Apenas um dos suspeitos presos durante a Operação Falso Negativo, deflagrada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), teve pedido de habeas corpus concedido pelo ministro Rogério Schietti, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Eduardo Hage, afastado do cargo de subsecretário de Vigilância à Saúde, obteve a liminar e poderá deixar a carceragem. Francisco Araújo, secretário de Saúde; Ricardo Tavares Mendes, ex-secretário adjunto de Assistência à Saúde; e Eduardo Seara Machado Pojo, ex-secretário adjunto de Gestão em Saúde; tiveram os requerimentos negados. Eles seguem na carceragem da Polícia Civil, até transferência para a Ala de Vulneráveis do Complexo Penitenciário da Papuda, o que deve ocorrer na terça-feira, conforme informado pelos advogados.
Na decisão que indeferiu o habeas corpus para Francisco Araújo, Schietti alegou que “considero plausível a afirmação, tanto da decisão judicial quanto da representação ministerial, de que há riscos concretos de continuidade das práticas ilícitas, se revogadas as prisões preventivas do paciente e dos demais agentes, que, em posição de destaque, protagonizaram a dinâmica da conjecturada organização criminosa.”
Todos os envolvidos são suspeitos , segundo o MPDFT, de esquema de fraude na compra de testes rápidos para a covid-19, gerando prejuízo de R$ 18 milhões aos cofres públicos do DF. O valor é equivalente a 900 mil testes rápidos para o novo coronavírus. Também são investigados Ramon Santana Lopes Azevedo, ex-assessor especial da Secretaria de Saúde; Jorge Antônio Chamon Júnior, ex-diretor do Laboratório Central de Saúde Pública do Distrito Federal (Lacen); e Iohan Andrade Struck, ex-subsecretário de Administração-Geral da Secretaria de Saúde.
Cleber Lopes, advogado de Francisco Filho, disse que recorrerá da decisão no Supremo Tribunal Federal (STF). A defesa de Eduardo Seara Machado Pojo lamentou a decisão e a prisão, que classificou como sem fundamento. “Diante da decisão do ministro Rogerio Schietti, torna-se imperioso buscar, na Suprema Corte, a precisa aplicação das regras constitucionais que resguardam a liberdade”, declarou o advogado Antônio Lázaro.
A defesa de Ricardo Tavares criticou a decisão, que chamou de absurda, e informou que ele não tem mais vínculo com a função relacionada nos fatos em apuração. “A prisão de Ricardo Mendes é medida injusta, incompreensível e cruel. A decisão fundamenta-se em suposta necessidade de evitar infrações, quando, na verdade, Ricardo sequer integra mais a Secretaria Adjunta de Assistência à Saúde, tendo se desvinculado da pasta em 10/07/2020”, informou, em nota. “Sua liberdade não oferece qualquer risco à sociedade ou à efetividade do processo, não havendo qualquer justificativa plausível para a prisão”, acrescentou.
A defesa de Eduardo Hage comemorou a decisão. “A gente considera a prisão dele plenamente absurda. Não havia nada concreto de ilícito, muito menos para motivar essa prisão antecipada”, comentou o advogado Marcelo de Moura Souza. Os demais deverão apelar às instâncias cabíveis. Apenas Iohan Struck segue sem apresentar-se às autoridades, resguardado em isolamento social por suspeita de infecção por coronavírus. Nesta sexta-feira (28/8), a defesa dele divulgou o relatório médico, que aponta quadro de infecção das vias aéreas superiores, com piora gradual, dores de cabeça persistentes, dor muscular, calafrios e febre baixa. O paciente teria tido contato recente com pessoa infectada pela covid-19.
O advogado dele, Alexandre Adjafre, informou que, por enquanto, não vislumbra necessidade de impetrar pedido de habeas corpus. “Pelo que está sendo apurado, mormente pela quebra do sigilo telefônico e prova documental constante dos autos, e com o que Iohan tem para explicitar em detalhes acerca dos fatos, por si só, serão suficientes para demonstrar que o mesmo não cometeu nem participou de qualquer ato ilícito com relação à operação denominada Falso Negativo, tendo, unicamente, cumprido fielmente com suas funções de servidor público concursado.”
Sobrepreço
De acordo com o MPDFT, mensagens trocadas em aplicativos entre os dirigentes mostram que todos tinham conhecimento das supostas irregularidades cometidas nas contratações investigadas. Para o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e para a Procuradoria-Geral de Justiça, há “provas contundentes” da prática de crimes de fraude, lavagem de dinheiro, cartel e organização criminosa.
No atropelamento de etapas em licitações, chegou a ser firmado um contrato entre a Secretaria de Saúde e a empresa de brinquedos temáticos Luna Park para a compra de 100 mil testes rápidos para covid-19. O advogado da Luna Park, Alexandre da Cruz, nega direcionamento e qualquer irregularidade por parte da empresa. A outra firma mencionada na investigação é a Biomega Medicina Diagnóstica, contratada dentro de prazos muito curtos, como indica o MPDFT. A companhia nega ter vendido testes, tendo apenas oferecido serviços de exames laboratoriais de anticorpos para a covid-19, o que incluiu montagem de tendas, disponibilização de mobiliário e funcionários. No comparativo com as demais concorrentes, os valores ofertados por ambas equivalem a um sobrepreço de 146,57% para a compra de testes.
Procuradas, as defesas de Jorge Antônio Chamon Júnior e Ramon Santana Lopes Azevedo não se posicionaram até o fechamento desta edição.