Onde antes havia filas enormes de passageiros apressados para despachar bagagens e funcionários que gritavam os destinos dos próximos voos, agora, o cenário é de poucas pessoas e com muito menos decolagens. Até junho de 2020, o Aeroporto Internacional de Brasília Juscelino Kubitschek registrou o menor movimento dos últimos 25 anos, com circulação de 3,9 milhões de passageiros, enquanto que, no primeiro semestre de 2019, esse número bateu 8,1 milhões. O motivo é o mesmo que interfere nos demais aeroportos do país: a pandemia provocada pelo novo coronavírus. O fluxo de pessoas caiu 51,2% no primeiro semestre, quando comparado ao mesmo período do ano passado.
Algo semelhante é observado em nível nacional. Dados da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) mostram que tanto a demanda quanto a oferta de voos domésticos apresentaram queda no país, a partir de fevereiro, quando foram noticiados os primeiros casos de brasileiros diagnosticados com a covid-19. De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), junho registrou redução de 85%, em relação ao mesmo período em 2019. Igualmente ruins são as comparações com abril (-93,1%) e maio (-91%). A taxa de ocupação das aeronaves ficou em 74,6%.
Esforço
Em Brasília, terceiro maior terminal brasileiro em movimentação internacional de passageiros, adaptações foram necessárias diante do perigo do vírus, seguindo os protocolos de segurança adotados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Entre elas, estão a aferição de temperatura dos passageiros no momento do embarque, distribuição de álcool em gel em diversos pontos, utilização de robôs no auxílio da limpeza, avisos sonoros e comunicados visuais com medidas que devem ser tomadas para prevenção da doença, além de adesivos no chão para orientar os transeuntes sobre o distanciamento social.
Rogério Coimbra, diretor de assuntos corporativos da Inframérica, concessionária que administra o aeroporto de Brasília, frisa que se trata de um esforço de comunicação para passar segurança aos passageiros. “Tudo para que a jornada seja o mais agradável possível e não um momento de estresse e de apreensão, com medo de pegar o vírus”, explica, Rogério. Em julho, o aeroporto passa gradativamente por uma recuperação do movimento, a medida que aumenta o número de linhas.
Economistas avaliam que a retomada do setor aéreo será lenta. Presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF), César Bergo estima que levará de dois a três anos para que empresas do segmento recuperem o patamar vivido antes da crise, caso a vacina para covid-19 fique pronta. “Para a cidade, é um terror, um desastre completo. Ninguém pega carro para ir de São Paulo a Brasília. A porta de entrada é o aeroporto”, lamenta. Na avaliação dele, há um risco, inclusive, para grandes grupos da aviação.
Fernando Aquino, coordenador da comissão de política econômica do Conselho Federal de Economia (Cofecon), explica que este é um dos setores mais atingidos pela crise. “Estão tomando prejuízo grande, porque sentiram os efeitos do distanciamento social. Pode ser que quebrem, sim, mas, se isso acontecer, uma empresa absorve a outra”, afirma. “Há uma linha com estrutura montada, pessoal qualificado e aeronaves. Tem valor. Portanto, a tendência não é sair do mercado e, sim, ser incorporada à outra”, avalia Fernando.
As empresas precisaram adotar protocolos de segurança, que incluem o uso de máscaras, tanto para a equipe de bordo quanto nos aeroportos. Filtros nos aviões fazem a renovação de ar de três em três minutos, e, a cada escala, há higienização completa da aeronave. Diretor de aeroportos da Latam, Rafael Walker ressalta que haverá a instalação de um sistema de check-in presencial com uso de monitores. Programa adotado no Rio de Janeiro, São Paulo e Vitória, e que deve chegar a Brasília em breve. A Latam foi de 750 voos diários, no início do ano, para 35, nos dois primeiros meses da crise, isto é, 5% da capacidade. Em setembro, a previsão é chegar a 240 decolagens a cada dia. Por receio, muitos clientes desistiram de viajar. “A palavra-chave é empatia. A gente entende que pode haver um nível de incerteza, e, por isso, criamos uma política flexível de compra”, ilustra Rafael.
Na Azul, o impacto também foi sentido. Marcelo Bento Ribeiro, diretor de relações internacionais da companhia, explica que, antes da crise, eram quase 1.000 decolagens por dia. “Em abril, tivemos uma redução brutal de 93% da nossa atividade, caindo para 60 voos diários”, detalha. O volume vem crescendo e, em agosto, o número subiu para 330. “É um tremendo avanço, considerando o vale profundo por que passamos. A Azul tem tido recuperação mais rápida, por características como a frota variada”, avalia.
Já o diretor de Segurança Operacional e comandante da Gol, Danilo Andrade, aponta que, em um primeiro momento, a diminuição de voos foi mais de 90%. “Reduzimos de 800 para algo em torno de 50”, conta. O cuidado na higienização das cabines de comando teve que ser redobrado. “O material que utilizamos, por exemplo, só pode ser passado em partes frias, porque algumas áreas são inflamáveis”, alerta Danillo. Com prevenção e cautela, o comandante acredita ser possível vivenciar uma nova experiência nos voos. “Quando tudo isso passar, acredito que o setor aéreo terá um futuro promissor em relação a melhorias que estamos tomando agora e procedimentos mais eficientes”, aposta.
Turismo
Os impactos sofridos pelo setor aéreo trouxeram desdobramentos em áreas como o turismo. O fluxo de viajantes sofreu uma redução expressiva com o início da crise sanitária. De acordo com a Secretaria de Turismo do Distrito Federal (Sectur-DF), o segundo trimestre de 2020 foi desolador, com a baixa no índice de voos diários que partiam de Brasília, entre janeiro e março. “(Em abril) o aeroporto recebeu a quantidade de passageiros que passavam por Brasília em um único dia, antes da pandemia”, informou a secretaria em nota oficial.
Na Agência de Viagens Bancorbrás, por exemplo, houve queda de 70% da procura, causada, segundo o diretor-executivo da empresa, Júnior Lins, pelo cancelamento e adiamento de viagens. “Foi o pior momento para o turismo já vivido. Em nível global, as consequências econômicas ainda não são possíveis de dimensionar completamente”, frisa. Para contornar a crise, a agência comercializa tickets de viagem. “A pessoa não marca a data nem destino da viagem, mas garante crédito futuro para quando tudo voltar ao normal, além de ganhar benefícios, como acesso à sala vip”, explica. A ideia é garantir segurança para que, aos poucos, as pessoas tenham mais confiança nos serviços. “A gente prevê que, em um primeiro momento, o cenário do turismo regional se intensifique e, que depois, as pessoas se sintam mais confortáveis para realizar destinos mais longos”, acrescenta Júnior.