Brasilienses apostam em diferentes formas de celebrar o Dia dos Pais

Devido ao isolamento social, profissionais de serviços essenciais terão uma comemoração diferente de anos anteriores. Mesmo com as restrições, papais desdobram-se para estarem com os filhos, seja presencialmente, seja pela internet

Caroline Cintra
postado em 09/08/2020 07:00 / atualizado em 09/08/2020 17:33
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press)
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press)

Um Dia dos Pais diferente. Assim será este domingo para muitas famílias. Com a pandemia do novo coronavírus e a necessidade do isolamento social, diversas pessoas precisaram sair de casa, temporariamente, para evitar contato físico com os entes amados, em especial aqueles do chamado grupo de risco. Isso acontece, sobretudo, com profissionais dos setores considerados essenciais, que não pararam de trabalhar em nenhum momento desde o início da crise sanitária. Pais médicos, enfermeiros, policiais, bombeiros, garis, entre outros, abrem mão, todos os dias, de estar com os filhos para cumprir uma função social tão importante e, acima de tudo, proteger os familiares.

Infectologista, uma das especialidades que mais têm estado na linha de frente no tratamento da covid-19, Alexandre Cunha, 47 anos, conta que se isolou do filho, Davi Cunha, 11, não apenas pelo riscos de contágio da doença, mas pelo excesso de trabalho. Separado da mãe da criança, ele tem a guarda compartilhada e, antes de surgir este cenário, via o menino diariamente para jogar futebol, videogame, ir ao cinema. Agora, o médico vive em função do trabalho. “A pandemia me roubou o que eu mais gosto, meu filho. Não passo mais o tempo que gostaria com ele. Quando tudo começou, conversei com o Davi e expliquei que precisaria ficar ausente por um tempo e que ele perderia o pai por alguns meses. Ele entendeu, mas, assim como eu, ficou muito sentido”, lembra o médico, morador da Asa Sul.

Devido à mudança, os encontros tornaram-se semanais. “Mesmo estando em casa, não consigo parar de trabalhar, porque atendo a paciente por telefone”, diz Alexandre. Hoje, apesar de não ser muito ligado à data, a comemoração do Dia dos Pais não será como o de costume. “Vou precisar passar no hospital para ver os pacientes, e isso pode tomar bastante tempo do meu dia, mas espero passar um tempo com ele. Acredito que todo dia é dia do pai e do filho, mas, quero muito estar com ele no Dia dos Pais”, afirma o infectologista.

Longe da família, o delegado da Polícia Civil e morador da Asa Norte Égiton Rocha, 35, não vê a esposa e filha há mais de um mês. Apesar da saudade todos os dias, ele ressalta que cumprir os compromissos profissionais, também, é uma forma de demonstrar amor, cuidado e manter uma boa base financeira para o conforto familiar. Para o pai da pequena Catharina Rocha, 2, a data é importante para estreitar a relação com os filhos. “Ela (data) representa o fechamento de tudo aquilo que o pai significa para a criança. Não estarei presente, mas me farei presente, por videochamada, porque ela tem necessidade de mim”, adianta o policial.

Plantão

Apesar de não estar isolado da família, o motorista de caminhão de coleta de lixo Alexandre de Oliveira, 41, vai ter um Dia dos Pais um pouco diferente. Ele foi escalado para o trabalho hoje, mas, geralmente, passa a data com a filha, Alice de Oliveira, 4, e o pai, Vilmar de Oliveira Gomes, 67, em Ceilândia. A programação desta ocasião será mais curta. “Essa é a primeira vez que trabalho na data. Normalmente, passamos com a família toda junta, mas, tenho que trabalhar. Saindo de lá, vou correndo encontrar minha filha”, garante.

O motorista ficou isolado dos familiares por alguns dias, após testar positivo para a covid-19. Passada a experiência, o que ele não quer mais é ficar afastado. “Até hoje, tenho todos os cuidados quando chego do trabalho. Tiro o sapato, vou tomar banho e, só depois, abraço a Alice. No início, ela não entendia, mas, agora, entende e até fala que é por causa do coronavírus”, conta. Para Alexandre, o Dia dos Pais é uma das datas mais queridas do ano. “Esses dias, ela chegou com uma foto nossa, enviada pela escola, e escrito Feliz Dia dos Pais e aquilo me deixou muito emocionado. É bom demais ser pai!”, define.

