Ensino

Audiência na Câmara Legislativa debate educação domiciliar no DF

Deputados e representantes de entidades discutiram constitucionalidade de projeto de lei que tramita em urgência na Câmara Legislativa e que prevê a possibilidade de educação domiciliar

A Câmara Legislativa promoveu, nesta terça-feira (18/8), uma audiência pública para debater a educação domiciliar no Distrito Federal. A discussão foi promovida pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), por requerimento do deputado distrital Reginaldo Veras (PDT), em virtude de um Projeto de Lei do Poder Executivo que busca legalizar o homeschooling como modalidade educacional permitida na capital.

Caso aprovado, o PL permite que pais e tutores legais possam promover o ensino pedagógico de crianças e adolescentes em casa, sem a obrigação da matrícula escolar, desde que seguidos alguns critérios. O debate on-line começou às 10h e foi transmitido nas redes sociais da Câmara, com a participação de parlamentares, entidades e comunidade em geral. Foram três horas de apresentação de ideias e concepções, de 20 participantes.

Os aspectos da constitucionalidade foram foco das falas, pois não há hoje uma legislação federal que permita ou proíba a educação domiciliar. O debate já foi pauta, inclusive, no Supremo Tribunal Federal (STF), em 2018. Na ocasião, o Supremo entendeu que “não há legislação que regulamente preceitos e regras aplicáveis a essa modalidade de ensino”.

Posições


Entre os parlamentares que manifestaram opiniões distintas sobre o tema, estavam Leandro Grass (Rede) e Júlia Lucy (Novo). Leandro avaliou que há uma série de impedimentos para a legalidade do modelo educacional. “Considerando o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes Básicas da Educação, o projeto não se adequa às normas de constitucionalidade e não deveria ser acatado com parecer favorável”, defendeu.

Para o deputado distrital, é importante lembrar que a legislação proposta não está abarcada na Lei de Diretrizes Básicas da Educação, que é o texto que diz respeito às modalidades educacionais. Júlia Lucy, por outro lado, citou possibilidades de permissão da educação domiciliar a partir do que dizem documentos como a Declaração dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos Sociais e Culturais e a Constituição.

“Eles mostram que há garantia aos pais e tutores legais do direito de escolher para filhos escolas distintas daquelas criadas pelas autoridades públicas. Aprovar o PL é uma oportunidade de enxergar essas famílias (que adotam o modelo) e observar que o Supremo decidiu que não podemos ter educação sem a participação do Estado, mas com a conjugação de Estado e família, é permitido”, observou.

A promotora de Justiça de Defesa da Educação do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), Cátia Vergara, também participou do debate. Ela lembrou que, em 2018, a Promotoria expediu norma técnica em que se posicionava sobre a constitucionalidade da educação domiciliar. “No documento, destacamos a soberania da família. O STF não declarou inconstitucionalidade, declarou que precisa de uma lei regulamentando. Vejo tantas coisas inconstitucionais na educação hoje, como o elevado nível de analfabetismo, distorção idade-série e um nível de evasão escolar absurdo. Isso sim deve ser preocupante”, afirmou.

Houve ainda debate pedagógico sobre o tema. Vânia Rego, professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal, avaliou que a educação domiciliar não só não encontra bases legais como também demonstra um cenário perigoso para o país, socialmente. “O debate é importante, mas ninguém aqui vai achar subsídio na LDB para justificar a educação domiciliar. Sem contar que a escola tem um papel além do educacional. É na escola que descobrimos violência sexual, agressão e tortura de familiares, por exemplo. Do ponto de vista da socialização, sou grata à escola. Precisamos sair dos grupos pequenos, como somente núcleos de igrejas, para observar o mundo por uma visão ampla”, declarou.

Caso aprovado o PL no DF, os pais da capital passam a ter segurança jurídica para aplicar o modelo. Atualmente, com a obrigação legal de matricular e manter crianças e adolescentes de 4 a 17 anos na escola, pais que aderem ao homeschooling podem ser denunciados por abandono intelectual. O projeto deve ser colocado para apreciação nas próximas semanas.