De volta à escola

Adequações para aulas presenciais com segurança para alunos e profissionais exigem novos equipamentos, metodologias e protocolos. Professores e servidores foram testados para o retorno gradual dos colégios particulares

Após seis meses da primeira suspensão de aulas presenciais, escolas particulares do Distrito Federal voltam, hoje, a receber os alunos nas instituições. Estudantes da educação infantil e do ensino fundamental — anos iniciais — podem retornar. Durante os últimos meses, os colégios passaram por momentos de dificuldade, com a necessidade de uma transição rápida para plataformas virtuais, inadimplências e evasões. Mas, escolas da capital enxergam esse período atual como um momento de investimentos necessários para garantir a segurança de saúde de alunos, pais e profissionais. O custo de cada colégio para se adequar aos protocolos de prevenção à covid-19 varia muito, a depender do tamanho da estrutura da instituição, mas compras de álcool em gel, tapetes sanitizantes e termômetros digitais, por exemplo, foram padronizadas.

Para além do padrão, muitas escolas resolveram investir em melhorias que não constam como obrigatórias por decreto, mas permitem maior segurança, como o Colégio Arvense, na 914 Norte. “Investimos R$ 106 mil em equipamentos de proteção individual (EPIs), exames clínicos, testagem para os funcionários, tapetes sanitizantes, materiais de limpeza e álcool em gel”, detalha a diretora Márcia Nogueira. Os custos também foram elevados por conta de uma cabine de desinfecção instalada na entrada.

No Colégio Santa Dorotéia da Asa Norte o esforço também foi grande. “Até agora, os investimentos passaram de R$ 100 mil. E não foi com mensalidade dos pais, porque ela não cobria, e ainda ajudamos muitos pais que passaram por dificuldades, reduzindo mensalidades. Era um valor da nossa reserva, mas nunca nos preocupamos em gastar muito, mas, sim, que todos que vão à escola tenham segurança”, diz o diretor Sérgio Renato Martins. Entre as novas aquisições, ele cita o serviço de sanitização em toda área da instituição, as marcações no piso para conscientizar sobre o distanciamento, máscaras para funcionários e alunos, face shields aos profissionais e equipamentos de transmissão de aulas, que permitem aos estudantes que queiram ficar em casa acompanhando o conteúdo.

Embora a decisão da Justiça sobre o debate dos testes de detecção de covid-19 em profissionais da educação tenha obrigado apenas exames de RT-PCR, em casos de confirmação, suspeita ou contato com infectado pelo novo coronavírus, algumas instituições resolveram não deixar nenhum profissional de fora, como o Colégio Objetivo. “Nós fizemos o teste sorológico em todo mundo. Organizamos dias escalonados e realizamos as testagens. Também firmamos convênio com um laboratório e o funcionário pode ir até lá realizar. A rede optou por fazer exames nos professores e em toda a equipe técnica e guardar nas unidades as cópias de todos os resultados, porque é uma forma de tranquilizar as famílias”, explica Cláudia Mialichi, gerente educacional do Colégio Objetivo DF.

Retorno tímido

Cláudia também conta que as pesquisas feitas pela instituição mostraram um interesse de cerca de 30% dos pais em levar os filhos à escola. O cálculo é semelhante na maior parte das escolas do DF. “Criamos um formulário para a família sinalizar se optar por não retornar. Houve investimento no nosso pacote de internet para potencializar a rede e a aula presencial ser transmitida on-line e gravada para posteriormente. Ou seja, isso abarca todas as opções da família, aqueles que querem aulas presenciais, os que querem continuar em casa acompanhando ao vivo e os que querem acompanhar na hora mais adequada”, pontua.

Segundo o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe), aproximadamente 70 ou 80 escolas voltam, hoje, às aulas presenciais, de um total de 580 instituições. O Colégio Inei, no Lago Sul, é uma delas. As atividades retornam nesta segunda-feira, com previsão de volta de cerca de 40% dos estudantes. “Estamos confiantes com esse retorno, porque a comunidade escolar está preparada para isso e sabemos a importância de cuidar da nossa saúde, física e emocional. Os alunos precisam socializar, ver os colegas, nós também precisamos estar com eles”, conta Gicelene Rodrigues, diretora pedagógica do estabelecimento.

Ela lembra de relatos dos estudantes no período de escolas fechadas para pontuar que o acolhimento será importante para o psicológico. “A saúde mental deles está precisando de um cuidado. Isso vai melhorar demais e dar tranquilidade à família também. Os alunos têm saudades dos colegas, dos professores, da escola. Tem criança que ia para o colégio aos fins de semana só para ficar olhando pela grade”, exemplifica. Outro ponto positivo citado por ela é a criação de reflexões de combate à pandemia. “Acredito que serão promovidas uma conscientização e formação de opinião que muitas vezes a família não tem. A comunidade escolar é um grupo, é uma coletividade. Então, fica fácil construir isso. Uns cuidam dos outros e não há aquela hierarquia familiar”, avalia.

