Um morador do Lago Sul, de 34 anos, segue preso no Departamento de Controle e Custódia de Presos (DCCP), no Complexo da Polícia Civil, após xingar de “macaco” o delegado Ricardo Viana, chefe da 3ª Delegacia de Polícia (Cruzeiro). O caso ocorreu na noite de sexta-feira, em lanchonete da QI 23, no Lago Sul e foi registrado na 1ª DP (Asa Sul).
Ricardo Viana estava no estabelecimento acompanhado da filha, de 15 anos, quando sofreu a ofensa do ex-estudante de Engenharia Elétrica da Universidade de Brasília (UnB). “Perguntei à minha filha o número da nossa senha, momento em que o indivíduo passou a me chamar de ‘macaco’. Minha filha ficou muito consternada e eu queria sair dali, até para poupá-la desse incidente. Pedi aos funcionários para apressarem o meu pedido, o que foi feito”, contou.
Clientes da rede de fast food intervieram e tentaram conter o morador do Lago Sul. Com o pedido em mãos, o delegado caminhava para fora do local, quando o homem prosseguiu com as manifestações racistas. “Fui novamente chamado de ‘macaco’, de ‘veado’, e o indivíduo disse que eu não passasse mais por ele novamente, pois iria me ‘pegar’. Refleti muito sobre meus atos, pois estava agindo não como policial, mas como cidadão. Virei-me para ele, e dei ordem de prisão, identificando-me como delegado”, disse.
O ex-estudante resistiu à ação e conseguiu fugir da lanchonete, mas foi preso momentos depois por uma equipe da Polícia Militar, que o encaminhou à 1ª DP. No veículo do acusado havia dois cigarros de maconha, segundo registro policial. Ele responderá por injúria racial, ameaça, vias de fato, injúria e porte de drogas. O homem tinha passagem por um episódio de racismo anterior, além de lesão corporal.
Em nota oficial, a franquia do McDonald’s lamentou o ocorrido. “A empresa repudia toda e qualquer forma de discriminação e está à disposição das autoridades para colaborar nas investigações.”
Exemplo
O delegado disse ter hesitado em relatar o caso à mídia, mas tomou a decisão de expor a situação como exemplo. “Como negro, afrodescendente, filho de afrodescendentes nordestinos, sendo nascido e criado aqui no Distrito Federal, decidi informar sobre o caso. Estou muito consternado com a situação e não poderia me calar nesse momento, pelas minhas filhas, meus pais, meus irmãos e todos os que acompanham minha trajetória”, afirmou.
O policial destacou que sofreu preconceito antes: “Vivemos um racismo estrutural, que está inserido em todas as classes sociais. Não falo como delegado, profissão que consegui com muito esforço e trabalho. Desde menino, convivo com essa realidade, tendo recebido diversos apelidos por causa da minha cor. E cada vez que alcançamos algum espaço na nossa sociedade, essa ferida é tocada”.
“Estou aqui lutando pelo meu direito pela igualdade, previsto na Constituição. Eu exijo respeito. Não só a mim, mas aos meus familiares e a todos os negros que ajudaram a construir a história dessa nação”, acrescentou o delegado Ricardo Viana.
Bruno Peres/CB/D.A Press
Ricardo Viana: “Refleti muito sobre meus atos, pois estava agindo não como policial, mas como cidadão”