Os gráficos de evolução da pandemia no Distrito Federal mostram um crescimento da taxa de reprodução do novo coronavírus nas últimas três semanas. Segundo a Secretaria de Saúde, em 2 de novembro, 100 pacientes transmitiam o vírus para 78 pessoas; na segunda-feira, o número passou para 99. Embora visualizar a curva ascendente seja uma maneira eficaz de alerta à população, especialistas preocupam-se com o relaxamento de medidas de contenção. Dos 225.013 casos confirmados da covid-19 na capital, quase 60 mil tem até 29 anos de idade — uma parcela da comunidade que tende a ter maior movimentação social, que é menos suscetível aos sintomas mais alarmantes da doença e que pode fazer o vírus circular sem saber. Outro alerta é o fim de ano. Com a chegada de dezembro, começam a ser preparadas festas e confraternizações. Para evitar novas restrições, as recomendações básicas, do começo da pandemia, continuam sendo as mais eficazes para frear a pandemia.
Samara Portela, 38 anos, os três filhos — de um a 19 anos — e o marido, Geraldo Majella, 54, contraíram o vírus. As diferentes idades e manifestações da doença deixaram claro para a família que não há um padrão claro de quem terá infecções e complicações. “Até o bebê de um ano pegou. O resultado saiu em 1º de outubro, e ficamos fazendo o tratamento em casa. Eu senti dores no corpo e indisposição, os dois pequenos tiveram febre e diarreia, e a Iris, de 19 anos, e o meu marido ficaram mais graves, com falta de ar”, detalha a funcionária pública. O homem passou pela situação mais crítica. A família lembra que Geraldo queria fazer um vídeo contando do caso para conscientizar sobre o perigo da doença após se recuperar. Mas, no décimo dia depois do diagnóstico, ele apresentou febre, dificuldades para ficar em pé e foi internado. “Mesmo sem nenhuma comorbidade, a tomografia mostrou que 30% do pulmão dele estava comprometido e a saturação estava baixa. Ele chegou a ser intubado três vezes dali em diante, e faleceu no último dia 21”, lamenta Samara.
A enteada de Geraldo, Iris Portela, levou a diante a vontade do padrasto de levar conscientização. “Todos nós estamos propícios a pegar a covid-19, então, o que devemos fazer é nos prevenir. Evitar aglomerações, evitar tocar nas pessoas, levar o álcool em gel quando precisar sair de casa. São cuidados mínimos, mas que fazem total diferença. Tem gente levando na brincadeira, mas isso é sério, me deixou com complicações e tirou a vida do meu padrasto há poucos dias”, conta a estudante. Ela se recupera da infecção em casa, tomando os cuidados necessários, mas não se sente fisicamente disposta para atividades do dia a dia. “Todo mundo dizia que só era perigoso para quem era mais velho e tinha complicações, mas o vírus não escolhe e, mesmo quem é novo, pode pegar ou transmitir”, alerta.
Recomendações
“No campo epidemiológico, o cuidado com aglomerações, a higienização das mãos e o uso correto de máscaras continuam como as únicas formas que temos de diminuir a velocidade de propagação do vírus”, afirma o médico clínico geral e coordenador do Pronto-Socorro do Hospital Santa Lúcia, Luciano Lourenço. Com a possibilidade de superlotação das unidades de saúde, a recomendação era de que as pessoas fossem aos hospitais somente em caso graves da covid-19. “Hoje, isso mudou. Mesmo com os mínimos sintomas, o paciente é orientado a procurar atendimento médico, que vai determinar os tratamentos que devem utilizar de forma mais precoce e recomendar medidas necessárias de comportamento”, explica o médico.
Para Luciano, medidas restritivas adotadas em março, como fechamento do comércio e proibição de diversas atividades, não devem ser bem recebidas pela população. Dessa forma, ele avalia que é preciso reforçar os cuidados básicos. “Atendo cerca de 800 pacientes a cada 30 dias e percebo que muitas pessoas estão adoecendo por conta das restrições que a covid-19 impõe. Ou seja, percebemos doenças secundárias ao vírus, relativas ao estilo de vida que esse período impôs. Do ponto de vista infeccioso, o ideal seria ninguém ter contato com ninguém. Mas, a gente sabe a importância do contato da família, por exemplo, em um fim de um ano difícil. Então, precisamos encontrar um meio termo, reduzindo ao máximo o número de pessoas em encontros, com pouco contato físico e uso de máscara, entre outras ações”, pondera.
Palavra do especialista
Hemerson Luz, infectologista do Hospital das Forças Armadas (HFA)
A segunda onda depende do comportamento da população. Se alguns continuarem ou outros começarem a se comportar como se a pandemia tivesse acabado, participando de aglomeração, deixando de higienizar mãos, burlando regras e protocolos, a tendência é de caminhar para isso, como aconteceu na Europa, onde todos queriam curtir o verão. Temos que tomar esse cuidado aqui. Uma pessoa pode estar assintomática ou no começo da contaminação, ainda antes dos sintomas, e levar o vírus para outras. Vimos que as festas de fim de ano e o carnaval estão cancelados, porque é preciso evitar essas aglomerações. No dia a dia, tendo cuidado com sapatos e roupas ao entrar em casa, máscara sendo utilizada corretamente. As pessoas não podem relaxar, têm que optar pelo menor risco possível, ou seja, evitar espaços fechados, aglomerações, festas, toques entre as pessoas, locais que não respeitam a distância e, sempre, utilizar a máscara. Seguindo essas regras de forma rígida, acredito que a gente não vá entrar na segunda onda.