O Instituto Brasília Ambiental (Ibram) está em fase de conclusão de um estudo que monitora a população de capivaras às margens do Lago Paranoá. A pesquisa realizada pelo órgão, em parceria com a Secretaria de Meio Ambiente, Embrapa, Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Católica de Brasília, pretende quantificar os roedores e estabelecer o estado de saúde deles, identificar os parasitas existentes e verificar se há risco de transmissão de doenças para humanos. O intuito é levantar as informações necessárias para que as ações corretas sejam implementadas. Segundo o Ibram, o projeto será posto em prática ainda este ano.
De forma emergencial, o instituto está verificando a possibilidade de realizar bloqueios pontuais nas passagens para pedestres às margens do Lago Paranoá, impedindo que as capivaras acessem as ruas e as vias de tráfego, tanto do Lago Norte quanto do Lago Sul, evitando acidentes e conflitos evitáveis. O controle populacional do animal, no entanto, só é implementado quando constatada a superpopulação da espécie e em locais em que há risco iminente à saúde humana. No caso das capivaras, não foi verificado risco.
Uma das maiores preocupações de quem vive próximo ao lago é o aparecimento dos carrapatos das capivaras, que podem transmitir doenças graves; entre elas, a febre maculosa. De acordo com o instituto, mesmo o parasita sendo hospedeiro frequente nos roedores, ainda não foi detectado o agente contaminante para tal patologia. “Um dos compromissos do Ibran é deixar a população bem informada quanto à questão da convivência harmônica entre humanos e animais silvestres, uma vez que tratamos de todos os assuntos pertinentes à fauna silvestre com o foco, também, na saúde pública”, informou a nota enviada pelo órgão.
Há relatos da presença de capivaras na orla do Lago Norte desde a década de 1970. Com a democratização do local, novas Áreas de Proteção Permanente (APPs) passaram a ser disponibilizadas, tanto para as pessoas quanto para as capivaras, fazendo esses encontros, que antes eram raros, tornarem-se mais frequentes.
Receio constante
Enquanto os projetos não saem do papel, a população teme a presença dos carrapatos. Há três semanas, a aposentada Maria Lúcia Martins, 69 anos, foi picada por um. Ela lembra que estava no segundo pavimento da casa quando viu o parasita subindo em uma das pernas. “Levei um susto. Tirei com a mão, precisei de força e até sangrou. Fiquei preocupada”, contou.
Até ter a própria experiência, a aposentada não sabia sobre os riscos dos carrapatos para a saúde. Como mora no início da quadra e tem um jardim, acredita que a grama atraia os animais. “Tenho o costume de andar no jardim, passo a mão nas folhas. Para evitar problemas, precisamos jogar veneno na área. Nossa intenção não é machucar as capivaras, mas afastar os carrapatos”, afirmou Maria Lúcia.
A publicitária Maria Luisa Cunha, 32, que mora na Asa Norte, foi até a casa da mãe, que fica na QL 15, acompanhada do marido e do filho de 4 anos. A visita terminou com três das quatro pessoas picadas por carrapatos. Embora isso nunca tivesse acontecido antes, a família optou por não ir ao médico — em função da pandemia — e tratou a ferida com pomada por cinco dias até os sintomas de coceira e vermelhidão reduzirem.
“A gente brincou no quintal e dormiu lá. No dia seguinte, encontrei os carrapatos nos três, porque estávamos nos coçando demais. Tirei os bichos com álcool, igual se faz com cachorro, e comecei a aplicar a pomada”, disse Maria Luísa. Ela também explicou que sempre frequentou a região do Lago Norte, áreas verdes como o Parque das Garças e o próprio lago, mas nunca os carrapatos foram tantos quanto agora.
