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Mães de pessoas com TEA contam os desafios para criar os filhos

Pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) enfrentam preconceito e, em muitos casos, têm de lidar com a desinformação

Jonathan Luiz*
postado em 04/12/2020 06:00
 (crédito: Phelipe Wener/Divulgação)
(crédito: Phelipe Wener/Divulgação)

Lidar com o transtorno do espectro autista (TEA) pode não ser fácil para quem recebe o diagnóstico ou para parentes dessas pessoas. Pela falta de compreensão sobre o assunto, é comum que muitos encarem esse tema com um olhar preconceituoso e carregado de estereótipos. É contra a imagem de que os filhos não podem ter uma vida de realizações que grande parte das mães de autistas lutam constantemente. Elas defendem que a determinação dos autistas tem força para abrilhantar qualquer indivíduo e que a confirmação médica dessa condição reforça apenas uma verdade: a de que existem formas diferentes de enxergar o mundo.

Marcel Menezes, 20 anos, nasceu com o tipo mais agudo do TEA. Além disso, ele teve um glaucoma bilateral e, aos 3, perdeu a visão por completo. A servidora pública Valéria de Menezes, 48, recebeu a confirmação do quadro do filho com surpresa, há cerca de 12 anos. “Percebia algumas diferenças no comportamento dele, mas como havia a deficiência visual, sempre restava a dúvida se o atraso no desenvolvimento seria em razão disso ou não. Mas, quando saiu o diagnóstico, foi bem intenso e impactante. (É) meu primeiro filho; realmente, fiquei sem chão”, conta.

À época do nascimento de Marcel, Valéria não tinha muito conhecimento sobre o que é o TEA, mas começou a estudar o assunto a partir desse momento. “Resolvi focar nas possibilidades e no que ele tinha para desenvolver. Antes de ser autista, ele é uma pessoa, com várias condições de crescimento e muita estrada pela frente”, afirma.

Mesmo assim, a estrada que os dois percorreram nos últimos 20 anos nem sempre foi tranquila. “Algumas escolas não queriam recebê-lo, sob alegação de não estarem preparada. Vizinhos reclamavam do barulho que ele fazia, pais de colegas de escola não queriam que os filhos ficassem perto dele (Marcel). E havia olhares de pena, partindo de pessoas que não tinham sequer a preocupação de disfarçar e o encaravam como se fosse alguém de outro mundo”, relata. No entanto, os desafios fortaleceram a relação dos dois, segundo a servidora pública. “Meu filho veio para me ensinar. Ele me deixou mais forte e, hoje, sou melhor do que poderia ter sido simplesmente por ele estar comigo. Ele é perfeito em um mundo imperfeito”, complementa.

Emoções

A psicopedagoga Cristina Ribeiro explica que o TEA é um transtorno do desenvolvimento caracterizado por deficit na comunicação e na interação social. Isso pode incluir processos como socialização; de comunicação verbal ou não verbal; reprodução de comportamentos repetitivos; demonstração de interesses restritivos; além de dificuldade para expor as emoções. “Muitas pessoas associam o autismo a um comportamento obrigatoriamente agressivo, mas esse pensamento é errado. Alguns autistas, especialmente as crianças, apresentam baixa tolerância às frustrações e externam isso em episódio de raiva, mas não são, necessariamente, pessoas agressivas”, destaca Cristina.

A intolerância a ambientes novos e que ofereçam muitos estímulos sensoriais associada a algumas das características mencionadas pela psicopedagoga tendem a gerar reações de desconforto em pessoas com TEA. E isso pode atrapalhar as relações com pessoas que não têm conhecimento sobre a situação. Contudo, Cristina lembra que o comportamento dos autistas difere de indivíduo para indivíduo. Segundo ela, o que funciona para um pode não funcionar para outro. “Portanto, não julgue, não tire conclusões precipitadas sem conhecer a pessoa com autismo. Respeito é primordial”, ressalta a especialista.

Aprendizado

Outra mãe que viu o filho enfrentar preconceitos foi a estudante Ana Claudia Pereira, 21, moradora de Planaltina (GO). Além de olhares críticos de desconhecidos, Davi Alexandre Rodrigues, 3, passou por constrangimentos com uma especialista. “Eu tinha contato com essa pessoa, que era preconceituosa e eu escutava por se tratar de uma pedagoga que trabalhava com crianças autistas. Ela me dizia que eles eram bem agressivos e poderiam desenvolver outros transtornos com o tempo”, relata a jovem. “Essa falta de informação sobre o autismo me fez entrar em um estado de negação. Depois de alguns meses, comecei a estudar sobre (o assunto), ler livros, acompanhar pessoas com TEA no Instagram e me dei conta de que não era a pior coisa do mundo. Eu estava apenas lidando com uma criança que tinha outra forma de ver o mundo, uma forma atípica”, acrescenta a universitária.

Encarar a desinformação dos demais deixava a estudante sem reação no início. Hoje, porém, ela conta que teria uma postura diferente. “Já ouvi muito que meu filho não come por ser fresco e mimado. Sempre tento explicar, mas nem sempre as pessoas entendem”, diz. Davi completará 4 anos em breve, e uma das principais dificuldades dele é com a questão alimentar. “Além disso, tem o atraso na fala. E a interação com outras crianças é um complicador, pois ele não consegue brincar com elas na escola. Mas ele é muito carinhoso. Ama abraçar e beijar, principalmente os tios e primos”, relata Ana Claudia.

*Estagiário sob supervisão de Jéssica Eufrásio

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