Trata-se de ação impetrada em desfavor do autor para que sejam interrompidas, a partir de medida cautelar de urgência, as atividades produtivas publicadas nesta crônica.
Alegam os impetrantes que o conteúdo disseminado pelo autor deste espaço ignora os bons teores do otimismo necessário para os tempos atuais e ignora a condição simbólica e concreta dos prejudicados.
Acrescentam, ainda, que palavras, quando embebidas de tamanha vulgaridade e violência, são poderosas e extremamente prejudiciais à manutenção de um saudável espaço público. Afirmam que o autor, com demasiada insistência, tenta mostrar, apenas, reflexões inócuas e pessimistas, o que torna a manutenção da publicação inaceitável.
Argumentam também que, por serem familiares do objeto desta ação, temem pelo bom estado do quadro familiar, uma vez que se sentem expostos e pedem que seja levado em conta o exagero empregado por eles em ligações telefônicas — juntadas aos autos — nas quais pede com considerável virulência que atitudes da família em relação ao combate da covid-19 sejam alteradas, como o livre trânsito de pessoas com sintomas entre seus entes queridos e a opção pelo não uso de máscaras (o que o autor da publicação chama em uma das ligações de irresponsabilidade).
É o breve relatório.
Decido
Indefiro o pedido de medida cautelar e nego provimento da ação. Num dia bom, estariam vocês sendo avaliados por um juiz “imparcial”, que preza pelos valores da família tradicional e discorda da negatividade empregada nos textos e ligações.
Hoje, no entanto, contam apenas com meu julgamento. De modo que vejo como fundamentais as possibilidades de contraponto crítico às atitudes dos impetrantes, sobretudo no que diz respeito às negligências no combate à covid-19, as quais considero, por todo exposto, de fato irresponsáveis.
O otimismo tem função para a sobrevivência, mas, conforme jurisprudência de autores fundamentais da literatura e da filosofia, precisa de freios. Assim, o escritor tem direito de seguir em frente com seus devaneios e desvios líricos.
Como bem argumentado em Jards Macalé e Torquato Neto (Let’s play that), deixo ao autor meu recado: “Vai, bicho, desafinar o coro dos contentes”.