Um dia após visitar uma área verde que acessa o Lago Paranoá, a produtora de audiovisual Natália Dominici, 34, percebeu que foi picada por um carrapato na cabeça e no pescoço. Assustada, ela arrancou os parasitas com as mãos, passou álcool e ficou de olho se apareceriam sintomas de alguma doença, o que não aconteceu. Embora a presença de capivaras não seja novidade para quem mora nos lagos Sul e Norte, ela observou que, desta vez, os animais avançaram mais. “Eu notei que, depois da obra da Ponte do Bragueto, aumentou mais. Elas estão mais próximas”, disse a moradora da região.
Área verde
A médica veterinária Camila Maximiano explica que, com o isolamento social e as pessoas mais em casa, as capivaras encheram as ruas, principalmente as regiões com água, como os lagos Sul e Norte, e com área verde, já que são animais herbívoros, que se alimentam de folhagem. Nas regiões urbanas, eles acabam tendo mais contato com outros animais, transmitindo os carrapatos para eles e, consequentemente, para os humanos. “Os carrapatos não passam direto da capivara para as pessoas, eles estão no ambiente, no chão. Os pets, por exemplo, estão mais expostos, porque têm mais contato com o mato e o chão. Eles podem levar para casa”, detalha.
O principal risco de contato com um carrapato de capivara é contrair febre maculosa. A doença não é comum no Distrito Federal. De acordo com a Secretaria de Saúde do DF, apenas três casos foram registrados na capital, sendo um em 2005, outro em 2006 e o último em 2016. Não houve óbitos. Em caso de contato com o carrapato, o dermatologista Erasmo Tokarski orienta procurar um médico imediatamente para evitar problemas com a saúde. “Para se proteger, o ideal é usar repelente antes de ir a locais com esses animais”, instruiu.
Prevenção
A presença dos carrapatos de capivara é mais comuns na Região Sudeste. Durante a seca, porém, eles costumam aparecer no Centro-Oeste. Para prevenir casos de infecção, a Vigilância Ambiental em Saúde da Secretaria de Saúde do DF informa que monitora os ambientes com infestação, realizando a coleta e a identificação da espécie. Além disso, orienta a população com medidas preventivas. Os parasitas coletados são enviados ao Laboratório de Referência Nacional em Vetores das Riquetsioses do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) para pesquisar a presença de bactérias responsáveis pela doença. Os principais hospedeiros desse tipo de carrapato são as capivaras, os cavalos e os cães.
O biólogo Israel Martins explica que o trabalho da Vigilância Ambiental é educativo e de orientação. “Não aplicamos inseticidas no ambiente e nos animais, até porque, o uso de carrapaticidas não é recomendado, por ser uma medida de controle pouco eficaz, principalmente se utilizada como única estratégia de controle”, diz. O especialista alerta que o uso de carrapaticida é nocivo a outros animais invertebrados e pode ser um contaminante de água e solo. Ele esclareceu, ainda, que a utilização de produto químico deve ser feita apenas em situação de grande infestação, em áreas com a transmissão da febre maculosa.
*Colaborou Jaqueline Fonseca
Enfermidade
A febre maculosa é uma doença infecciosa, febril aguda e de gravidade variável. Ela pode se apresentar desde em formas clínicas leves e atípicas até em graves, com elevada taxa de letalidade. A patologia é causada por uma bactéria do gênero Rickettsia, transmitida pela picada do carrapato.
Febre maculosa
Sintomas
» Febre alta, dor de cabeça intensa, náuseas e vômitos, diarreia e dor abdominal e muscular constante. Além disso, podem aparecer inchaço e vermelhidão nas palmas das mãos e sola dos pés, gangrena nos dedos e orelhas, paralisia dos membros, que se inicia nas pernas e sobe até os pulmões, podendo causar parada respiratória.
Diagnóstico
» O diagnóstico não é fácil, pois os sintomas iniciais são semelhantes aos de outras doenças, como leptospirose, dengue, hepatite viral, entre outras. O indicado é procurar um médico, que solicitará exames. A falta ou demora no tratamento pode afetar o sistema nervoso central, os rins e pulmões, com risco de morte.
Tratamento
» Ele é feito com antibióticos específicos. Em determinados casos, pode ser necessária a internação do paciente, conforme avaliação médica.
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