A curva de novos casos da covid-19 no Distrito Federal estabilizou-se nas últimas semanas. No entanto, o número de infectados diagnosticados diariamente firmou-se em um patamar alto, e a doença segue avançando na capital. Especialistas ouvidos pelo Correio avaliam que a situação continua grave e que a análise do cenário não dá indícios de queda em curto tempo. O relaxamento do isolamento social e a abertura das atividades comerciais, ressaltam, são fatores que pesam para que a contaminação continue expressiva. Para o GDF, o quadro começa a apresentar tendência de declínio. Ontem, no entanto, a capital registrou o maior número de mortes em 24 horas: 47.
Breno Adaid, professor do Centro Universitário Iesb, doutor em administração e especialista em análises de dados e quantitativos estatísticos, explica que a estabilidade em números altos tem relação com a liberação de mais atividades comerciais. “Vínhamos andando de lado (sem crescer ou cair) desde junho. Na semana posterior a 15 de julho (quando os bares foram abertos), começamos a ter oscilações leves no topo para cima. Isso se refletiu no que se vê agora: uma média móvel alta, de 2 mil casos diários, com baixa oscilação.”
O resultado desse aumento em julho, explica o especialista, é a previsão de que o número de mortes, em agosto, seja maior do que em julho, quando foram registrados 792 óbitos de moradores do DF. “A curva de um mês é resultado do que aconteceu no mês anterior. Como tivemos, em julho, 57 mil casos novos, isso tende a causar um reflexo no mês de agosto. Esse aumento de infectados foi na segunda quinzena do mês passado; então, a tendência é de que ocorram mais mortes na metade final de agosto”, avalia Breno.
A análise estatística do cenário atual, segundo o professor do Iesb, não dá sinais de uma queda próxima. “No gráfico comparativo com outras regiões, há um momento em que se para de andar de lado e se começa a cair. Isso ainda não foi visto nos números do DF. A expectativa, então, é de que dure por bastante tempo”, prevê. Mas o pesquisador afirma que há uma tendência, também pela análise de outras unidades da Federação, de que a estabilidade em patamares altos seja seguida de redução acentuada.
O epidemiologista da Universidade de Brasília (UnB) Wildo Navegantes também avalia que a situação atual tende a ser mantida por muito tempo. “Ao propor-se a abertura de estruturas que promovem aglomeração e com a necessidade dos trabalhadores de usar ônibus e metrô, faz-se com que a doença permaneça num patamar muito alto de infecção, pois há muitas pessoas contaminadas circulando e outras passíveis de pegar a covid-19”, comenta.
A mudança do foco de infecção para regiões mais carentes do DF também faz com que o avanço não seja contido. “O vírus chegou a áreas mais periféricas, que são frágeis e onde as pessoas não têm muitas condições de ficar em casa, de não sair para trabalhar e não têm tanto acesso à saúde ou a espaços adequados para se isolar quanto a classe média ou alta”, detalha Wildo. Ele acrescenta que, com a abertura das atividades comerciais, moradores desses locais precisaram usar com mais frequência o transporte público.
Além de comunicação adequada por parte do governo para que a população siga o distanciamento social, o professor ressalta que o fortalecimento da atenção primária de saúde e do rastreamento de contatos é estratégia fundamental para reverter a situação. “Com isso, seria possível identificar pessoas com sintomas gripais e coletar amostras e mandar para laboratórios, além de colher informações de quais foram os contatos delas e relatar para que tanto quem está com sinais da doença quanto quem teve contato com ela fique em casa por 10 dias”, destaca. “Essa é uma das formas de quebrar a cadeia de transmissão, tirando as pessoas infectadas de circulação”, reforça.
Tendência
O Correio solicitou uma fonte à Secretaria de Saúde para comentar o cenário atual da pandemia no DF. A pasta, entretanto, respondeu por meio de nota oficial. Na avaliação do Executivo local, a análise deve ser feita a partir da data de início dos sintomas dos pacientes, e não no dia de confirmação. “Considerando a data de sua ocorrência, houve uma redução no número de mortes, que está coerente com a redução no número de casos que têm ocorrido desde meados de julho (se considerarmos a data do início dos sintomas, que é a maneira mais adequada de analisar). Isso indica que, embora ainda estejamos no platô de casos e mortes, a pandemia tende a diminuir no Distrito Federal, conforme tem sido registrado em alguns estados”, alega trecho da nota.
A pasta reforçou que essa tendência só será mantida caso a população siga rigorosamente medidas de proteção. “Especialmente, o uso adequado de máscaras (cobrindo o nariz e a boca), sempre que necessitar sair de casa, evitar aglomerações, manter distância de pelo menos 1,5 metro sempre que possível e higienizar as mãos com álcool em gel ou água e sabão. Quando não for necessário sair para trabalhar ou outra atividade imprescindível, procurar ficar em casa”, recomendou a Secretaria de Saúde.
Questionada sobre o número de vagas de UTI e a capacidade do sistema de saúde local de suportar a quantidade de casos, a pasta informou que trabalha na ampliação gradativa dos leitos. “Com a inauguração do Hospital de Campanha do Centro Clínico da Polícia Militar, ganhamos mais 100 leitos no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. Ainda há a expectativa da breve conclusão do Hospital de Campanha da Papuda e da construção do Hospital de Campanha da Ceilândia, que deve fornecer mais 60 leitos de UTI ao DF.”
Testes
Oitenta mil exames do tipo RT-PCR, de acordo com a Secretaria de Saúde, foram analisados pelo Laboratório Central de Saúde Pública do Distrito Federal (Lacen/DF) desde o início da pandemia. “Na última segunda-feira, o Lacen conseguiu zerar a fila de 3,8 mil exames RT-PCR pendentes de resultado para detectar casos suspeitos da covid-19”, informou a Secretaria de Saúde. Não há data para o retorno dos testes rápidos em drive-thru, mas o processo para contratação de empresa está em andamento. “A pasta esclarece que a testagem nunca foi interrompida nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), que realizam a testagem RT-PCR em todos os pacientes que apresentam sintomas da covid-19.”
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Fiscalização e multas
De 23 de março a 9 de agosto, 484.694 comércios em todo o Distrito Federal foram vistoriados para fiscalização das normas de segurança sanitária, de acordo com a Secretaria DF Legal. “No mesmo período, foram fechados, compulsoriamente, 23.846 estabelecimentos de diversos segmentos. Desses, 199 foram multados e 1.396, interditados.” Em relação ao número de máscaras, 76.074 pessoas foram abordadas, e 201.018 proteções faciais, distribuídas. No total, os agentes aplicaram 117 multas na capital.