O impacto da pandemia do novo coronavírus tornou um desafio elaborar a previsão orçamentária anual. A crise exigiu diversos remanejamentos nas estimativas de recursos para 2020 e reajustes das expectativas para o exercício seguinte. A princípio, o Executivo local trabalhou com a possibilidade de uma realidade mais complexa em 2021. No entanto, o início da recuperação após a flexibilização das normas para o comércio fizeram com que as previsões para 2021 sejam mais otimistas, mesmo que timidamente.
Ao todo, são R$ 44,18 bilhões de receita estimada — incluindo os R$ 15,7 bilhões do Fundo Constitucional (FCDF) —, segundo o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2021. Em 2020, a previsão ficou em R$ 43,1 bilhões. A proposta do ano que vem deve passar por avaliação dos deputados distritais antes do recesso legislativo e, depois, será encaminhada para apreciação do governador Ibaneis Rocha (MDB).
Sancionada em setembro, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2021 considerou um cenário mais complicado. A receita total prevista era de R$ 42,6 bilhões. Por outro lado, houve frustração na expectativa em relação ao FCDF, usado para Segurança, Saúde e Educação. Projetava-se que o DF contaria com R$ 704,2 milhões a mais que os R$ 15,7 bilhões contabilizados no Ploa. Contudo, o valor tem relação direta com a arrecadação da União.
As alterações na comparação com as previsões de setembro se justificam pelas mudanças no cenário econômico local. A retomada de alguns setores do comércio contribuiu com a melhoria das perspectivas. Também teve impacto o bom resultado de áreas como supermercados e farmácias, que não pararam durante a crise.
“Quando preparamos a LDO, fazemos um retrato do momento. É natural ter ajustes na LOA. Percebemos que conseguimos manter a atividade econômica aquecida porque, apesar de alguns setores sofrerem muito — como bares e restaurantes —, outros — como supermercados e farmácias — se desenvolveram bem. Isso, com as mudanças fiscais e econômicas, possibilitou essas projeções”, destacou ao Correio o secretário de Economia, André Clemente, quando encaminhou o texto do Ploa aos distritais. “Tivemos queda de ISS (Imposto Sobre Serviços) e ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), mas tivemos, por outro lado, aumento (na arrecadação) do Imposto de Renda”, complementou.
Prioridades
A elaboração do orçamento permite definir um norte para as prioridades do governo local no próximo ano (leia No detalhe). Entre as despesas previstas com recursos próprios, a educação fica em primeiro lugar, com R$ 4,87 bilhões — além dos R$ 3,3 bilhões do Fundo Constitucional. Com a pandemia, esse setor precisou se readaptar e, em 2021, terá de se preparar para o provável retorno dos estudantes de escolas públicas às salas de aula.
Em segundo lugar nas despesas está a Previdência Social (R$ 4,6 bilhões). Porém, nos últimos dias, a capital federal viu crescer o receio sobre um aumento grande de casos da covid-19. Por isso, a Saúde está entre as prioridades, com orçamento de R$ 3,4 bilhões, provenientes do DF, e mais R$ 4 bilhões, do Fundo Constitucional.
Efeitos no cotidiano do brasiliense
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
A área com maior previsão de despesas enfrentou dilemas em 2020 e tem o desafio de diminuir desigualdades em 2021. Durante a pandemia, os investimentos na educação pública precisaram alcançar mais do que as instituições de ensino, que estão de portas fechadas, e chegar aos lares. Diversas famílias do Distrito Federal encaram o cenário de falta de instrumentos necessários para participar das aulas virtuais, como acontece com Ricardo Rodrigues Sansão, 27 anos, e Gesimilza Rodrigues Coelho, 29.
O casal tem quatro filhos, de 11, 5, 4 e 2 anos, e os dois mais velhos precisaram se adaptar às atividades virtuais sem computador em casa. “Tivemos de instalar internet em casa por causa disso (das aulas a distância), porque não tínhamos antes. Um plano bom custa mais de R$ 90. Computador não temos como comprar, então, eles (os filhos) dividem um celular para fazer as tarefas. Quando a escola começou a enviar materiais impressos, ajudou bastante. Mas a gente sabe que a situação ainda é muito desigual. Os colégios particulares têm muito investimento, e quem não tem dinheiro tem muito sofrimento”, lamenta Ricardo.
Em 2021, Adryan, o filho de 4 anos de Ricardo e Gesimilza, começará os estudos, aumentando as dificuldades da família, que tem três crianças atendidas pelo ensino remoto. “Neste ano, a gente teve de se desdobrar para que os dois (mais velhos) não perdessem o período letivo. Meus filhos usam meu celular, que até quebrou recentemente, mas conseguimos ajuda da líder comunitária e ela nos deu outro”, conta a mãe. “Essas atividades têm de ter acompanhamento dos pais, para ajudar. Estou desempregada, e meu marido, afastado do trabalho, de licença médica. Mas, em muitos lugares, os pais trabalham o dia todo e não conseguem auxiliar os estudantes”, completa Gesimilza.
Na casa de Elisvânia da Silva, 32, há dois adolescentes em idade escolar e falta o suporte tecnológico para as atividades pedagógicas. A doméstica mora com o marido e os dois filhos, de 13 e 17 anos. O único jeito de fazer os exercícios do colégio é com o celular da mãe, quando ela não está no trabalho. “A escola chegou a dizer para os pais que poderia chamar o Conselho Tutelar se os alunos ficassem sem entrar na plataforma de aula, mas eu preciso do meu telefone, e eles também. Então, eles acabaram sem fazer as atividades no começo da pandemia”, relata.
No detalhe
Confira as previsões para o orçamento de 2021
RECEITAS
Esferas fiscal e de seguridade social
R$ 26,903 bilhões (61,9% têm origem tributária)
Investimento das empresas estatais
R$ 1,512 bilhão
Fundo constitucional
R$ 15,771 bilhões
Total
R$ 44,187 bilhões
DESPESAS
Gastos de fundos próprios (fiscal e seguridade social)
Gastos com pessoal e encargos sociais (56,7%)
R$ 15,262 bilhões
Outras despesas correntes (28,6%)
R$ 7,697 bilhões
Investimento (4,7%)
R$ 1,272 bilhão
Reserva de contingência (6,9%)
R$ 1,839 bilhão
Amortização da dívida (1,9%)
R$ 508,6 milhões
Juros e encargos da dívida ativa (1,1%)
R$ 299,06 bilhões
Inversões financeiras (0,1%)
R$ 23,065 milhões
Áreas com mais despesas previstas de recursos próprios
Educação
R$ 4,877 bilhões
Previdência social
R$ 4,629 bilhões
Saúde
R$ 3,438 bilhões
Administração
R$ 2,562 bilhões
Urbanismo
R$ 1,850 bilhão
Segurança pública
R$ 1,047 bilhão
FUNDO CONSTITUCIONAL
Segurança
R$ 8,346 bilhões
Saúde
R$ 4,081 bilhões
Educação
R$ 3,343 bilhões