Cozinheiro em um hospital particular de Taguatinga, Igor Silva, 56, vai passar o dia longe de casa, em Samambaia, e dos filhos, de 8 e 12 anos. Ele foi escalado, na última sexta-feira. Este é o primeiro ano em que vai comemorar a data por videochamada. “Dói o coração saber disso, mas, como trabalho em área hospitalar, agora, é o momento que mais precisam de braço, e eu quero poder dar esse reforço. Minha menina mais nova chorou porque estava preparando café da manhã e estava cheia de planos. Mas, à noite, a gente comemora”, destaca.

Parceiros de profissão

O Dia dos Pais do ginecologista e obstetra Guaraci Beleza, 60, será em casa, com os três filhos, porém, cheio de restrições, sem beijos e abraços. O contato físico dará espaço ao distanciamento e a uma comemoração mais singela, mas cheia de amor, em casa, no Lago Sul. Para o médico, a data representa a realização de um sonho, principalmente, por conseguir reunir a família neste período de pandemia, quando muitos profissionais da saúde não poderão estar presentes na comemoração.

Dos três filhos, Matheus Beleza, 30, e Thaiana Beleza, 28, também estão na medicina. Ananda Beleza, 28, escolheu o direito e a psicologia. “Nunca os incentivei a seguir o meu caminho. Depois que resolveram seguir, fiquei muito feliz. Ele é ginecologista e ela, pediatra. Quando nos reunimos em casa, a cada 15 dias, procuramos manter a distância. O Matheus vejo mais, porque trabalhamos juntos (no Centro de Medicina Fetal de Brasília), fazemos partos juntos. As meninas, menos”, conta Guaraci, que atua, ainda, como um dos responsáveis técnicos pela ginecologia-obstetrícia do Hospital Santa Luzia Rede D’Or.

Os filhos são seu maior orgulho. “É maravilhoso ser pai deles. Sinto-me realizado. E ter filhos médicos me dá tranquilidade em relação ao futuro, porque tenho experiência, mas aprendo muito com eles. Eles me incentivam a estudar e me torno um profissional melhor”, assegura. Um dos momentos mais marcantes para ele durante a trajetória médica foi o nascimento de uma sobrinha, realizado em 31 de julho. “Todos são importantes e marcam muito, mas esse tinha toda a família envolvida. O Matheus auxiliou-me a fazer o parto e quem pegou a criança foi a Thayana. Foi emocionante. Só de lembrar me dá vontade de chorar”, confessa.

Thayana refere-se à Guaraci como uma inspiração. “Ele é um pai que tem muita luz, foco e presença. O Dia dos Pais é só mais um dia de atenção para ele. Ele é extremamente presente, e reforçamos, todos os dias, a sua importância. Vai ser uma comemoração bastante diferente, porque somos muito apegados, mas, estamos tomando todos os cuidados para ser um bom dia para todos”, antecipa a pediatra.

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Palavra da especialista

Alessandra Araújo, psicóloga

Sabemos que estamos em um momento que o desconhecido invadiu nossa vida e nossos lares, fazendo com que nos reinventássemos e encontrássemos uma nova forma de viver a fim de cuidar do outro. Hoje, afastar-se virou uma demonstração de amor, de afeto. Alguns pais tiveram que optar por se isolar para exercer a função laboral que lhe foi designada. Esses pais entendem que, além do amor que envolve suas famílias, existe neles, também, um amor pelo outro. Quando escutamos “isolamento”, já projetamos estar só, não ter companhia ou contato, mas podemos nos afastar fisicamente e não estar só. Se partirmos do contexto real do isolamento que nesse momento é um ato de amor, como se pode considerar que há ausência de emoção? Não podemos. O estar só despertou em nós, que somos seres sociáveis, que precisamos fazer trocas: de experiências, de conhecimentos e também de afetos. O melhor mecanismo para diminuir os efeitos negativos do distanciamento, como saudade, solidão e ausência é aproveitar as redes sociais para a interação e criar mecanismos para estar perto do papai e dos filhos. Hoje, contamos com tecnologias que nos permitem visualizar o outro a quilômetros de distância e captar o olhar, o sorriso do outro, algo que nos alimenta, pois, além de presentes, festas e mesas fartas, o melhor contato e presente a se dar é a atenção, a escuta e o diálogo. E digo, os olhos falam!

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