Está difícil para todo mundo nesses quase seis meses de pandemia. Tristeza, desânimo, sentimento de vazio, mudança repentina de humor são comuns. Com o isolamento social imposto pela pandemia da covid-19, emoções podem aflorar ainda mais, e o desafio de combater os problemas é maior. Respeitando o espaço de cada um, atividades artísticas, físicas e até o uso de tecnologia pode ajudar, e muito, a desestressar a mente, inclusive da meninada.
A psicóloga especialista em atendimento de crianças e adolescentes Milene Bernardes alerta a importância dos pais ou responsáveis na percepção de mudanças de comportamento dos filhos. “É bom prestar atenção em como a criança é no convívio familiar. Qualquer mudança no comportamento é sinal básico para se aproximar e questionar se está tudo bem”, frisa. Alterações na alimentação, roer as unhas ou insônia podem ser sinais de problemas.
Quando se nota essas mudanças, a especialista recomenda que o primeiro passo é a boa conversa franca. “Se os pais percebem alguma coisa, a tentativa inicial é de que eles próprios façam uma checagem. Se perceber que o filho está mais calado, abatido e choroso, é preciso ter um momento sem pressão para poder conversar e oferecer ajuda. É importante que os responsáveis escutem, mas sem rebater, tentar ouvir sem precisar achar necessário dar uma resposta na hora. Muitas vezes, a pessoa só quer desabafar, em vez de algo lógico e conceitos”, salienta. Feito isso, se os problemas continuarem, então, é o momento de procurar um profissional de saúde mental.
Milene destaca a importância de atividades no auxílio dos tratamentos, e lembra que cada pessoa tem a própria forma de encarar um problema. “Os exercícios físicos para desestressar devem ser construídos com empatia. Por exemplo, se uma pessoa faz natação, não significa que outro paciente vai se adaptar. Na verdade, pode acabar se tornando um transtorno, que deixará todo mundo mais irritado. É preciso fazer uma leitura global, não adianta só oferecer mil atividades”, diz.
A escolha de uma atividade vai depender de cada pessoa. No caso da estudante Ketlyn Lorranni Marques, 18 anos, moradora de Taguatinga, a arte é usada como um suporte para o seu tratamento. “No início deste ano comecei a desenhar como hobby. Gostei muito e comecei a focar nisso para esquecer da nota do Enem que demoraria a sair. Mudei de psicóloga e psiquiatra. Hoje, tomo pouco remédio e faço terapia há três meses”, conta. A jovem ressalta a importância da arte para ela. “A pintura é um forma de direcionar minha ansiedade, energia em excesso e focar no trabalho, sem deixar que nenhum pensamento ansioso ou depressivo tome conta do meu corpo”, expressa.
Alternativa
Ketlyn conta que sempre sofreu com a ansiedade, mas, em 2018, o problema se agravou. A pressão com os estudos para os vestibulares contribuiu para aumentar o problema. Mas foi dessa situação que ela descobriu a paixão pela pintura. “Estudei Impressionismo na escola e me apaixonei pela técnica. Minha inspiração é Claude Monet”, revela.
Esse tipo de tratamento pode ser uma alternativa para quem não se sentir confortável em conversar, como explica a psicóloga clínica especializada em arteterapia Mariana Kirschner. “Nesse método, a arte é o elemento central para a transformação da saúde do paciente. Em vez de falar das coisas que está sentindo, a pessoa vai criar, explorar a criatividade”, explica. A terapia pode abordar pinturas, desenhos, músicas, escrita, danças e fotografias.
“Eu tenho pacientes que não gostam de desenhar, então, eles trabalham com fotografia, por exemplo, ou com a escrita. O importante é o potencial criativo, a pessoa se expressa, se conhece por meio da arte que está produzindo”, ressalta. Ela complementa: “Um dos pilares da arteterapia é o processo criativo, não o resultado”.
Apesar de psicólogos serem especialistas em tratamentos mentais, eles também precisam se cuidar. Guilherme Campello, 30, mora em Brasília e é psicólogo. Ele conta que enfrenta a depressão desde a infância. “Na minha juventude, tinha a leitura de que a minha personalidade era mais para baixo. Mas, comecei a me identificar com uma pessoa que já tinha passado por crises depressivas. A princípio, entendia todos os sintomas da doença como característica da minha personalidade, porém, ao longo da vida, tive diversas formas de perceber a doença, mas abri mão e fui contornando essas questões”, aponta.
Ele começou a fazer tratamentos na adolescência, e usa a música como uma terapia. “Quando era mais novo, curtia muita música, prestava atenção nas letras, ouvia as canções e me identificava com os artistas. Tinha um interesse maior no rock internacional, cujas as bandas cantavam músicas com temática existencial e também abordavam questões como saúde mental e depressão. Coisas mais marginalizadas, mas, na música, encontrava o espaço de diálogo. A música tem um papel fundamental na minha vida”, afirma.
Mudanças de humor
Da alegria contagiante para a tristeza profunda em poucos minutos. Situações acionadas por pequenos gatilhos que, para muitos, podem ser insignificantes como, por exemplo, um simples desentendimento. As emoções saem do controle e se transformam em berros, palavrões e até agressões.
Após a explosão, vem o sentimento de culpa e o medo do abandono, faz com que a pessoa possa buscar refúgio no álcool e em outras drogas. As emoções afloram de tal forma, que chegam ao ponto de levar a pessoa a se automutilar. Esse é o problema de quem sofre de transtorno de personalidade borderline (TPB).
A atendente Jhéssica Kéthullen dos Santos, 26, moradora de Ceilândia, conta que descobriu que é borderline há quase dois anos. “Meu ex-marido falava que eu precisava ir ao psicólogo, pois, quando ficava com raiva, quebrava a casa toda, e depois me arrependia e me derramava em choro.” Para enfrentar o problema, Jhéssica investiu na atividade de maquiagem estética como escape e terapia. “Antes, fazia as maquiagens, tirava e pronto. Até que um dia resolvi gravar e postar no Instagram. Gostei, me senti melhor”, salienta.
*Estagiária sob supervisão de José Carlos Vieira