Um dos cartões-postais de Brasília, o Lago Paranoá é espaço de diversão e lazer. No entanto, em alguns casos, festas realizadas em barcos e lanchas no espelho d’água são acompanhadas de excessos, aglomerações e falta de cuidados com segurança, como relatam moradores e frequentadores da região, que reclamam de descumprimento de regras e de exageros. Quando a precaução fica de lado, o risco aparece, e deslizes podem causar acidentes graves ou até fatais.
De 1º de janeiro a 6 de agosto, o Corpo de Bombeiros atendeu a 10 ocorrências de afogamento no Lago. Três pessoas morreram. No ano passado, cerca da metade dos casos acabou em morte. Foram 21 registros e 11 óbitos. O caso mais recente é de um advogado, cujo corpo foi encontrado em 5 de agosto. Ele participava de uma festa em uma lancha e caiu no espelho d’água. As circunstâncias são investigadas pela Polícia Civil, mas a hipótese é de que se trate, de fato, de acidente.
Especialistas e autoridades recomendam diversos cuidados e medidas ao usar o lago (leia Dicas de segurança). Evitar o consumo de bebidas alcoólicas e ter equipamentos de segurança são alguns dos alertas, assim como ter cuidado em passeios e festas noturnas, quando o risco de acidentes é maior. Em tempos de covid-19, o distanciamento é outra questão levantada e, frequentemente, deixada de lado, segundo relatos, pelos que navegam e usam o local.
Embarcações
O mercado para quem quer ser proprietário é de luxo: embarcações mais sofisticadas podem custar até R$ 5 milhões.
Há, no entanto, regras que precisam ser cumpridas por quem navega pelo Lago Paranoá e, quando ignoradas, podem render multas, apreensões e até processos criminais (veja Punições). As embarcações devem seguir normas de segurança e manutenção, como ter equipamentos para socorro, manter distância de 200m das margens, e os condutores devem ser habilitados. Assim como no trânsito terrestre, a lei proíbe o consumo de bebidas alcoólicas.
A fiscalização dessas normas é realizada pelo Capitania Fluvial de Brasília (CFB), da Marinha. Quarenta militares atuam em ações educativas e de inspeção em toda a jurisdição da CFB, que engloba também Goiás. Na região de controle da capitania, há cerca de 53,8 mil embarcações registradas — quarta maior frota do país, atrás de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná. No Lago Paranoá, a fiscalização é feita com equipe de, no mínimo, uma embarcação, com quatro militares, às sextas, aos sábados e domingos e em feriados, além de um dia aleatório por semana, de segunda a quinta.
De janeiro a julho, cerca de 2,2 mil abordagens foram feitas no espelho d’água, das quais 215 geraram notificações, por descumprimento de um ou mais artigos da Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lesta). As multas variam de R$ 40 a R$ 3,2 mil e são cumulativas em caso de diversas infrações cometidas por uma mesma embarcação. “Realizamos a inspeção de tráfego, que envolve ação educativa para todos a bordo. Verificamos o estado da embarcação, indícios de contaminação hídrica, a documentação, a lotação máxima, se os equipamentos de salvatagem (como coletes) estão em bom estado e se são homologados e se encontram em número compatível com a lotação, além de consultar a habilitação”, detalha o capitão Renato Canuto, ajudante da CFB. “Caso exista suspeita, o condutor passa por teste de alcoolemia e, se for flagrado, é conduzido à autoridade policial.”
Para resgates, o Corpo de Bombeiros mantém, diariamente, oito militares, em média, que atuam como mergulhadores e guarda-vidas. Nos fins de semana, outros 15 profissionais participam das ações, distribuídos em cinco pontos do Lago: Ermida Dom Bosco, Prainha do Lago Norte, Prainha dos Orixás, Ponte do Bragueto e Ponte JK.
O tenente Fábio Bohle, do Serviço de Informação Pública do Corpo de Bombeiros, ressalta que a maioria dos afogamentos e acidentes tem relação com bebidas. “A pessoa perde reflexo, resistência. Pode até ser atleta, mas, depois de ingerir certa quantidade de álcool, a capacidade é reduzida. Aí, acontecem cãibras, cansaço, e isso leva, automaticamente, ao afogamento”, detalha.
Instrutora de condutores e dona da escola náutica Quality, Luciana Vezaro Zampieri reforça a atenção para evitar o consumo de álcool. “É preciso muito cuidado. Água é algo que, em geral, não combina com álcool. Para os condutores, é fundamental saber que não se pode beber de forma alguma”, orienta. “Outra questão importantíssima é que apenas pessoas habilitadas devem conduzir embarcações”, alerta.
Preocupação
A advogada Geovana Magalhães, 29 anos, nada perto da Ponte JK e explica que, ali, sobretudo, aos sábados e domingos, fica lotado. “De lancha ou de jet-ski, eles passam muito rápido, e nunca enxergam a boia de segurança”, reclama. “Vim nadar em uma segunda-feira, às 6h, e tinha gente fazendo festa que começou no domingo. Eles não respeitam nada e deixam tudo sujo, cheio de latinha de cerveja”, denuncia.
O servidor público Pedro Lacerda, 33, compartilha da opinião de Geovana. “O lago acaba ficando cheio de festa, e não vejo fiscalização efetiva. O Corpo de Bombeiros ajuda. Outro dia, resgataram um amigo, que ficou à deriva, mas não estão aqui o tempo todo”, declara.
Colaborou Jéssica Eufrásio