Grande parte das instituições de ensino particular constatou que entre 20% e 40% dos pais desejam levar os filhos às aulas presenciais. Em 19 de outubro acontece a próxima etapa do retorno, com anos finais do ensino fundamental — 6º ao 9º ano. A última volta escalonada está marcada para 26 de outubro, com ensino médio e profissionalizante. O Detran não montará esquema especial para hoje, mas vai atuar na organização do trânsito em caso de necessidade.

Memória

11 de março
» Decreto n° 40.509 suspende por cinco dias atividades educacionais em todas as escolas, universidades e faculdades, das redes de ensino pública e privada

14 de março
» Decreto nº 40.520 prorroga suspensão por mais 15 dias

1º de abril
» Decreto n° 40.583 prorroga suspensão até 31 de maio

22 de maio
» Decreto n° 40.817 suspende aulas presenciais por tempo indeterminado

2 de julho
» Decreto n° 40.939 permite a volta das atividades em instituições particulares a partir de 27 de julho

24 de julho
» Ministério Público do Trabalho (MPT) aciona a Justiça Trabalhista pedindo o cancelamento do retorno presencial em face da pandemia do novo coronavírus

25 de julho
» Retorno presencial é suspenso por decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) por 10 dias

4 de agosto
» É revogada a decisão do TRT-10 que suspendia o retorno, ficando autorizada a volta imediata das aulas presenciais

5 de agosto
» MPT entra com um recurso contra a decisão judicial que autoriza a retomada

6 de agosto
» Justiça do Trabalho suspende o retorno

11 de agosto
» Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe) recorre à decisão

12 de agosto
» TRT-10 rejeita recurso

17 de agosto
» TRT-10 define encontro entre o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinepe) e o Executivo local para debater retorno em audiência

20 de agosto
» Audiência de conciliação sobre o retorno das aulas presenciais termina sem acordo

24 de agosto
» Audiência define novo retorno a partir de 21 de setembro

Reprodução - Tapetes sanitizantes fazem parte da série de medidas adotadas pelo Objetivo para receber os alunos com segurança
Arquivo Pessoal - "Estamos confiantes com esse retorno, porque a comunidade escolar está preparada para isso e sabemos a importância de cuidar da nossa saúde física e emocional. Os alunos precisam socializar, ver os colegas. Nós também precisamos estar com eles" Gicelene Rodrigues, diretora pedagógica do Inei

Duas perguntas para

Joana D’arc Gonçalves, professora de infectologia do Uniceub
Neste primeiro momento, será inevitável conter abraços,
beijos e contatos de uma criança com outra. Qual deve ser a
orientação dada pelos pais e professores nesses casos?
Eu fiz uma experiência com minha própria filha de 13 anos. Liberei para um encontro com uma amiga em casa e foi um sufoco. Quando virei as costas, elas estavam grudadas, dando abraços, toques, beijos. É muito difícil conter. Fico pensando no professor com vários estudantes. Vi um vídeo do retorno às aulas na Itália, de adolescentes do ensino médio e fiquei assustada por conta da aglomeração total. O retorno é um momento de muito entusiasmo para os estudantes, acho que será difícil evitar alguns gestos de carinho, principalmente para as crianças menores. Mas, podemos dar orientações. A escola deve ter uma equipe multidisciplinar que seja capaz de educar sobre higiene das mãos, distanciamento, limpeza de superfície adequada, mudança comportamental para evitar aglomerações — principalmente no intervalo — etiqueta respiratória, ficar em casa se tiver algum sintoma respiratório, evitar compartilhar objetos, ter atenção redobrada na hora das refeições para evitar manipulação desnecessária e compartilhamento de talheres e comidas, número reduzido em sala para garantir o distanciamento, entre outros. Algumas escolas fixaram as carteiras para evitar formação de grupos muito próximos. Acredito que o ensino a distância e presencial, de forma híbrida, ajuda para evitarmos aglomeração. Lembrando que cada dia será um desafio e que, se houver muitos casos de infecção, as escolas têm que rever os métodos.

Que outras formas de prevenção podem ser explicadas
para crianças em faixas etárias com mais dificuldade
de compreender os protocolos de saúde?
Criança é uma esponja que absorve tudo, principalmente por meio da observação do nosso comportamento. Sem falar que são os principais multiplicadores de informações. Quando aprendem, influenciam as atitudes dos adultos. A criança pode ser um aliado, se for bem instruída. Sabemos que muita coisa vai depender dos coordenadores, professores e gestores. Mudanças estruturais são essenciais para reduzir o contato entre as crianças. Além disso, a tarefa com relação à mudança comportamental tem que ser de forma lúdica e agradável com envolvimento familiar. Será um processo que deve contar com apoio e consciência de todos.