O acesso à saúde em meio à pandemia preocupa as autoridades de saúde e a população do Distrito Federal. A espera por vagas em leitos de unidade de terapia intensiva (UTI), por exemplo, chega a até sete dias. Na manhã de ontem, a lista da Sala de Situação da Secretaria de Saúde mostrava que havia pelo menos 45 pessoas com covid-19 ou com suspeita da doença no aguardo de uma vaga especial. Um dos casos era de um paciente com o novo coronavírus, que aguardava a uma semana a transferência para a UTI. Esse era o quadro mais crítico, resolvido no começo da tarde. Somando com pessoas com outras enfermidades, a lista de espera por uma UTI tinha ontem 115 nomes. Um deles aguarda vaga desde 30 de julho.
A avaliação médica de cada caso indica o grau de prioridade do paciente, separando-os nos níveis 1, 2, 3, 4A e 4B. No total, 35 pessoas com covid-19 ou suspeita são dos dois graus de maior prioridade (1 e 2), o que aumenta a urgência pelo leito adequado. O vice-presidente da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, Alexandre Cunha, alerta que deixar pacientes esperando leito fora da UTI aumenta a mortalidade. “Pacientes com indicação de UTI não podem esperar por leitos. Eles são críticos, precisam de monitoramento contínuo, reavaliações com alta frequência e suporte de equipamentos e drogas que só podem ser feitos em uma UTI. Além disso, precisam de uma equipe acostumada a lidar com as peculiaridades desses casos”, explica.
Entre as estatísticas da lista de espera, passam histórias de moradores do DF que perderam a batalha para o vírus enquanto aguardavam uma UTI, como José Pereira, 72 anos. A filha, Luciana Dias, 27, conta que o pai enfrentava uma arritmia cardíaca enquanto estava internado, mas não conseguiu o atendimento necessário. “Ele morava em Sobradinho, então, quando sentiu os sintomas da doença, foi para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Sobradinho 2. Lá, ficou seis dias internado, e eu tive de levar até remédio, porque a médica dizia que não tinha. Depois, ele foi encaminhado ao Hospital de Campanha do Mané Garrincha, onde colocaram uma máscara para melhorar a oxigenação. Disseram que ele passaria por exames e informaram sobre um problema no coração”, relata a advogada.
Luciana lembra que conseguia falar com o pai por televisitas, auxiliadas pelos assistentes sociais do hospital, mas que se surpreendeu com a piora repentina. “A médica disse que não tinha cardiologista de prontidão para o caso dele, então, ele teria de ser transferido. Os resultados dos exames estavam muito ruins, e ele chegou a ser intubado”, detalha. Em 25 de julho, os médicos chamaram a filha ao hospital e relataram o óbito. “Eles falaram o que meu pai precisou de uma UTI, mas que não tinha conseguido, porque era necessário o exame mostrando a infecção do coronavírus, que demorou oito dias para ficar pronto e mostrar que estava positivo”, lamenta.
José Pereira era servidor público aposentado. Técnico de enfermagem, ele trabalhou por mais de 10 anos no Hospital das Forças Armadas (HFA) e passou pelo Hospital Regional de Sobradinho. “É uma situação horrível, fiquei em estado de choque. Vi falta de humanidade, porque nem me falaram que ele estava precisando do leito, só contaram depois. O meu pai trabalhava na área da saúde e não conseguiu uma UTI no fim da vida”, desabafou Luciana.
Redirecionamento
O subsecretário de Vigilância à Saúde, Eduardo Hage, negou que exista uma longa fila de espera para UTI no Distrito Federal. “Há casos de pacientes que estão em um leito de UTI e evoluem para quadros de saúde que dependem de suporte específico: cardíaco, neurológico, entre outros. Os pacientes são regulados pela Central de Regulação até o direcionamento a esses leitos. Hoje, 34 pacientes aguardam transferência, dos quais apenas sete não estão em leitos de UTI. É bom frisar que a data que aparece na lista refere-se ao dia de internação do paciente e, portanto, não é a data de quando ele aguarda o leito. O tempo, em média, para o redirecionamento desses casos não está passando de 48 horas”, disse.
