Apesar dos impactos negativos na economia causados pela pandemia do novo coronavírus, a abertura do negócio próprio continua sendo uma alternativa para a geração de renda, principalmente para quem busca driblar o desemprego. Dados da Junta Comercial, Industrial e Serviços do Distrito Federal (Jucis) mostram que, de 17 de março — quando começaram a ser adotadas as medidas preventivas contra a covid-19 — até 17 de agosto, 24.716 empresas iniciaram as atividades no DF. Dessas, 19.368 são de microempreendedores individuais (MEIs). No mesmo período do ano passado, esse número foi 5,6% maior, com um total de 20.517 MEIs. À época, foram 26.448 novos empreendimentos.
Entre os setores que mais cresceram desde o início do isolamento social estão promoção de vendas, varejista de vestuário e acessórios, fornecimentos de alimentos para consumo domiciliar, restaurantes e similares e cabeleireiro, manicure e pedicure. O levantamento mais recente da Jucis aponta que, até 5 de julho, o Plano Piloto foi a cidade que mais recebeu novos negócios, com 2.497. Em seguida, aparecem Ceilândia (2.318), Taguatinga (2.048), Samambaia (1.476) e Guará (1.223).
Superintendente do Sebrae no DF, Antônio Valdir ressaltou que, ao longo do tempo, mudou o perfil de carreira profissional do brasiliense. Antes, o sonho era construído em cima da esperança em alcançar uma vaga no serviço público. Hoje, o empreendedorismo bate mais forte. “Quem saiu da universidade nos últimos 5 anos é de uma geração que tem o empreendedorismo como alternativa”, explicou. A crise, no entanto, impulsionou parte dessas pessoas que desejam ter o próprio negócio. “Costumo dizer que, na crise, o empreendedorismo sai da mão do acomodado e vai para a mão daquele que se ajustou ao mercado. A crise sempre é um bom momento”, afirmou.
De acordo com Antônio Valdir, dois pontos são importantes para quem quer ter boa chance e sucesso. A primeira é identificar-se com o segmento enquanto vocação, principalmente para o pequeno empreendedor. “Ele é o que faz tudo. Vende, compra, atende. Se não tiver identidade, não vai suportar estar dentro do negócio. Por exemplo, uma pessoa vai montar um pet shop, mas não gosta de animais. Como vai ficar nisso?”, questionou o superintendente do Sebrae. O segundo passou é conhecer e preparar-se para o mercado, assim, terá mais oportunidades.
Sonho
Moradora de Samambaia e formada em administração, a empresária Layanne Araújo, 28 anos, sempre sonhou em abrir o próprio negócio. Na infância, tinha facilidade para criar roupas de bonecas. Em 2017, abriu o Dlaychic Boutique, mas, como trabalhava no setor hoteleiro, não tinha tempo para atender às clientes e fechou a empresa. Como a pandemia afetou o ramo no qual prestava serviço, foi dispensada em março. Segundo ela, ali nascia a oportunidade de empreender novamente.
Em 7 de maio, ela comprou mercadoria, começou a usar um quarto cedido pela sogra dela, em Samambaia, montou a loja e divulgou as peças de roupas femininas nas redes sociais. “O meu negócio vem dando certo, e eu sempre vou dizer que ele só prosperou porque eu acreditei nos meus sonhos e que Deus me permitiu viver o extraordinário, mas tem sido desafiador a cada dia”, disse Layanne.
Há três anos, os empresários Filipe Oliveira, 26, e João Lucas dos Santos, 25, começaram a pensar em abrir um negócio juntos. O sonho, no entanto, se tornou realidade em maio deste ano. A dupla trabalhava junta em uma empresa de certificação digital, mas foi desligada quase na mesma época. Como João cursa agronegócio na Universidade de Brasília (UnB), eles decidiram dar início à Colheita Hortifrúti, oferecendo serviços de delivery de frutas, verduras e legumes. "O medo e o empreendedorismo andam lado a lado, principalmente para pessoas que começam do zero, mas o que faz a diferença é se entregar ao medo e não conseguir agir ou superá-lo e colocar seu negocio em pratica, independente de todas as diversidades", afirmou Filipe.
Donos da lanchonete Beijú, na 209 Sul, Alan Marzola, 35, e João Gabriel Amaral, 27, iniciaram uma reforma no espaço em 10 de janeiro. A ideia era inaugurar em poucos meses. Porém, a obra acabou no meio da pandemia. “Ficamos receosos, mas decidimos começar a funcionar mesmo assim, com as vendas por aplicativo. Ficamos sem saber como seriam os próximos dias, se os comércios abririam. Quando voltaram, vimos que funcionou e está dando tudo certo, tanto que abrimos uma segunda unidade na Asa Norte”, contou Alan.
Risco
Doze dias antes de o GDF anunciar o fechamento do comércio, a empresária Ludmilla Moura, 31, abria as portas do Dona Zuca, na 309 Norte, uma lanchonete inspirada em casa de vó, como ela diz. Antes, Ludmilla trabalhava com encomendas de bolos e salgados em uma sobreloja, na Asa Norte. Quando decidiu abrir um espaço para receber os clientes, veio a pandemia. “Eu sempre fui muito insegura. Achava que não daria conta de atender à demanda. Até que, um dia, a minha sogra disse que, se eu esperasse a situação perfeita, eu nunca abriria a minha loja. Todos entraram nesse sonho comigo. Mas logo precisamos baixar as portas”, lembrou.
Mesmo assim, a empresária não pensou em desistir. “Em comparação com aqueles 12 dias que funcionou, o faturamento caiu 70%. O movimento caiu. Agora, as pessoas estão começando a se sentir seguras ao sair de casa. Para manter, tivemos de nos reinventar e voltamos para os trabalhos de entrega. Esperamos nos recuperar para o negócio não entrar em depressão. Ainda não conseguimos”, contou.
Palavra do Especialista em direito empresarial Silas Adauto
Segundo o IBGE, até o primeiro trimestre de 2020, o Brasil contabilizava mais de 38 milhões de trabalhadores informais. Esses números revelam que boa parte dos empreendedores optam pela informalidade, provavelmente, por desconhecerem os direitos inerentes à sua atuação como empresário.
Desta forma, cabe ressaltar, que existem três obrigações principais do empresário, que estão elencadas no Código Civil Brasileiro, que desencadeiam diversos direitos que resguardam a empresa.
Os principais deveres a serem cumpridos pelo empresário, são: efetuar o Registro na Junta Comercial Estadual – preferencialmente – antes de iniciar suas atividades; fazer a escrituração dos livros obrigatórios; e fazer o Balanço Patrimonial.
O cumprimento de tais deveres, abre um leque de direitos como a criação da personalidade jurídica da empresa e a sua regularização ante ao Estado. Subsequentemente, há liberação dos alvarás de funcionamento e das respectivas licenças, bem como possibilita a participação em licitações e a abertura de conta corrente empresarial, o que pode ajudar a distinguir o patrimônio da empresa, do patrimônio pessoal – que por vezes se confundem, gerando sérios riscos ao empresário.
Por fim, diante das incertezas que permeiam a atividade empresarial, destaca-se a prerrogativa de pleitear a recuperação judicial, além da possibilidade de demandar o pedido de falência – se resguardando das imputações de crime falimentar e falsificação documental – assim como, de utilizar os documentos constitutivos para comprovar direitos em face de credores e devedores.
Portanto, apesar do ramo empresarial brasileiro ser marcado por uma cultura de informalidade, faz-se imprescindível a mudança de mentalidade do empresariado, visto que o impacto positivo da regularização, é medida indispensável para o bom andamento dos negócios e da economia.