoria júnior e 22 da categoria sênior de várias unidades da Federação.
Pelo Colégio Presbiteriano Mackenzie Brasília, três estudantes e atletas conseguiram colocação para representar o Brasil nas competições internacionais que podem ocorrer neste ano. O calendário de treinos e torneios será definido em momento posterior, após avaliação da comissão técnica sobre os desdobramentos da pandemia da covid-19. Enquanto isso, as colocadas não perderam o pique na rotina de treinos. “Elas me pediram para passar exercícios nas férias, para manter a rotina. Mesmo estando de recesso, recebo os vídeos delas e auxílio nos treinos”, ressalta a técnica Simone Montenegro Formiga, 35 anos, que não esconde o orgulho das atletas. “As meninas foram gigantes, principalmente em um ano tão difícil como foi o de 2020. Mesmo com todas as limitações, sem poder entrar na piscina, elas mantiveram o foco”, ressalta Simone.
Em março, foi decretada a suspensão das aulas e o fechamento dos espaços escolares e clubes devido ao aumento no número de infecções pelo novo coronavírus. A técnica teve de se reinventar para dar continuidade aos treinamentos com a equipe. Sem a piscina, a alternativa foi migrar para o on-line, com exercícios de alongamento, flexibilidade e condicionamento físico. “O lado ruim é que o esporte é dentro d’água, mas conseguimos trabalhar outros pontos que estavam precisando de mais atenção. Tivemos aulas de dança, de interpretação facial e maquiagem para apresentação”, pontua Simone Formiga. “A modalidade a distância nos permitiu ter treinos com a seleção brasileira e com atletas internacionais, oportunidades que, talvez, em outras condições, elas não teriam”, explica a técnica.
Quando houve a flexibilização para o funcionamento de clubes e o anúncio da seletiva nacional, a equipe brasiliense de nado artístico enfrentou mais um desafio: encontrar um local com piscina para que as atletas pudessem treinar e gravar a coreografia pedida no regulamento da seletiva. Após alguns contatos, as meninas conseguiram um horário no Cota Mil Iate Clube (Setor de Clubes Sul), duas vezes na semana, para treino na água, e mantiveram os exercícios solos on-line. “No momento em que foi autorizado o uso das piscinas, o Distrito Federal estava bem atrás de outros estados. A gente teve um período menor, mas conseguimos aproveitá-lo da melhor forma possível”, destaca Simone, que é técnica de nado artístico desde 2007.
Para a advogada Cláudia Farias, 37, o orgulho de ver a filha Ana Clara, 15, entre as selecionadas para a seleção brasileira transborda, mas o caminho foi árduo. “No início da pandemia bateu um desespero nela. Tanta dedicação em anos para depois ficar parada. Mas logo começaram os treinos on-line, que foram um outro desafio. Então, buscamos outros mecanismos para ela manter o ritmo, com personal trainer, aulas de pilates para fazer os movimentos que são feitos em água no solo, mais o acompanhamento nutricional e psicológico”, explica Cláudia, que acompanhou todas as idas para os treinos da filha, que participou do Campeonato Sul-americano de nado artístico em 2019.
Orgulho
Ana Clara se orgulha da modalidade que escolheu logo pequena. “Comecei na natação desde bebê, e quando fui crescendo fui achando chato e queria sair. Mas minha mãe não deixava, falava que era questão de sobrevivência. Então, vi o nado sincronizado na televisão e me apaixonei. Pedi para minha mãe se eu podia fazer a troca. Se eu achasse uma turma em Brasília estava combinado”, conta a atleta, que pesquisou na internet até encontrar uma turma no Distrito Federal. As aulas eram ministradas por Simone, mas a turma para iniciante era em um horário que Ana estava em aula, e a única turma disponível era um pouco mais avançada. Depois de muito choro e insistência, a atleta fez um teste e passou a integrar a equipe de nado artístico da capital. Ela já participou de competições nacionais e internacionais, além de ter feito aulas em outros países, com atletas renomados. O maior desafio, segundo Ana, é que, infelizmente, o nado artístico tem mais destaque no eixo Rio-São Paulo. No DF, o esporte não tem tanta visibilidade e incentivo, conta a atleta. A expectativa para os treinos como parte da equipe da seleção e os torneios mundiais estão a mil. “Vai ser uma experiência única. Mesmo com as atividades paradas, agora em janeiro, a rotina não para”, conta a atleta.
Rotina apertada
Outra mãe orgulhosa é a de Vitória Diegues Brasil, 17. A dentista Paula Diegues Brasil, 48, conta que a filha, mesmo com as atividades suspensas, focou nos treinos e conquistou o lugar na seleção com bastante determinação. “Vitória correu atrás, malhando por conta própria. Mesmo com o vestibular, ela deu conta de conciliar as duas coisas. Em nenhum momento ela parou”, relata Paula. A vontade e a paixão pelo esporte é tão grande que no dia de uma das etapas da seleção ela tinha a prova do vestibular, que era no Gama, pela manhã, e a seletiva à tarde. “Estava no carro quando fui chamada (para a seletiva). Conseguimos mudar para eu ser a última a apresentar”, conta Vitória, que no meio de tanto nervosismo, entre uma prova e outra, se alongava dentro do carro, já com o maiô da apresentação para dar tempo de participar dos dois. E o esforço valeu a pena. Naquele dia, ela ficou em primeiro lugar na etapa da seleção de nado artístico e alcançou média no vestibular para cursar medicina. Para este ano, ela tem um grande desafio entre a faculdade e os treinos na seleção brasileira.
A mais nova entre as selecionadas, Alice Guimarães Tenório, de 14 anos, não esconde o nervosismo de estar entre as atletas que vão representar o país na modalidade. “É uma sensação que não sei explicar, mas estou muito feliz”, relata a atleta, que está ansiosa com a nova etapa dentro do esporte. Para ela, a experiência vivenciada na pandemia foi desafiadora, pois o esporte é dentro d’água, mas também trouxe pontos positivos, como a melhora nas questões técnicas de aberturas e força.
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