Colaborou Jéssica Eufrásio
DF tem 54 mortes em 24 horas
Total de óbitos é o maior confirmado no período desde o início da pandemia causada pelo novo coronavírus. Com mais 1,7 mil notificações, a capital federal chega a 129.184 casos da covid-19. Enquanto isso, começam a faltar vagas nas UTIs
O Distrito Federal enfrenta o quinto mês da pandemia do novo coronavírus. Apesar do período extenso, a quantidade de mortes e de casos continua a crescer, o que aumenta a demanda nas unidades de saúde e impacta os atendimentos. Ontem, pelo segundo dia consecutivo, a capital registrou o maior número de óbitos provocados pela doença em 24 horas: 55 vidas perdidas, sendo 54 moradores da capital. Além disso, 1,7 mil pessoas testaram positivo para a covid-19, e o total de infectados chegou a 129.184.
Na terça-feira, a capital havia registrado 53 mortes, sendo 47 moradores da capital e seis que viviam em outras unidades da Federação, mas que faleceram em hospitais do Distrito Federal. Esse era o maior número desde o início da pandemia. Dos 55 óbitos contabilizados ontem, uma das vítimas morava em Goiás. Com os registros, o total de óbitos devido à doença chegou a 1.870 (1.709 do DF e 161 de fora).
Monitoramento da Secretaria de Saúde mostra que as mortes contabilizadas nessa quarta-feira aconteceram entre 20 de julho e ontem. Todas as vítimas tinham mais de 20 anos e 11 não tinham comorbidades — outras doenças que agravam os sintomas do novo coronavírus. As cidades que mais perderam moradores foram Ceilândia (11), Gama (10) e Guará (6).
Apenas nesta semana, entre domingo e ontem, o Distrito Federal registrou 7.360 diagnósticos da covid-19, além de 158 mortes provocadas pela doença. Na segunda-feira, a capital teve a maior alta de diagnósticos em um dia: 3.012 infectados. Apesar da quantidade expressiva de contaminados, 110.622 pacientes são considerados recuperados da covid-19. Portanto, há 16.682 casos ativos.
Ceilândia, a região mais populosa da capital, continua na liderança no número de casos. Ao todo, 15.385 pessoas testaram positivo para a doença na cidade. O segundo lugar é ocupado por Plano Piloto, que soma 10.472 infecções, seguido por Taguatinga, com 9.654 diagnósticos. No total, 9.587 moradores de outras unidades da Federação fizeram o exame e receberam diagnóstico positivo no DF. As cidades com menor incidência da doença são: SIA (63), Fercal (81) e Varjão (197).
MP vê falhas em duas unidades públicas
A força-tarefa do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) que acompanha as ações de enfrentamento à covid-19 requisitou à Secretaria de Saúde esclarecimentos sobre problemas encontrados em inspeções realizadas no Hospital Regional de Santa Maria e na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Ceilândia. A vistoria foi realizada na primeira semana de agosto. Em relação ao HRSM, o MPDFT requisitou informações sobre a insuficiência de leitos de enfermaria, a dificuldade de transferência de pacientes sem covid-19 para leitos de enfermaria e de UTI e a indisponibilidade do serviço de hemodiálise, entre outros temas. Sobre a UPA de Ceilândia, a força-tarefa questionou a demora no resultado de testes de covid-19, a dificuldade no transporte de pacientes e a demora na liberação de leitos pelo sistema Sisleitos, entre outros problemas.
No detalhe
Lista de espera por leitos de UTI para covid-19
45 pacientes aguardam leitos
15 estão no estágio mais grave entre os graus de prioridade
24 ocupam leitos comuns e precisam ser levados para a UTI
21 estão em UTI, mas precisam da transferência para leitos específicos
Lista de espera por leitos de UTI comuns
70 pacientes com outras doenças
18 no estágio mais grave entre os graus de prioridade
10 aguardam há pelo menos uma semana
Ocupação de leitos públicos de UTI para covid-19
77,6% do total estão ocupados
15,9% ficam ocupados, em média, por mais de 16 dias
5 hospitais têm vagas em leitos de UTI com suporte para hemodiálise
8 unidades de saúde estão com todos os leitos de UTI com suporte para hemodiálise ocupados
Ocupação de leitos privados de UTI para covid-19
93,9% do total de leitos de adultos estão ocupados
8 hospitais têm pelo menos uma vaga em leitos de UTI
12 unidades de saúde não têm uma vaga em leitos de UTI